Quando o filho de 26 anos e a filha de 24 anos de Raquel Farias, 50 anos, chegaram na casa da mãe assassinada a golpes de barra de ferro na manhã de hoje (22), o choro da família que se concentrava na pequena casa verde azulada do bairro Bom Jesus, volta. “Agora é o momento de sermos fortes”, disse a tia e mãe do autor do crime, Miram de Oliveira de Farias. Os dois permaneceram em silêncio, observando a fuligem no quarto que o jovem ateou fogo, sabendo que deixaram Chapecó, cidade do oeste catarinense, para enterrarem a mãe.
Miriam manteve os olhos marejados e, com calma, disse o quão inacreditável era aquilo. “Ele não bebia, não usava drogas. Ele teve um surto”, repetiu mais de uma vez sobre seu filho, de 22 anos.
O jovem é acusado de ter matado a tia, com quem vivia, a golpes de barra de ferro e atear fogo em um dos cômodos da casa por volta das 5h20 de hoje. Depois do crime, permaneceu em frente à residência, de onde foi levado pela Brigada Militar à Delegacia de Pronto Atendimento (DPPA) e, depois, ao Presídio Regional de Passo Fundo (PRPF) acusado de feminicídio.
No dia anterior
Segundo Miriam, o jovem vivia com a tia há anos. Ela mesmo, com seus quatro filhos, de 6, 14, 16 e o de 22, morou junto com a irmã, até que, em dezembro passado, decidiu se mudar para uma residência próxima. O jovem de 22 anos teria se negado, preferiu ficar com a tia.
Miriam conta que o relacionamento entre eles era saudável. O jovem trabalhava em uma grande indústria e também frequentava a igreja.
“Mas desde sábado estava diferente”, aponta. Um dia antes do crime, na terça-feira (21), Miriam disse que, pela manhã, sua irmã lhe ligou, dizendo que o jovem estava diferente. “Eu busquei ele para ir lá em casa, e perto do meio-dia ele surtou. Quebrou as coisas da cozinha. Dizia que escutava vozes. Ele ficou violento com os irmãos, dizia que estavam armando pra ele. Aí eu peguei e saí de casa com meu filho menor e tranquei ele. Passei o cadeado no portão e me escondi em um vizinho. Mas ele quebrou o cadeado e sumiu”, relembra.
A mãe do jovem disse que tentou, mais de uma vez, chamar a Brigada Militar, que não lhe atendeu, até que um vizinho teria conseguido a chamada. “Mas a polícia disse que deveríamos ir na Delegacia fazer um registro. Aí eu fui na Delegacia da Polícia Civil, e me disseram que a Brigada deveria ter ido atrás dele quando ele estava em surto.”
O jovem reapareceu, de acordo com a mãe, só no final da tarde. Raquel teria avisado que perto das 18h ele estava em casa, calmo, tomando banho. Miriam então, voltou à casa da irmã nesse momento acompanhada de duas pessoas, um sobrinho e um membro da igreja que frequenta, mas seu filho não queria falar com ela. O objetivo era levá-lo até o Hospital Municipal para buscar ajuda.
Como o jovem não a queria por perto, Miriam conta que os outros dois homens conseguiram convencê-lo a entrar no carro para “dar uma volta”, e foram até o Hospital. Ali tiveram o atendimento negado. “Disseram que como ele não estava em surto não tinha o que fazer, que estava muito cheio”.
Sem receita médica é que buscaram um calmante para o jovem. Por volta das 22h, Raquel teria avisado Miriam que ele dormia.
De acordo com o Boletim de Ocorrências, registrado na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), um vizinho ouviu, por volta das 5h20 de hoje, Raquel tentando acalmar o jovem. Ao sair de casa notou o fogo e, em seguida, ela teria sido morta.
“Mas ele fez isso e ficou ali na frente”, aponta a mãe. “Se fosse premeditado ele teria fugido. Ele não estava normal.”
Passagem
Há cinco anos, quando tinha 17 anos, o então adolescente já havia cometido um assassinato. O crime aconteceu no dia 22 de junho de 2014 contra o, à época, companheiro de sua mãe. “Eu sei que vão associar agora com isso. Mas é outra situação. Ele já pagou tudo o que devia”, defende Miriam.
Segundo ela, na época, seu companheiro era alcoólatra e frequentemente chegava em casa exaltado. Naquela ocasião teria chegado e agredido um dos filhos que tinha oito anos e, depois, empurrado a própria Miriam. Para impedir a agressão é que o jovem teria dado golpes da facão no homem, que morreu.
O que a mãe diz, é que na época o filho tinha consciência do que fazia, e que, desta vez, não o conseguia reconhecer. “Acho que estava sob forças demoníacas”, apontou.
De acordo com a delegada da DPPA que registrou a ocorrência, Carolina Goulart, o jovem chegou na delegacia dizendo que cometeu o crime, mas, no registro formal da ocorrência, ele fez uso de silêncio.
Carolina não acompanhou a prisão. Segundo o relato que agentes deram a ela, no momento que o detiveram ele “estava bem transtornado, rasgando livros. A bíblia, inclusive”.
O jovem foi encaminhado para o Presídio Regional de Passo Fundo (PRPF) com a orientação de que ele pode ter problemas mentais, já que não possui nenhum laudo oficial.
Durante o processo ele ainda será submetido à pericia psiquiátrica. Em caso de perícia positiva, ele ficará com medida de segurança, sendo internado no manicômio judiciário.
Procedimento normal
Um enfermeiro do Hospital Municipal disse que não acompanhou o caso específico do jovem, mas destacou que é do procedimento do hospital atender casos psiquiátricos apenas em situação de surto, para que sejam medicados.
O protocolo da instituição é que os pacientes psiquiátricos sejam encaminhados pelo Centro de Atenção Psicossocial (Caps), com histórico da doença. Os atendimentos são das 14h às 16h nas segundas, quartas e sextas-feiras.