Três dias antes de ser morta, em 27 de março do ano passado, uma passo-fundense de 62 anos foi à delegacia para registrar um boletim de ocorrência contra o companheiro. Antes do Poder Judiciário notificar a medida protetiva, o homem de 52 anos a matou com golpes de faca no bairro Petrópolis. O caso foi apenas um dos seis crimes de feminicídio ocorridos no município ao longo de 2020.
Durante a pandemia, quando o isolamento social se faz necessário para frear os contágios pelo coronavírus, as mortes violentas de mulheres em razão do gênero tiveram um aumento percentual de 100%, em Passo Fundo, se comparado aos óbitos pela mesma causa em 2019, segundo os indicadores fornecidos ao jornal O Nacional pela delegada Rafaela Bier, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM), na terça-feira (26). De três feminicídios consumados e 14 tentados, as mortes foram elevadas a seis nos últimos 12 meses com 11 tentativas de assassinato contra vítimas do sexo feminino. “As forças de segurança, em momento algum, pararam. Então, nós trabalhamos de forma muito efetiva durante a pandemia. O fato é que, para algumas vítimas pode ter sido mais dificultoso ir até a delegacia para o registro”, afirmou a delegada.
Embora os índices de feminicídio tenham aumentado, outros três indicadores de violência contra a mulher monitorados, no município, pela Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (SSP) apresentaram queda em 2020, de acordo com a planilha do órgão estadual atualizada no dia 10 de janeiro deste ano. As lesões corporais diminuíram 39,6% enquanto as denúncias de violação sexual caíram 31,4% e os registros de ameaças proferidas às companheiras pelos próprios parceiros de relacionamento ou ex-cônjuges foram 38,2% menos frequentes.
Subnotificação
Há, no entanto, um alerta para a subnotificação de violência doméstica. Isso porque, segundo explicou Rafaela, os policiais civis observaram um aumento nos casos de crimes violentos contra as mulheres, principalmente no início da pandemia. “Foram abertos os canais digitais, em aplicativo de mensagem, telefone e delegacia online, para recebimento de denúncias e para que a vítima pudesse contatar as autoridades públicas”, mencionou a delegada.
Essa elevação nos casos, aludida pela delegada, também foi sentida pela promotora legal popular de Passo Fundo, Valda Belitzki. Ela, junto a outras 18 voluntárias, atua no recebimento de chamadas telefônicas de passo-fundenses que buscam auxílio quando percebem uma situação de violência familiar. “Parece um ciclo em que elas não conseguem sair, ainda mais na pandemia”, observou. “Às vezes elas ligam só para desabafar ou tirar dúvidas, mas em alguns casos temos que comunicar a delegacia”, contou Valda.
A violência psicológica sofrida pelas moradoras locais, como pontuou a promotora, é o caso mais recorrente de agressão contra as mulheres na cidade. “Percebemos que houve, sim, um aumento. Semanalmente, chegamos a receber até três ligações de vítimas”, disse. “Elas têm medo de denunciar. Então, preferem ficar caladas. Muitas vezes é pelos filhos. A violência corporal, desaparece. A psicológica fica marcada”, enfatizou a voluntária.
Como denunciar
A Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) de Passo Fundo está localizada na Rua General Nascimento Vargas nº153. As denúncias podem ser realizadas pelo telefone (54) 3581-0725 ou pelo número 180 e, em casos de emergência, pelo 190.
O telefone do Serviço de Informação à Mulher também está à disposição para as vítimas pelo (54) 99610-5291.