Tentativas de feminicídio crescem 150% em Passo Fundo

Dados da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher de Passo Fundo apontam que foram dois casos de janeiro a julho do ano passado, contra cinco neste ano

Por
· 3 min de leitura
 Crédito:  Crédito:
Crédito:
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Os números da violência contra a mulher em Passo Fundo cresceram nos primeiros seis meses e meio de 2019 em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (SSP/RS) e da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (Deam). Foram 150% tentativas de feminicídio a mais, passando de duas para cinco, e dois feminicídios consumados, contra um no ano passado. Os números vão na contramão dos dados gerais do estado, que apontaram queda em todos os delitos contra a mulher no primeiro semestre.

 

Só em ameaças, as ocorrências passaram de 463 para 538, o que representa um aumento de 16,19% nos registros ou o mesmo que dizer que 2,97 ameaças foram registradas por dia. Foi o segundo maior aumento por tipo de ocorrência, seguido de lesão corporal, que cresceu 12,34%, passando de 235 para 264 – ou 1,45 caso por dia. A única queda foi registrada nos casos de estupro, que passou de 20 para 19, uma ínfima queda de 5%.

 

No estado, os números foram mais positivos com queda em todos os delitos. Mesmo assim, 43 mulheres foram mortas no primeiro semestre e outras 184 tentativas de feminicídio  foram registradas. No percentual, a queda foi de 21,8% nos casos consumados e 5,15% nos tentados.

Ameaças caíram 2,4%, lesões corporais, 4,3%, e estupros, 60%.

 

Aumento considerado

 

O último caso grave registrado em Passo Fundo foi no domingo (21), quando uma mulher de 28 anos foi vítima de uma tentativa de femicídio pelo companheiro, em casa, no bairro Zachia. O homem, de 32 anos, atirou contra ela e depois tentou suicídio. Ambos foram socorridos e encaminhados ao Hospital São Vicente de Paulo (HSVP). Ela deu alta na manhã de ontem, enquanto ele permanece internado em estado grave.

 

Antes, Grasiela do Nascimento Pavão, também de 28 anos, foi assassinada com dois tiros na cabeça no final de junho, no bairro Donária. O ex-companheiro da vítima, de quem estava separada há três meses na época do crime, foi preso no início de julho.

 

Segundo a delegada Daniela de Oliveira Minetto, da Deam, embora o ano de 2018 tenha terminado com três feminicídios consumados – com apenas um registro no segundo semestre –, há um “aumento considerado nas ocorrências” de violência contra a mulher neste ano.

 

O Atlas da Violência, publicado no início de junho pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que analisa os casos registrados em todo o país e que traz um capítulo sobre a violência contra a mulher, questiona se os dados refletem o real aumento no número de casos ou apenas a diminuição da subnotificação, uma vez que a Lei do Feminicídio (Lei no 13.104, de 09/03/2015) é relativamente nova.

 

Daniela avalia que ambas as análises fazem parte desse processo, bem como a busca do registro pelas próprias vítimas. “O aumento de violência doméstica se deve sim a uma maior informação por parte das vítimas e a um maior encorajamento para que elas denunciem seus agressores. Mas também não se pode dizer que não aumentaram. Quais os motivos? Infelizmente não tenho essa reposta para te dar. Até por que o feminícidio, assim como o homicídio, é de difícil prevenção”, aponta, reiterando que, nos casos de femicídio, quando vítimas denunciam uma primeira agressão sofrida elas podem ser amparadas pela Lei Maria da Penha, conquistando medidas cautelares que podem auxiliá-las.

 


Estrutura que protege o homem

 

Em Não-Me-Toque, pelo menos três mulheres aguardam um processo que estourou no ano passado contra o então prefeito da cidade, Armando Carlos Roos (PP), por assédio. Hoje, uma audiência deve ser realizada para ouvir as testemunhas do acusado e uma das mulheres, mas a morosidade e o medo têm acompanhado as vítimas, segundo a advogada Maiaja Franken de Freitas, que representa uma das mulheres e também é presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB em Passo Fundo.

 

Maiaja entrou no caso em maio deste ano, quando, segundo ela, viu o desrespeito às vítimas em uma audiência cujos representantes do Ministério Público não estavam presentes.

 

Acompanhando o caso, ela identifica uma estrutura que protege o homem e que tenta reverter a culpa para a mulher que denuncia, recorrente em todos os casos. “O que eu vejo é que a gente tem muito para evoluir porque a vitima ainda é tratada como criminosa. A defesa, nesse caso específico, está tentando tratar sobre a conduta das vítimas, como se elas fossem as responsáveis pelo assédio que ele praticou”, aponta.

 

Segundo a advogada, a cliente precisou se afastar do trabalho por um período e outra vítima tem tido resistência na cidade para coisas simples como conseguir um emprego.

 

“E eu acredito que é por conta do machismo enraizado na sociedade”, avalia. “A gente vem muito tempo de um regime patriarcal em que só o que o homem fala é certo e, por conta disso, nós, mulheres, acabamos ficando objetificadas. E como que um objeto vai ter voz? Como que um objeto vai dizer q não quer? E isso tudo a gente tem que romper. Por isso a importância do feminismo.”

Gostou? Compartilhe