Após um policial militar aposentado de 54 anos agredir e algemar um estudante de 16 anos na Escola Estadual Ensino Fundamental (EEEF) Jerônimo Coelho, na sexta-feira (17), a direção da escola cancelou as aulas por tempo indeterminado até que medidas sejam tomadas. Ontem (20), estudantes, pais e professores estiveram na escola, mas permaneceram mobilizados, debatendo quais alternativas devem ser adotadas. A direção ainda se reuniu com o Conselho Escolar, Conselho de Pais e Mestres (COM), Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (Cipave), e assistência jurídica da 7ª Coordenadoria Geral de Educação para elaborar encaminhamentos que devem ser levados aos comandos da Brigada Militar de Passo Fundo e região. A previsão é de que até quarta-feira (22) documentos estejam prontos.
Entre as alternativas debatidas na escola, a diretora Verlania Aparecida Serrão, que está há quatro anos frente à instituição, cita que será determinado o impedimento da entrada de pais na escola, que deverão passar a entregar e buscar os alunos apenas no portão; a solicitação de mais funcionários para controle da entrada; e o que ela chama de “providências” sobre o policial aposentado.
“A gente não quer a presença dele aqui porque estamos com medo”, defende. “Os pais se sentem acuados no pátio da escola quando ele está com a arma a vista, coagindo as pessoas. Porque esse senhor vem armado para a escola, com a arma a vista para que todo mundo veja que ele está armado. Ele faz revista do material desse aluno [que foi algemado] e do irmão [que tem 12 anos], sendo que ele não pode porque é um policial inativo. A esposa dele toma atitudes que acha cabível: xinga, bate nas crianças, porque é a esposa dele. Vamos solicitar a saída desse senhor da escola.”
Nesta terça-feira (21) os alunos permanecerão sem aulas e mobilizados na instituição, junto de pais e professores. Ontem, um cartaz foi colocado em uma das paredes da entrada da escola pedindo o fim da violência na escola. A diretora não confirmou se as aulas voltarão ao normal na quarta-feira. “Tudo vai depender do que os órgãos competentes irão responder”, justificou.
Dois anos de medo
Verlania aponta ainda que os problemas envolvendo o policial aposentado se estendem há dois anos na escola. De acordo com ela, uma rixa envolvendo as famílias do estudante e a dele teriam levado ao que aconteceu na sexta-feira.
Na ocasião, o homem chegou na escola e, segundo depoimentos, revistou a mochila do estudante, encontrando uma chave de fenda. Isso o teria motivado a agredir o estudante, o segurando pelo pescoço, e o algemando.
A cena foi filmada por estudantes que compartilharam nas redes sociais. Em um dos vídeos é possível ver o policial afastado segurando o adolescente pelo pescoço, contra a parede, enquanto sua esposa, de 39 anos, começa a algemá-lo.
Há um ano, o homem também fez um abaixo-assinado na tentativa de retirar os dois irmãos da escola.
A diretora disse que não há motivos que poderiam justificar a ação, dizendo que o estudante “não é um aluno problemático”. “Ele é um aluno que tem problemas de aprendizagem, deficiência intelectual”, apontou. “O irmão tem problemas de indisciplina, mas essa criança está fazendo acompanhamento pedagógico (...) Só que esse pai diz em alto e bom tom que marginal tem que sair da escola, que são marginais. Eles têm uma rixa pessoal, no bairro. E isso já faz tempo.”
Órgãos ausentes
Verlania criticou ainda a ação da Brigada e do próprio Conselho Tutelar durante o caso de sexta-feira. “Quando a gente chamou a polícia, chamou 190, vieram os soldados aqui e nos trataram com uma falta de ética, aos gritos com a diretora, com as professoras, ofendendo... Eles ameaçaram! Um dos policiais ameaçou a diretora, dizendo que ela seria algemada se não parasse de gritar”, contou, referindo-se a ela mesma na terceira pessoa. Em relação ao Conselho Tutelar, Verlania disse que em nenhuma das vezes que foi acionado, compareceu.
O conselheiro Clédio Paties, do Conselho Tutelar de Passo Fundo, disse que o caso é acompanhado há mais de dois anos pelo órgão, mas que compete ao Conselho trabalhar “a questão dos alunos”. “A agressão física é crime e isso compete à Policia Civil, à Corregedoria da Brigada Militar. Porque o Conselho não é um órgão protetor”, defende.
Segundo Paties, o Conselho tem auxiliado encaminhando os estudantes a atendimentos psicológicos e psiquiátricos. O comandante do 3º RPMon, tenente-coronel Volnei Ceolin, quando questionado sobre o que cabe a um policial militar aposentado fazer ou não, se há uma sindicância apurando os fatos e sobre a ameaça de algemar a diretora da escola, disse que estão “averiguando”.
A assessoria jurídica da 7ª CRE auxilia a escola para a realização dos encaminhamentos e aponta que o comportamento do policial aposentado fugiu da ordem que lhe cabia. “Ele, como policial aposentado, tem direito de usar arma, se ver algum crime pode intervir, mas como é escola, e escola são crianças, então, nesse caso, ele vira um cidadão comum, e deveria ter informado a escola e pedido a presença da Polícia para revistar o guri.”
Na sexta-feira (17), quando o caso foi registrado na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), o homem alegou que só agiu dessa forma porque o garoto e seu irmão ameaçam o filho dele e que, um dia antes ao fato, o adolescente de 16 anos teria ameaçado matar a criança.