Eram 4h15 desta sexta-feira (30) quando o chamado do grave acidente com vítimas fatais na BR 386 chegou ao Quartel do Corpo de Bombeiros Militar de Soledade. O plantão do bombeiro Patrick Dipp da Silva, de 36 anos, havia começado às 8h do dia anterior e, junto dos colegas, partiu em direção ao km 236,4 da rodovia. Há 13 anos na profissão, sabia que cada acidente tem suas peculiaridades e, às margens da BR 386 logo encontrou a que marcaria a ocorrência da madrugada: entre as cinco pessoas mortas dentro do veículo Peugeot, uma criança, Lorenzo Erohin Geraldi, de seis anos, resistia em vida.
Pai de um garoto de quatro anos, Silva via no menino a projeção do próprio filho. Mas sem tempo para refletir, debruçou-se sobre a tarefa de resgatar a criança e retirar os demais corpos do veículo.
Rápido, tomou um desencarcerador hidráulico com os colegas e abriu a porta traseira do lado esquerdo, removendo o garoto e o imobilizando em uma maca rígida para ser deslocado ao Hospital de Caridade Frei Clemente, de Soledade. Mas já às 5h soubera o pior: o pequeno não sobrevivera e se tornava a 6ª vítima fatal.
De volta no batalhão, Silva sentiu-se pesado, mal, triste. Pensava em Lorenzo, na efemeridade da vida, no seu filho e família, e, só quando foi para casa é que desabou.
Diante da porta e do seu menino, abraçou-o com força. Chorou. Disse que o amava e que um amiguinho mandou um beijo no coração dele – sem dizer que este amiguinho, dois anos mais velho que o filho, havia morrido horas atrás. Resolveu passar a manhã brincando com o filho como há tempos não brincava. Também abraçou a esposa e, como em outras ocorrências graves, desabafou a agonia que guardara da ocorrência em um texto que até o final desta tarde já tinha mais de 9 mil curtidas e 3,4 mil compartilhamentos:
“O dia que não amanheceu...
Quatro e quinze da manhã, o telefone toca...Mais um acidente na BR 386...
Deslocamos com a agilidade rotineira e ao chegar nos deparamos com a cena trágica de sempre, carros irreconhecíveis sob a penumbra da noite escura.
Em um veículo uma família inteira, noutro um viajante solitário. O que mais nos alerta é um anjo, de nome Lorenzo...
Iniciamos o seu salvamento, seu corpo pequeno, pele branca, cabelos escuros parecem descansar em meio às ferragens e demais familiares.
Com a esperança de sempre, os sinais luminosos e barulho da sirenes ecoa na rodovia em direção ao hospital...
Porém não há mais tempo, aquele anjinho de 6 anos retornou ao Céu por volta das cinco horas da manhã.
O que pensar, o que sentir?
Desde que Deus me abençoou com a maior benção que um homem pode receber, essas ocorrências me machucam demasiadamente.
Pensar no meu pequeno VHS enquanto atendo é inevitável, claro, sempre com o profissionalismo intrínseco de todo Bombeiro Militar.
Dói, dilacera, destrói um pai, um socorrista, um bombeiro.
O que fica é a vontade de chegar em casa e te abraçar, carinhar, amar intensamente, meu filho!
A cada instante, a cada dia, e (se Deus permitir) por muitos e muitos anos!
Desculpem o desabafo, mas me sinto melhor escrevendo. E hoje, se cada um de vocês que lerem esse relato chegarem em casa e abraçaram com amor e ternura seus filhos, meus pensamentos estarão em paz...
Se vossos filhos estranharem a atitude, digam que o anjo Lorenzo está lá em cima brincando ao lado de Deus e queria um abraço deles...
Amém...”