Arte e seleção sexual
Geoffrey Miller é um psicólogo evolucionista americano, conhecido por sua pesquisa sobre seleção sexual na evolução humana. Seu livro “The Mating Mind: How Sexual Choice Shaped the Evolution of Human Nature” (A Mente de Acasalamento: Como a Escolha Sexual Moldou a Evolução da Natureza Humana) tornou-se obra de referência sobre “a seleção sexual”. Para Miller, o impulso de criar arte pode ser também uma “tática de acasalamento”: um modo de impressionar com a qualidade do cérebro, portanto indiretamente ligada com os genes, os parceiros sexuais e conjugais em perspectiva. O virtuosismo artístico é distribuído desigualmente, exige muito dos neurônios, é difícil de falsificar e altamente valorizado. Em outras palavras, os artistas são sexys. Um exemplo extraordinário disso nos é dado pelo pássaro-caramanchão, espécie encontrada na Austrália e na Nova Guiné.
Pássaro-Caramanchão
O macho dessa espécie constrói um ninho elaborado e ornamentado meticulosamente com objetos coloridos como orquídeas, cascas de caramujo, frutinhas silvestres e cortiça. Alguns chegam a pintar seus caramanchões com resíduos de frutas regurgitados e usando folhas ou cascas de árvores como pincel. As fêmeas avaliam os caramanchões e se acasalam com quem criou os mais simétricos e bem ornamentados.
Uma hipotética entrevista com o Pássaro-Caramanchão
Geoffrey Miller imagina como poderia ser o depoimento de um pássaro-caramanchão para uma prestigiosa revista de arte. Ele diria: “Sinto um impulso irresistível de autoexpressão, de jogar com cores e formas. É uma coisa inexplicável. Não lembro quando surgiu em mim essa sede devoradora de apresentar cores vivamente saturadas em um cenário monumental, porém minimalista. Me sinto ligado a algo exterior a mim mesmo quando me entrego a essas paixões. Quando vejo uma bela orquídea no alto de uma árvore, não sossego enquanto não a possuo. Quando vejo uma só concha fora de lugar em minha criação, tenho de acertá-la. É uma simples coincidência as fêmeas às vezes virem às inaugurações de minha galeria e apreciarem meu trabalho, mas seria um insulto supor que eu crio com o objetivo de procriar.”
Felizmente, diz Miller, os pássaros-caramanchões não falam, porque assim podemos usar a seleção natural para explicar o trabalho deles sem que implorem ser diferentes.
A cauda do pavão
A exuberância da cauda do pavão sempre fascinou os biólogos evolucionistas. O próprio Charles Darwin se referiu a ela. Ele supunha que a seleção sexual por meio da escolha do parceiro foi importante para a evolução mental humana. Arte, moralidade, linguagem e criatividade seriam “valores ilusórios” para a sobrevivência, mas teriam mostrado sua importância para o processo de seleção sexual, de escolha mútua do parceiro, em ambos os sexos, pois anunciavam inteligência, criatividade, caráter moral e aptidão hereditária.
A cauda do pavão não evoluiu para a sobrevivência natural. Na verdade, ela vai contra, fica mais visível para predadores, aumenta o gasto de energia. Ela evoluiu como resultado das escolhas de acasalamento feitas pelas fêmeas. O rabo do pavão é lindo para os olhos das fêmeas.
A beleza é o jeito da natureza agir à distância
A experiência da beleza é uma das maneiras que a evolução tem de criar e manter interesse e fascinação, até mesmo obsessão, para nos encorajar a tomar as decisões mais adaptativas para a sobrevivência e reprodução. A beleza é o jeito da natureza agir à distância, tornando bonitos o seu bebê ou o seu amado. A artimanha da evolução faz com que eles exerçam um certo magnetismo, que provoca prazer simplesmente em olhá-los.
Música
Existe um paralelo incrível entre a música humana e o canto dos pássaros, o canto das baleias e todos os outros sinais acústicos complicados que os animais enviam uns aos outros. Os gibões, os macacos mais musicais, fazem duetos longos e maravilhosos entre si, especialmente para seus parceiros sexuais. Onde quer que você olhe na natureza, se um animal está produzindo um sinal acústico completo, é quase certamente um sinal de cortejo, um sinal envolvido na seleção sexual. Charles Darwin achava que a música humana era, em grande parte, resultado das exibições de cortejo.
Encontramos beleza em algo bem-feito
Enfim, nós usamos técnicas virtuosas para criar mundos imaginários na ficção, em filmes, para expressar emoções intensas como música, pintura e dança. Da caverna de Lascaux ao Museu do Louvre e ao Carnegie Hall, os seres humanos têm um gosto inato permanente por manifestações virtuosas na arte. Encontramos beleza em algo bem-feito.
Arte, busca de status, arte e consumo conspícuo
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