Ao redor da fita de isolamento, pequenos grupos de moradores se formaram ao longo da manhã de sexta-feira (6), na pequena cidade de Paraí, na serra, para acompanhar o trabalho dos policiais civis, militares e de peritos criminais em duas agências bancárias da cidade. Durante a madrugada, sete criminosos foram mortos em confronto com a polícia, quando tentavam arrombar caixas eletrônicos das agências do Banco do Brasil e Sicredi no município.
Durante 15 minutos, a intensa troca de tiros entre os treze policiais da Brigada Militar, que faziam ronda noturna no momento do confronto, e os integrantes da quadrilha despertou os moradores da pacata cidade da serra gaúcha, distante 88 quilômetros de Passo Fundo. Segundo a Polícia Civil, o grupo chegou ao município de 7,5 mil habitantes por volta das 2h da madrugada em dois carros. Com emplacamentos de Porto Alegre, os investigadores suspeitam que os veículos tenham sido roubados na região metropolitana da capital gaúcha e as placas clonadas. “Vamos investigar se há uma potencial relação desse grupo com outros fatos”, disse o delegado titular da Delegacia de Pronto Atendimento (DPPA) de Bento Gonçalves, Arthur Reguse.
Ação vinha sendo monitorada
Em um trabalho integrado de inteligência entre as forças policiais, a atuação das quadrilhas especializadas em roubos a banco estava sendo monitorada na região há pelo menos um mês, através da Operação Angico. Com base nesses dados, a região ganhou um reforço extra, de aproximadamente 34 policiais, vindos de Caxias do Sul.
Segundo o delegado, Arthur, na ação de ontem, em Paraí, dois criminosos mortos no tiroteio haviam sido alvos de mandados de busca e apreensão na cidade de Guaporé. O armamento utilizado por eles, conforme relatou, era de grosso calibre. Durante a ação, foram apreendidas uma metralhadora 9mm, uma espingarda calibre 12 e pistolas.
Tranquilidade interrompida
Distantes cerca de 150 metros, as duas agências bancárias escolhidas pelos criminosos amanheceram com o mesmo cenário. As vidraças estilhaçadas e cápsulas de bala espalhadas pelo interior dos estabelecimentos e calçadas evidenciavam a direção dos disparos e a violência do confronto. De acordo com o delegado do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC), João Paulo Abreu, os assaltantes pretendiam detonar três explosivos para conseguir ter acesso ao dinheiro dos caixas eletrônicos no Sicredi. “Quatro deles se direcionaram a esse banco, enquanto os outros três foram ao Banco do Brasil”, detalhou. Com a rápida ação policial, dois criminosos tentaram fugir pela rua lateral à agência quando foram atingidos pelos disparos de arma de fogo. Pra remoção dos artefatos, o Grupo de Ações Táticas Especiais (GATE), de Porto Alegre, foi acionado auxiliar no atendimento da ocorrência.
As malas que seriam utilizadas para transportar as cédulas roubadas foram depositadas em frente ao estabelecimento bancário. O assalto interrompeu uma década de tranquilidade no município e alterou a rotina dos habitantes. O morador de um dos prédios vizinhos ao Banco do Brasil, que pediu para não ser identificado, ainda mantinha as mãos trêmulas ao comentar o momento de tensão durante a madrugada. “Não sabia o que estava acontecendo. Acordamos e colocamos as crianças no banheiro”, narrou ele, no final da manhã de sexta-feira. “Pensamos que estava caindo o prédio”, completou uma das filhas, à porta do edifício.
A narrativa de medo se repetia a cada novo depoimento. “Era tiro que não acabava mais. Isso serviu para mostrar aos bandidos que a polícia está monitorando”, comentou outro morador com a identidade igualmente preservada.
Pelo menos 50 policiais estavam envolvidos nas ações de preservação das cenas do crime, investigação e atendimento da ocorrência. Até o fechamento desta edição, a identidade dos criminosos não havia sido revelada pela polícia. Segundo informações apuradas, um dos suspeitos, no entanto, teria atuado em outra ação criminosa coordenada, que resultou na morte de três assaltantes de banco, em Estrela, no início de fevereiro deste ano. As suspeitas da polícia é de que 'os homens explosivistas', inclusive, teriam vindo da região metropolitana.
"Sou católica, mas desta vez nem deu tempo de rezar"
Ao ouvir os primeiros disparos, a farmacêutica Patricia Castelli Canal, 34 anos, saltou do cama e tratou de pegar o bebê, de 10 meses, que dorme no berço ao lado. Junto com o marido, correram para o quarto da filha, de 6 anos, que fica nos fundos do apartamento. A família reside no 6º andar do prédio onde está instalada a agência do Sicredi, um dos alvos na madrugada passada.
"Acordei com o barulho dos disparos. Logo vi que não eram foguetes. Fomos para o quarto nos fundos e ficamos lá. Foi assustador, ficaram uns 15 minutos atirando. Deu um intervalo, depois começou novamente. Nessa hora tocou o telefone. Meu marido foi rastejando pegar o aparelho. Era minha irmã, que mora no prédio aqui perto, querendo saber como nós estávamos. Sou católica, rezo quando tem temporal, mas desta vez nem deu tempo, de tão rápido que foi. Meu marido estava preocupado com a explosão da agência", conta Patrícia, enquanto acompanhava a movimentação da perícia na manhã de ontem, atrás do balcão da farmácia em que trabalha, em frente a agência.
"Me deparei com uma cena assustadora"
"Vidros quebrados, pessoas mortas, carros abertos no meio da rua. Era uma cena de terror". A descrição foi feita por Alex Reginatto, 33 anos. Ele reside em um dos apartamentos no mesmo prédio da agência do Banco do Brasil, onde ocorreu o confronto. Três assaltantes foram surpreendidos pelos policiais e mortos dentro da agência.
"Eram umas duas horas da madrugada. Acordei com tiros e gritaria. Foi de pular da cama, terrível. Como o apartamento fica de frente para a rua, corri para o banheiro para me proteger. Lembrei na hora que tinha o banco embaixo e que poderia ser um assalto. Foi muito assustador", relatou. Natural de Paraí, Alex reside há cerca de dois anos no prédio, e diz que nesse período não havia ocorrido nenhum assalto ao banco. O carro dele, uma Palio Adventure, estava estacionado em frente a agência e acabou atingida por alguns disparos.
Palhaço
Pelas redes sociais, alguns integrantes da quadrilha morta em Paraí publicavam fotos e vídeos alusivos às figuras de palhaços. Na linguagem do crime, esse desenho é adotado para identificar pessoas ligadas a roubo com morte de policiais. Um deles, inclusive, possuía uma tatuagem em um dos braços com o rosto e as mãos de um palhaço, segurando notas de dinheiro. Suspeita-se que o grupo tenha levado máscaras com essa figura para o assalto às agências.
Nenhum policial ficou ferido na ação.
* Notícia atualizada às 12h09 do dia 7 de março para acréscimo de informações
rosto de um palhaço