As Assembleias Gerais das Nações Unidas são oportunidades para que os líderes internacionais possam projetar as suas políticas externas, mesmo que a ONU, enquanto organismo multilateral, não consiga mais lidar com a realpolitik do momento, uma vez que diferentes guerras emergem, trazendo desafios complexos. Criada após a Segunda Guerra Mundial, ela teria o papel de ser uma mediadora da política internacional. Todavia, de lá para cá, a conjuntura modificou-se substancialmente. Hoje temos grandes guerras em andamento e ditadores aventurando-se, sem qualquer freio salutar. O multilateralismo entrou em decadência, em grande medida, pelo déficit de lideranças internacionais capazes de impor uma agenda internacional, alimentando ainda mais a condição anárquica das relações internacionais. Uma das grandes amarras das Nações Unidas de hoje é a composição do seu Conselho de Segurança. Ele é composto pelos EUA, Reino Unido e França, de um lado, e China e Rússia, do outro. Isso demarca o atual dilema da política internacional, ou seja, a contradição entre as potências ocidentais e uma eixo de ditaduras, orquestrado pelo mecanismo sino-russo. Na medida em que as decisões do conselho, para que tomem força, necessitem da aprovação de todos os cinco membros efetivos, a possibilidade de veto por qualquer um deles é um balde de água fria, ainda mais se levarmos em conta que as potenciais medidas afetariam justamente as ditaduras.
Caminhos distintos
Aproveitando-se da decadência do sistema multilateral e do déficit de lideranças ocidentais capazes de lidar com a realpolitik, o eixo das autocracias tenta articular um novo pólo de poder, cuja centralidade está no BRICS, que hoje é um grupo que reúne as principais ditaduras mundiais, entre elas a China, a Rússia e o Irã. O objetivo central do eixo é o de minar a ideia de um regime ocidental regrado a partir do direito internacional. Assim, é do interesse do eixo a falência da ONU. Falam até mesmo em uma nova moeda fiduciária. Para as ditaduras, a América Latina virou um parque de diversões, com palhaços profissionais, como no caso de Maduro, entre outros. Lula, em seu discurso na ONU, nem sequer citou o caso venezuelano, tudo para se curvar ao consórcio das autocracias. A mídia internacional sequer reproduziu o seu discurso, pelo total descrédito da política externa lulista, que quer um espaço dentro dessa cosmovisão precária de ditadores. Até mesmo líderes da esquerda, como Gabriel Boric, do Chile, utilizaram a tribuna da ONU para denunciar o ditador Maduro e as suas aventuras. Embalada por Celso Amorim, a política externa atual é um verdadeiro fracasso, em todos os sentidos.
Cenários
Alguns países tentam avançar uma reforma na ONU. Seria suficiente? Pouco provável. O multilateralismo como um todo deveria ser revisto. Todavia, qualquer processo de reforma da ONU somente seria eficaz, se houvesse por de trás disso, líderes ocidentais com envergadura para lidar com as questões da realpolitik e capazes de impor uma agenda internacional mínima, que repelisse com veemência as aventuras de ditadores deprimentes. Com o sistema multilateral de hoje e os líderes ocidentais que aí estão, a total anarquia é uma condição favorável para que o eixo autocrático imponha as suas vontades, reanimando inclusive, as narrativas nucleares, inexistentes desde a Guerra Fria.