Com recursos próprios, um delegado da Polícia Civil adotou um novo sistema para realização dos flagrantes no município: a gravação de depoimentos. A tecnologia facilita o trabalho dos policiais, o que torna mais rápido o atendimento ao público, e ainda contribui com as investigações.
Desde que começou a atuar no plantão policial de Passo Fundo, há quase um ano, o delegado Fábio Idalgo Peres utiliza o software. “Essa metodologia de trabalho só eu utilizo por aqui, por enquanto, porque a instituição ainda não dispõe desse recurso no estado, mas é a maneira mais rápida de executar um flagrante”, explica.
Ao contrário do que se faz no procedimento tradicional, o audiovisual não precisa transcrever os depoimentos, porque está sendo gravado. Dessa forma, os flagrantes mais simples, que duram em média duas a três horas, são concluídos com a metade do tempo. “Como é um processo cheio de formalidades, bastante complexo, há flagrantes que chegam a durar cinco ou seis horas e com esse recurso a gente consegue concluir em até duas horas”, cometa.
A agilidade que se obtém com o sistema não beneficia somente os policiais que realizam o procedimento, mas, também, o público que aguarda para registrar ocorrências na delegacia e que precisa esperar a conclusão do flagrante para ser atendido. “É importante frisar, também, que se libera a guarnição que trouxe os presos pra voltar mais rapidamente pra rua e continuar com o policiamento ostensivo”, destaca.
Entre os policiais militares, o procedimento ganhou apreciadores, tanto pela rapidez, como pela fidelidade dos relatos individuais. “Eu participei de dois flagrantes nesse sistema e foi muito rápido, a gente perde menos tempo. É interessante, também, porque fica mais claro o que falamos, já que na forma escrita nem sempre se consegue traduzir o que contamos a respeito dos fatos”, diz um militar integrante da Rocam do 3° RPmon.
O sistema também foi aprovado pelo Ministério Público, justamente por ser mais fidedigno. O promotor criminal, Júlio Ballardin, elogia a iniciativa. “O audiovisual nos permite ver as expressões, o ânimo, de modo que conseguimos captar a emoção, o que é importante pra entender a dinâmica do fato, por exemplo, de um assalto”, afirma.
Para Ballardin, as gravações também terminam com os depoimentos ardilosos dos presos que pretendem enganar o Poder Judiciário, para obter regalias ou para prejudicar os agentes. “Acaba com aquela história de que não falou o que está descrito na ocorrência policial, que apenas assinou o papel sem ler o que estava escrito. Ou então que não foi acompanhado por um advogado, que foi agredido quando dava depoimento. Tudo isso é desmistificado quando se é filmado”, completa.
A aproximação com a veracidade dos fatos também é um dos motivos citados pelo delegado, para justificar a metodologia utilizada. “Muitas vezes a gente é chamado no Judiciário pra ratificar o que foi dito na fase policial, já com a filmagem se tem uma prova incontestável sobre o que foi feito na hora do flagrante”, acrescenta.
Os custos com a manutenção do aparelho e com o material onde serão guardadas as informações ficam a cargo do próprio delegado. “Eu faço mesmo por questões de comodidade minha, dos policiais que estão de plantão comigo e pela fidelidade que oferece”, conclui.
Investigações
As investigações também ganham com a tecnologia, já que o banco de imagens dos flagrados fica mais completo: ao invés de arquivos de fotos, se tem imagens e áudios. “Quando uma vítima é assaltada, ela nem sempre vê o rosto do criminoso, mas ouve sua voz. É mais fácil de reconhecer”, argumenta.
Fundamento Jurídico
Todo o processo de depoimento audiovisual tem previsão legal. A resolução 105 do Conselho Nacional de Justiça dispõe sobre a documentação dos depoimentos por meio do sistema audiovisual e da realização de interrogatório e inquirição de testemunhas por videoconferência.
Já o artigo 405, parágrafo 1º do Código de Processo Penal dispões que “Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações”.
Santa Catarina
O sistema audiovisual de depoimentos é utilizado em Santa Catarina há alguns anos e foi no estado vizinho, ainda como agente de polícia, que o delegado conheceu o software. “Lá eles já estão bastante adiantados quanto a esse recurso, tanto que os depoimentos são anexados em um sistema online encaminhados virtualmente ao Poder Judiciário”, diz.
Depois de oito anos como policial, Peres passou no concurso para delegado no Rio Grande do Sul. No cargo atual, também há oito anos, ele utiliza o sistema desde 2015. “Eu pesquisei sobre o aparelho e adquiri por conta própria. Não tem custo muito alto, talvez firmando uma parceria com empresas privadas, se torna viável adotar o software na instituição”, pondera. Após comprar os aparelhos, o delegado passou utilizá-lo nos flagrantes em todas as cidades onde é lotado. “Para os colegas é uma mudança, e como toda mudança, há certa resistência. Mas eu não conseguiria voltar ao sistema anterior”, conclui.