O entendimento do que significa clima, tanto no universo acadêmico quanto no dia a dia da vida em sociedade, não é algo tão óbvio quanto aparenta. A maioria das pessoas possui uma noção intuitiva do que seja clima, que, em geral, tem muito a ver com as “previsões do tempo” divulgadas pelos veículos de comunicação, porém tem dificuldade para articular uma definição que, uma vez minimamente elaborada, transcenda os limites de conceitos intangíveis. São exemplos, o uso de metáforas tipo “pintou um clima entre nós”, “clima de guerra no Oriente Médio”, “pesou o clima político em Brasília” e tantas outras desse gênero, se estendendo até as grandes discussões atuais, nem sempre bem-compreendidas ou aceitas, sobre a mudança do clima global. Indiscutivelmente, é fundamental ter clareza sobre o que é “clima” e que, mais além da conceituação científica, “clima” também pode ser entendido como o resultado de um processo histórico, social e cultural, para que o mundo no qual estamos imersos faça algum sentido.
Na clássica definição do climatologista austríaco Julius von Hann, que, durante muito tempo, foi majoritariamente adotada pela Geografia, clima é o conjunto dos fenômenos meteorológicos que caracteriza o estado médio da atmosfera em um ponto determinado da superfície da Terra. Evidentemente que esse “estado médio” se refere à média dos elementos meteorológicos (temperatura, chuva, ventos, radiação solar, etc.), medidos no mesmo local, junto à superfície do solo (altura padrão de 1,5 m), por um longo período de tempo. Para fins de padronização, a Organização Meteorológica Mundial, definiu esse período de tempo como sendo, idealmente, 30 anos de observação. Por essa definição, clima seria, abstratamente, representável por números (descrições estatísticas de medidas de tendência central e de variabilidade, que dão forma às chamadas normais climatológicas). Eis uma definição operacional de clima, diga-se de passagem, muito útil, mas não necessariamente a melhor.
Sobrevieram os anos 1980 e entrou na arena das discussões, mais do que clima, o sistema climático global. Pelo qual, o resultado das interações, de ordem planetária, envolvendo as ações humanas sobre a atmosfera, hidrosfera, litosfera, criosfera e biosfera, passou a ser reproduzido in silico por meio de modelos matemáticos complexos, envolvendo a circulação geral da atmosfera. Ou seja, clima passou a ser, virtualmente, entendido como o resultado das simulações de modelos numéricos GCMs, dentro dos padrões do IPCC. Ainda que não se possa ignorar, que os resultados desses modelos numéricos complexos são o melhor que a ciência do clima pode nos oferecer na atualidade, perceber clima, apenas por essa lógica da física e da matemática, também está distante do ideal, uma vez que o antrópico, nesse caso, seria apenas a variável de perturbação do sistema climático terrestre (emissões de gases de efeito estufa e mudança do uso da terra, especialmente).
E nós, os humanos, afinal, entramos onde na definição de clima? Somos cientes da nossa condição de atores interessados, sendo tanto parte do problema quanto da solução? Não é simples e nem facilmente perceptível a ligação entre a cultura humana e a ciência do clima. Não somos, culturalmente, iguais aos nossos antepassados. E nem precisamos retroceder tantos anos assim, para ter clareza disso. Mudamos. Mas, não necessariamente, mudamos para melhor, apesar de todos os avanços alcançados no conhecimento. Moralmente, talvez até tenhamos regredido, basta olhar as atrocidades que são cometidas contra outros seres humanos ou contra o ambiente, em nome de disputas territoriais e do desenvolvimento econômico. E se mudamos, evidentemente, a nossa percepção do que é clima, em relação aos nossos antepassados, também mudou.
O defensor da ideia de clima como uma construção decorrente da intrincada relação que há entre clima, história e cultura é Mike Hulme, que é professor de clima e cultura no Departamento de Geografia no Kings´s College, em Londres. O principal argumento de Hulme é que, mais além dos conceitos convencionais, clima também pode ser percebido como uma espécie de memória cultural do que é esperado, em dado local e certa época do ano, vindo a se configurar na expectativa do homem comum sobre os estados transientes do tempo.
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