OPINIÃO

CREDULIDADE, CETICISMO E CIÊNCIA (Primeira Parte)  

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Homo Deus

Yuval N. Harari, no livro “Homo Deus: uma breve história do amanhã”, diz que a ciência deu poderes capazes de elevar a humanidade “acima do nível bestial da luta pela sobrevivência”. Estamos adquirindo poderes que nas eras passadas eram atribuídos apenas aos deuses. A expectativa de vida no século 20, por exemplo, passou de 40 para 70 anos. E não é absurdo afirmar que no século 21 ocorra uma nova duplicação e chegar aos 150.

 

Credulidade

Um dicionário define a credulidade como a qualidade da pessoa que é crédula e ingênua, que acredita facilmente naquilo que ouve. A ciência define as crenças como convicções sem evidências. Carl Sagan, no livro “O Mundo Assombrado pelos Demônios”, afirma que “o que as pessoas querem que seja verdade, elas acreditam que é verdade”. As crenças fortalecem a autoestima de seus adeptos e oferecem a ilusão de ordem e segurança em um mundo imprevisível. Coerência e lógica para eles são secundárias.

 

Crendices

Steven Pinker, no livro “Tábula Rasa: a negação contemporânea da natureza humana”, cita pesquisas revelam que 76% dos americanos acreditam no relato bíblico da criação, 79% acreditam que os milagres descritos na Bíblia realmente aconteceram, 76% acreditam em anjos, no diabo e em outras almas imateriais, 67% acreditam que existirão sob alguma forma depois de morrerem e apenas 15% acreditam que a teoria da evolução de Darwin é a melhor explicação para a origem da humana na Terra.


Crenças absurdas

Ramón Nogueras, psicólogo espanhol, lista algumas crendices em seu livro “Por qué creemos en mierdas? Como nos engañamos a nosotros mismos”. Pessoas que dizem que existem médiuns e adivinhos; que não vacinam seus filhos porque acreditam que as vacinas podem causar autismo neles; gente que diz que sua religião – e somente a sua – é a boa e verdadeira; que a infinidade de deuses anteriores à nossa época eram apenas mitos, crendices e superstições. Existem indivíduos que acreditam que levar determinado objeto no bolso, no pulso ou no pescoço traz sorte, outras que pensam que tudo nesta vida acontece por uma razão e que a posição das estrelas e galáxias que estão a milhões de anos luz incide em seu dia a dia e em seu destino.


Percepção seletiva

Crenças em deuses, em mitos e superstições mostram uma característica muito humana: a tendência ou viés de percepção seletiva. Essa tendência faz com que sejam descartadas quaisquer evidências que ponham em perigo nossas crenças. Estando convencidos de que existem gigantes, não importam os gritos de Sancho Pança avisando Dom Quixote que são moinhos de vento. Mesmo depois de colidir com eles, Quixote continuará dizendo que são gigantes.

 Pesquisas realizadas nos últimos anos mostram que o homem necessita de crenças e que o cérebro constrói uma ampla gama de justificativas para validá-las. As crenças surgem primeiro e os motivos vêm depois. Formadas as crenças, nosso cérebro busca evidências confirmatórias delas, acelerando o processo de reforço. A ciência é o melhor, ou talvez o único instrumento para determinar se nossas crenças correspondem ou não à realidade. Não foi à toa que Sócrates, um dos grandes sábios da Grécia antiga, lançou o desafio: “conhece-te a ti mesmo”.


Vemos o que queremos ver e ouvimos o que queremos ouvir

A realidade é que todos nós caímos em um erro muito comum que nos passa totalmente despercebido e que se chama viés de confirmação ou de percepção seletiva. Ainda que gostemos de imaginar que nossas opiniões são racionais, lógicas e objetivas, a verdade é que muitas de nossas ideias se baseiam no fato de que prestamos atenção às informações, às notícias e ao grupo que pertencemos. Tendemos, assim, a ignorar as informações que não comungam conosco. E a Internet aprofundou esse processo. Em síntese, vemos o que queremos ver e ouvimos o que queremos ouvir.

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