MP não descarta interdição de presídio devido à superlotação

Só em Passo Fundo, déficit de vagas era de 460 até 1º de março; governo tem 30 dias para apresentar proposta

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Com o maior índice de superlotação carcerária, o presídio regional de Passo Fundo e a região da Vara de Execução Criminal Regional de Passo Fundo (VEC) sofrem pela falta de vagas e a precarização da infraestrutura que se alonga há mais de 20 anos. Até o dia 1º de março o déficit de vagas era de 460 só no Presídio Regional de Passo Fundo, chegando a 1.566 na região. Responsável pela VEC, a juíza Lisiane Marques Pires Sasso disse que a situação é “gravíssima” e que “se não forem tomadas providências terão que interditar” as unidades prisionais.

 

De acordo com Lisiane, todas as 12 casas prisionais dentro da VEC já possuem algum tipo de interdição, fazendo com que apenados cumpram pena em prisão domiciliar. O próprio Ministério Público (MP) realizou duas ações civis públicas solicitando medidas para amenizar o problema, o que inclui a construção de novas unidades prisionais, que não foram atendidas.

 

Na quarta-feira (6), a juíza e os promotores de justiça Marcelo Pires e Alvaro Poglia estiveram junto de outras autoridades em Porto Alegre em reunião com o vice-governador e secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, Ronaldo Vieira Junior, solicitando três medidas para resolver a situação da falta de vagas na região.

 

A primeira é que se encerre a construção de uma unidade às margens da BR 285, iniciada ainda em 2005; a segunda, que o Presídio Regional de Passo Fundo seja reformado; e a efetivação da central de monitoramento de tornozeleiras, já instalada dentro do Instituto Penal de Passo Fundo (IPPF). “Se não tiver presídio não vai mais ter pessoas presas”, destacou Póglia, em coletiva na tarde de sexta-feira (8) no Ministério Público, ao lado de Pires e da juíza Lisiane.

 

Durante a reunião em Porto Alegre, também não foi descartada a hipótese de uma Parceria Público Privada (PPP) para dar celeridade à reforma e constrição.

 

Pires destacou que nessa modalidade o estado entra com a doação de um terreno e em contrapartida uma empresa constrói a unidade. Em experiências que acompanhou, ele disse que as unidades chegam a ficar prontas no prazo de até um ano.

 

Em relação a Passo Fundo, já existe uma verba da União de mais de R$ 8 milhões para ser destinado à construção de uma nova unidade – já iniciada. A utilização do valor teve prazo prorrogado para até final deste ano. Mas, de acordo com os promotores, caso não seja usada dentro desse prazo pode ser perdida.

 

A obra, debatida desde 2007, é construída em um terreno doado pela prefeitura de Passo Fundo ao estado, conforme Lei 4.352 de 14 de novembro de 2006. Na época, ficou definido que a área de 88.057,44 metros quadrados seria destinada à construção de um Presídio Estadual. Mas devido à morosidade da aplicação das verbas repassadas pela União, o município precisou alterar o texto, conforme a Lei 5.377, aprovada só em dezembro de 2018, que acrescentou à obra do presídio Estadual a construção de uma Penitenciária Feminina.

 

Na prática, os recursos destinados à construção do Presídio Estadual não foram aplicados e devido à uma verba para a construção da peninteciária feminina foi necessário mudar o texto para garantir que a partir de 2.019 a área possa continuar recebendo obras.

 

Apesar do maior déficit de vagas ser de encarcerados do gênero masculino, a construção de um presídio feminino é necessária, de acordo com a juíza, para retirar as mulheres que hoje estão em unidades masculinas.  “A região não tem presídio feminino. É urgentíssimo”, destaca Lisiane.  

 

A região contava com 199 mulheres encarceradas até o dia 1º de março. Com a construção de uma unidade elas seriam transferidas para um espaço único, já que hoje se dividem na região.

