O Ministério Público solicitou respostas da Susepe para esclarecer as condições que facilitaram a fuga de 17 reclusos do regime fechado, na madrugada de sábado (12), após uma caminhonete arrancar o portão do Presídio Regional de Passo Fundo. Entre os questionamentos, o órgão quer saber se havia funcionários fazendo acompanhamento pelas câmeras da casa prisional.
Em dezembro do ano passado, um novo sistema de monitoramento foi instalado. O investimento, de R$ 36,8 mil, foi uma parceria com o Conselho da Comunidade do Município e o Ministério Público do Trabalho (MPT). “Se tinha monitoramento, como não foi vista essa saída de 17 apenados, da cela até chegar ao pátio e, depois, ao portão que foi derrubado. Eles percorreram um longo caminho. Havia gente, naquela hora da madrugada, na frente das telas ou não?”, pergunta o promotor de Justiça da Vara de Execuções Criminais (VEC), Marcelo Pires.
A intenção de Pires, com essas informações, é esclarecer se houve alguma negligência de funcionários ou se há indício de irregularidade. Na primeira hipótese, de falta funcional, o Ministério Público faz um encaminhamento para que a corregedoria da Susepe investigue. Em uma possível suspeita de crime, o MP tem autorização para atuar.
O promotor, que há anos acompanha a situação da casa prisional, chama a atenção para a falta de infraestrutura e as inúmeras tentativas do MP em relação a construção de um novo presídio. “Tem algumas coisas que salta aos olhos, por exemplo, em um presídio deste tamanho, como não tinha uma segurança externa? A aproximação desse veículo em alta velocidade, poderia ter sido vislumbrado nas guaritas que têm nas duas esquinas do presídio. Se tivesse um agente postado ali, talvez isso pudesse ser evitado. Como não tinha uma segurança externa armada?”, questiona, novamente.
Conforme Pires, todas as vulnerabilidades da Casa foram reportadas, no segundo semestre do ano passado, pelo delegado regional que encerrou a gestão. O relatório foi entregue ao MP. Entre os principais apontamentos, estão a debilidade da estrutura física e a falta de servidores. “Tudo isso dificulta a contenção da população carcerária. Isso já era meio que previsível e veio a acontecer”, enfatiza Pires.
Reforma e promessa de novo presídio
Em janeiro de 2018, o Estado recebeu uma verba superior a R$ 18 milhões para reestruturação de presídios. Desses, R$ 6 milhões seriam destinados ao de Passo Fundo, que já conta com o projeto para sua reforma e ampliação. A planta previa a construção do segundo piso na penitenciária, com ampliação de aproximadamente 40 celas. Até o momento, essa obra não saiu do papel. Conforme Pires, a informação que circula é de que a verba está à disposição do Estado, mas que eles estariam iniciando o processo licitatório. A previsão para início das obras seria para a metade de 2019.
Além disso, há um terreno, às margens da BR 285, entre Passo Fundo e Carazinho, destinado à construção de uma penitenciária feminina. A ideia inicial era construir um presídio estadual naquele local. O projeto, de 2007, chegou a sair do papel, mas a obra foi interditada em 2011, após irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O Estado perdeu a verba, de quase R$ 9 milhões, pela demora em retomar a obra.
Depois disso, um novo projeto, desta vez para um presídio feminino, foi elaborado. O Estado recuperou o dinheiro, mas desde então não houve mais movimentação no terreno. Em dezembro de 2018, vencia o prazo para utilização do recurso. Uma nova prorrogação foi solicitada, mas o Ministério da Justiça ainda não deu parecer sobre o caso.
A área destinada à penitenciária foi uma doação da Prefeitura de Passo Fundo. Na Câmara, os vereadores aprovaram um projeto prorrogando o prazo de utilização da área para este fim específico. As informações foram confirmadas pelo parlamentar Márcio Patussi.
MP esgotou possibilidades
Sobre a construção de uma nova penitenciária, o promotor explica que o MP tentou agir de todas as formas pela continuidade da obra. “Chega em um ponto que o Ministério Público não tem mais o que fazer. As medidas judiciais que tinham que ser tomadas, principalmente em relação à construção de um novo presídio – que possivelmente teria impedido essa fuga em massa –, seria uma ação civil pública que o MP já intentou há alguns anos. O estado foi condenado em segundo grau e acabou recorrendo e parece que esse processo está em julgamento em Brasília”, lamenta o promotor.
Diante da inércia em relação à estrutura, episódios continuam acontecendo nas penitenciárias. “Ano passado foram os incêndios. Agora foram as fugas. O que vai acontecer daqui seis meses? Qual é a providência o Estado vai tomar para que não aconteça mais esse tipo de coisa?”, indigna-se. “O sistema prisional é um gargalo que existe hoje, senão for resolvido, não vai ter como combater a criminalidade”, complementa o promotor de Justiça.
Inquérito policial
A Polícia Civil também vai instaurar inquérito policial para investigar as circunstâncias da fuga, segundo o delegado Diogo Ferreira. “Tudo será analisado. Os fatores externos e internos. Quem financiou a fuga e quem deu o suporte com a caminhonete, até o que ocorreu dentro da casa prisional. Se houve falha interna ou se houve algum crime. Nada vai passar batido”, afirma.
Em relação a caminhonete, já existia um inquérito em aberto em relação ao veículo, desde o último mês de dezembro, quando o proprietário registrou ocorrência, informando ter sido vítima de estelionato. “Ele teria anunciado no Facebook e negociado a caminhonete com um contato, que usou documentos falsos e não repassou o valor. Então estamos verificando também esta situação”, comenta.
Susepe
A reportagem procurou a Susepe para esclarecimentos sobre o ocorrido, mas não obteve retorno até o fechamento da edição.