OPINIÃO

“Amai os vossos inimigos”

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“A vós que me escutais, eu digo: Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam”. Estas são as palavras fortes da pregação de Jesus que norteiam a liturgia dominical (1 Samuel 26,23, Salmo 102, I Coríntios 15,45-49 e Lucas 6,27-38). O ensinamento é apresentado a todos, mas em particular aos discípulos aos quais é pedida a adesão. Ele está situado no contexto das bem-aventuranças, o surpreendente programa de felicidade apresentado por Jesus. 

Mas qual o sentido e o alcance deste ensinamento? Por que Jesus pede para amar os inimigos, isto é, um amor que vai além das capacidades humanas? Na realidade, a proposta de Cristo é realista. No mundo existe demasiada violência, demasiada injustiça e as soluções propostas pela legislação e acordos não alcançam a meta da paz e da reconciliação desejadas. Se faz necessário um novo caminho, uma proposta nova marcada pelo amor, bondade, perdão a fim de romper o infinito ciclo da violência. 

O que é amar os inimigos? Os ensinamentos do Papa Francisco na Carta Encíclica Fratelli Tutti sobre a fraternidade e amizade social, dizem: “Alguns preferem não falar de reconciliação, porque pensam que o conflito, a violência e as rupturas fazem parte do funcionamento normal duma sociedade. [...] Outros defendem que dar lugar ao perdão equivale a ceder o espaço próprio para que outros dominem a situação. [...] Outros consideram que a reconciliação seja empreendimento de fracos, que não são capazes dum diálogo em profundidade. [...] Incapazes de enfrentar os problemas, preferem uma paz aparente” (236).

Continua no nº 241: “Não se trata de propor um perdão renunciando aos próprios direitos perante um poderoso corrupto, um criminoso ou alguém que degrada a nossa dignidade. Somos chamados a amar a todos, sem exceção, mas amar um opressor não significa consentir que continue a ser tal; nem levá-lo a pensar que é aceitável o que faz. [...] Perdoar não significa permitir que continuem a espezinhar a própria dignidade e a do outro, ou deixar que criminosos continuem a fazer o mal. Quem sofre injustiça tem de defender vigorosamente os seus diretos e os da sua família, precisamente porque deve guardar a dignidade que lhes foi dada, uma dignidade que Deus ama. [...] O importante é não o fazer para alimentar o ódio que faz mal à alma da pessoa e à alma do nosso povo, ou por uma necessidade morbosa desencadeando uma série de vinganças”.

Por que amar e perdoar os inimigos? Em primeiro lugar, é que o Deus que se revelou na história é misericordioso, como reza o salmista: “O Senhor é indulgente, é favorável, é paciente, é bondoso e compassivo. Não nos trata como exigem as nossas faltas, nem nos pune em proporção às nossas culpas”. O rosto misericordioso de Deus fica plenamente visível em Jesus Cristo que ensinou, repetidas vezes, em palavras e pelo seu exemplo sobre o amor e o perdão. Enquanto estava sendo preso, torturado, insultado e pregado na cruz, Jesus diz: Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” (Lc 23,34). 

“Sede misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso”, é o argumento decisivo para amar e perdoar. Sendo que o perdão e a misericórdia não são instintos humanos naturais, mas sim divinos, Deus nos proporcionou meios para nos capacitar e exercitar as virtudes divinas. São Paulo escreve que em primeiro lugar somos “um ser vivo”, “homem natural”, mas pela graça da morte e ressurreição de Jesus Cristo “veio o homem espiritual. O primeiro homem, tirado na terra, é terrestre; o segundo homem vem do céu”. Antes de pedir que os seguidores perdoassem, Deus nos renovou santo Batismo e nos capacitou para irmos além do senso comum, da psicologia e da sociologia para sermos dignos seguidores de Jesus Cristo perdoando e amando como Ele. 


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