 

“Amontoado de gente”

Com a falta de espaços, os promotores destacam que as unidades viram locais que corroboram para diversas violações de direitos humanos, em que celas se convertem a “amontoados de gente”, sem propiciar a ressocialização do apenado para que, após a pena, ele retorne à comunidade. “Já ouvi pessoas dizendo que tinha que matar bandido e no outro dia vir falar comigo porque o filho foi preso”, criticou.

 

Pires, que começou a atuar na vara de Execuções Penais do MP em junho de 2000, recorda-se que eram oferecidos cursos de marcenaria e um espaço para sala de costura, em que o presídio era contratado para fazer uniformes a empresas. Coisas que deixaram de existir para que se convertessem em celas.

 

Os apontamentos foram encaminhados ao vice-governador que deve enviar uma resposta em 30 dias.

 

Pires se mostrou animado e acredita que possam vir respostas favoráveis do estado. “Foi uma reunião histórica pela presença de várias autoridades. Em cerca de 20 anos nunca vi uma mobilização como essa (...) A gente faz nosso papel de agente político,  a garantia só o vice-governador poderá dar. Mas parece que dessa vez se sensibilizaram”, destacou.

 

Fuga dos 17

 A reunião em Porto Alegre foi organizada a partir de uma solicitação de vereadores e autoridades de Passo Fundo após a fuga de 17 homens do Presídio Regional de Passo Fundo, no dia 12 de janeiro deste ano.  Dos 17, permanecem foragidos Raimundo Natalício dos Santos Camargo, Leandro Dutra, Mateus Mariano Soares e Tiago Cardoso Lopes.

 

Logo após a fuga, o Ministério Público encaminhou à diretoria da unidade 14 perguntas que foram respondidas no final de janeiro e que fazem parte da investigação. De acordo com Pires, foram 12 minutos do estouro do portão até serem acionados demais agentes. “Não havia ninguém”, apontou o promotor. A investigação continua sob sigilo. A Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) disse que se manifestaria apenas após o resultado da sindicância e do inquérito policial.

 

Questionamentos feitos pelo MP ao presídio:

1- Qual é o número de agentes penitenciários lotados e disponíveis no PRPF?

2- Qual o número total de agentes penitenciários de plantão no dia da fuga?

3- Havia agente penitenciário destacado para atuação na sala de monitoramento por câmeras no dia da fuga?

4- Havia agente penitenciário destacado para atuação na sala de monitoramento por câmeras no momento em que foi derrubado o portão por onde ocorreu a fuga?

5- Há determinação da direção da casa prisional para manter agente destacado 24 horas observando a sala de monitoramento por câmeras? Essa determinação está prevista em ordem de serviço?

6- Havendo câmeras que monitoram o forro da galeria “C”, para evitar fugas, como não foi verificada a saída de 17 apenados das celas pelo agente responsável por zelar pelo monitoramento?

7- Qual foi a data da última vistoria estrutural realizada para verificar buracos nas paredes e no teto das celas da galeria “C”?

8- Na sexta-feira precedente à fuga dos 17 apenados houve conferência, ainda que superficial, nas celas de onde fugiram os detentos?

9- Qual é a periodicidade de realização das revistas estruturais?

10- Há sistema de alarme e sensores de movimento nos forros das galerias “A”, “B” e “C”?

11- Nos últimos 30 dias houve remanejamento de presos das galerias “A” e “B” para a galeria “C”? Se a resposta for positiva, informar o nome de todos os apenados remanejados e se consta algum na lista de foragido.

12- Há registro documental desse remanejamento? Qual foi o motivo do remanejamento dos presos?

13- Nos últimos 30 dias houve alguma modificação, retirada de alguma parede ou mureta que isolava o “oitão” do prédio da galeria “C” da passarela do pátio, por onde os foragidos tiveram ou poderiam ter acesso para chegar até a Unidade Básica de Saúde e acesso ao portão por onde saíram?

14- Houve mudança recente dos agentes responsáveis pelo setor de segurança do estabelecimento prisional? 

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