Nos últimos domingos a liturgia dominical nos proporcionou a leitura e a meditação do capítulo seis do Evangelho de São João. Inicia com a multiplicação milagrosa de cinco pães e dois peixes por Jesus gerando euforia na multidão. Depois deste fato, Jesus se reencontra com a multidão na sinagoga de Cafarnaum onde acontece um discurso, em forma de perguntas e respostas, sobre os temas da fé, da eucaristia, do mistério da encarnação, da vida e da vida eterna. Quanto mais avança o ensinamento mais aumenta a tensão e os ouvintes são conduzidos fazerem a sua opção. O texto deste domingo (Josué 24,1-2.15-18, Salmo 33, Efésios 5,21-32 e João 6,60-69) relata a conclusão onde uns abandonam o seguimento de Jesus e Pedro reafirma o seguimento.
O evangelista aponta que “muitos discípulos de Jesus que o escutaram, disseram: “Esta palavra é dura. Quem consegue escutá-la?” [...] A partir daquele momento, muitos discípulos voltaram atrás e não andavam mais com ele”. O que aconteceu com estes discípulos acontece em todos os períodos da história. Em nossa forma de ver as coisas, poderíamos esperar que Jesus se explicasse melhor, abrandasse ou mudasse o ensinamento para que estes discípulos continuassem a caminhar com Ele. Em vez disso, se direciona aos doze e diz: “Vós também vos quereis ir embora?”
Esta pergunta provocativa de Jesus é direcionada a todos os ouvintes de todos os tempos e, hoje, diretamente a nós. Também hoje muitos ficam “escandalizados” diante dos ensinamentos de Jesus que parecem “duros” demais para serem aceitos e colocados em prática. As opções vão desde o abandono total de Jesus; outros desvirtuam o valor dos ensinamentos e os adaptam ao seu gosto. Jesus espera uma resposta pessoal de cada um, não aceita uma opção superficial ou formal, mas deseja que o fiel participe do seu modo de pensar, querer e agir.
“Vós também vos quereis ir embora?” A resposta de Pedro: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”, torna-se referência para todos os cristãos de todos os tempos. A trajetória de vida de São Pedro testemunha a opção fundamental feita por Jesus e todo bem que Pedro realizou movido pela fé em Jesus Cristo.
Na vida de fé, como no cotidiano, existem momentos decisivos. Situações onde precisamos tomar decisões fundamentais que determinarão os passos seguintes da vida. Tomar decisões por vezes é dramático, mas é necessário. Somos conduzidos a tomar decisões devido a nossa condição humana de seres livres. Assim Jesus nos considera e nos conduz como seres livres, que depois de mostrar as múltiplas opções, faz os ouvintes se definirem. A liberdade está no coração da fé e da moral.
Josué, depois de introduzir o povo de Deus na nova terra, provoca-o a se manifestar se quer continuar a servir o Senhor Deus que o conduziu até ali. O mesmo fez Jesus depois de se dar a conhecer melhor. Não se constrói uma verdadeira fé senão sobre uma plena educação à liberdade. Uma liberdade não somente de qualquer coisa ou de alguém, isto é dos condicionamentos externos e internos, mas também a liberdade para realizar algo e sobretudo para alguém. A liberdade na Sagrada Escritura é uma questão de relacionamento: certamente é ser livre de qualquer coisa, mas sobretudo é ser livre para qualquer coisa e para alguém. Ser livre não é para a anarquia, mas é optar para servir a Deus e aos irmãos, livres do pecado para servir a justiça, livre da mentira para servir a verdade.