"Vou viver para dar felicidade ao outro filho e minha neta, pra mim acabou"

Pai de jovem morto durante comemoração do título da Libertadores, no centro de Passo Fundo, fala pela primeira vez sobre o caso

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Jones mostra a camisa que Natan usava na noite em que saiu de casa para comemorar o título do GrêmioJones mostra a camisa que Natan usava na noite em que saiu de casa para comemorar o título do Grêmio
Jones mostra a camisa que Natan usava na noite em que saiu de casa para comemorar o título do Grêmio
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Torcedor fanático do Grêmio desde criança, Jones Renz, 41 anos, não teve ânimo para acompanhar, terça-feira à tarde, a partida que garantiu a presença de seu time do coração na terceira final do Mundial de Clubes. Há duas semanas, ele perdeu o filho Natan Regis dos Santos Renz, 18 anos, morto com um tiro na cabeça, enquanto comemorava o tricampeonato da Libertadores, no centro de Passo Fundo. “Pra mim acabou, perdeu a graça”, sentenciou. O caso está sendo investigado pela Delegacia Especializada em Homicídios e Desaparecidos (DEHD).


Era sempre em casa, ao lado do pai, seu companheiro inseparável, que Natan gostava de assistir aos jogos do Tricolor. Assim foi durante toda a campanha do tri. Mas no dia 29 de novembro, noite da grande final, ele resolveu ir com os amigos. “Disse mais de uma vez, assiste aqui comigo. Ele respondeu que iriam todos os piás pra lá”, conta. Antes de sair de casa, acompanhado de amigos e do irmão Renan, 21 anos, o jovem deixou o hino do tricolor gravado em um pen drive, e fez uma selfie, sentado no sofá da sala, usando a camisa do Grêmio, que pertencia ao pai. “Ele tinha a dele, mas sempre usava minha camisa em dias de jogos, gostava. Antes de ir, deu tchau. Não lembro se saiu pela porta da frente ou se desceu esta escada aqui da sala”, revela.

Jones não sabe explicar os motivos, mas recorda que, apesar de toda a espera pelo título, quase não comemorou ao final da partida a conquista do tri da Libertadores. Sem a presença do filho para ficar até de madrugada acompanhado os comentários do jogo na televisão, como sempre costumavam fazer, disse ter escutado um pouco no rádio e dormido logo em seguida.

Eram por volta das 3horas da madrugada quando o telefonou tocou. No outro lado da linha, a nora contou que Natan estava ferido em frente a um bar, na rua General Neto. O grupo havia assistido ao jogo em um posto de combustível, na rua Moron, e depois seguiu até este bar para comemorar.

Morador do bairro Tupinambá, Jones saiu às pressas para o centro da cidade e se deparou com o filho baleado. “Não sabia se socorria ele ou ia atrás dos autores. Fiquei transtornado ver ele naquela situação”, conta. O rapaz chegou a ser levado para o Hospital São Vicente de Paulo, mas não resistiu aos ferimentos e morreu por volta das 10horas.

Covardia

Através da polícia, Jones teve acesso a uma parte das imagens registradas pelo sistema de câmeras existentes no local, e definiu como uma covardia o que fizeram com o filho. Ele conta que Natan nem conhecia a mulher apontada como o pivô do crime. Descrito como um rapaz calmo, tímido e trabalhador, segundo o pai, nunca se envolveu em briga, tampouco ouviu alguma reclamação sobre as atitudes dele.

“Essa menina havia brigado com o namorado. Ela estava junto no grupo porque conhecia outras meninas. As imagens mostram quando os agressores chegam em cinco e começam a dar socos. Meu filho, mais velho, e outros amigos, revidaram. O Natan estava de costas, ao se virar, é atingido por um tiro na testa. Mesmo caído, ainda levou dois chutes na cabeça. Foi muita covardia”, diz emocionado.

Outra cena vista nas imagens, que chocou o pai, foi a maneira como algumas pessoas, tentavam, por conta própria, prestar atendimento. Ele também criticou a demora na chegada do socorro. “Pessoas bêbadas, levantavam ele até uma altura, depois largavam novamente, batendo a cabeça no chão. Todos em volta. Acho que os seguranças do estabelecimento em frente poderiam ter isolado para evitar isso. Os policiais chegaram rápido, mas a ambulância demorou”.


Planos interrompidos
Com 18 anos completos, Natan era funcionário de uma empresa especializada em alarmes e monitoramento. Para 2018, os planos já estavam traçados. Caso se livrasse do quartel, pretendia cursar a faculdade de computação. Outra meta era tirar a Carteira Nacional de Habilitação para num futuro breve comprar um carro. Enquanto não adquiria seu próprio veículo, o pai era o encarregado de buscá-lo nas festas. “Nunca deixei solto. Quando passava da meia-noite eu ia atrás. Ele ficava brabo comigo, mas não tinha jeito. Naquela noite, eu acabei pegando no sono, e deixei ele lá, poderia ter evitado”.


Protesto
Para chamar a atenção da sociedade, a família organizou um protesto no sábado à tarde. Após uma missa na Catedral Metropolitana, familiares e amigos, vestindo camisetas brancas, com a selfie que Natan fez na noite do título, estampada, os manifestantes caminharam até em frente ao bar onde o jovem foi morto. “O que podemos fazer é isso. Não podemos sair matando e nos tornarmos criminosos. Espero que os autores sejam presos e condenados. Vou viver para dar felicidade para meu outro filho e minha neta pequena, mas eu não tenho mais felicidade. Pra mim acabou. Nunca mais teremos natal, final de ano, férias na praia, como íamos todos os anos. Ele estava até guardando dinheiro para fevereiro a gente ir para a praia, em Torres. Não assisto mais jogo. Não tenho coragem, lembra demais. O Natan só deixou coisas boas”, relata o pai.

Vestindo a camiseta com a imagem do filho, a mãe, Elisandra Mattos dos Santos, 38 anos, entra na sala, no final da entrevista, e complementa a frase do marido. “A vontade era se enfiar em um buraco e ficar lá para sempre, mas a gente tem que viver por quem ficou”.

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