Atribuições e competências

Os eleitores passo-fundenses vão eleger 21 vereadores para representá-los a partir de 2013. Especialista explica quais as responsabilidades dos futuros legisladores

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Redação ON

 Os 252 candidatos a vereador em Passo Fundo tem bandeiras e promessas que abrangem causas tão diversas como defesa dos animais, combate às drogas, diversidade sexual, direito dos aposentados e compromisso com os bairros. As intenções são de tal forma abrangentes que parece ilimitada a área de atuação dos parlamentares municipais. Mas o exercício da vereança pode ficar bem distante do que anunciam alguns dos que disputam as vagas.

Para o advogado especializado em direito político, André Leandro Barbi de Souza, muitas vezes propostas descabidas são feitas por desinformação daqueles que pleiteiam ser eleitos. Na opinião do especialista, o problema deveria ser sanado por parte das instituições partidárias, que são as reais detentoras dos mandatos, mas que permitem que muitos candidatos partam para um voo cego ao participarem das eleições.  “Os partidos políticos, como regra, ainda não assimilaram a sua responsabilidade quanto à formação política de seus filiados e à produção do conhecimento para o exercício dos cargos”, avalia. Barbi de Souza considera que o erro mais frequente cometido por candidatos a vereador é fazer promessas cuja realização não se encontra ao alcance da atividade parlamentar. A construção de creche, redução do valor da passagem de ônibus e aumento de servidores para qualificar o atendimento ao cidadão estão entre as ações que não competem à Câmara.

O eleitor que acessar o portal da Câmara na internet (www.cmpf.rs.gov.br) vai encontrar ações bem delimitadas listadas como atribuições dos vereadores. A elaboração de leis municipais, a função deliberativa em relação às questões internas da Casa, a fiscalização aos atos do Executivo e o julgamento político através de instituição de Comissões Parlamentares de Inquérito são as atividades elencadas.

Em 1º de janeiro de 2013 a Câmara volta a ter 21 parlamentares, número de cadeiras que vigorou entre 1977 e 2004. Serão nove cargos a mais do que o número atual de 12 cadeiras das legislaturas (2005-2008 e 2009-2012). Para que o algarismo seja traduzido em maior representatividade e qualidade do trabalho parlamentar, ON questionou André Leandro Barbi de Souza sobre o que esperar e exigir dos futuros vereadores. Na entrevista, o advogado também faz uma leitura do momento atual e as mudanças que o amadurecimento do processo democrático trouxe à atuação do legislativo municipal.

ENTREVISTA - André Leandro Barbi de Souza, advogado especializado em direito político

ON - Qual o papel da Câmara de Vereadores para a sociedade?

André - O papel da Câmara de vereadores é ser, no âmbito do município, o palco de discussão pública e de decisão política das grandes questões da sociedade e da cidadania, editando leis que, entre outros assuntos, definam as políticas públicas e os programas de governo, o funcionamento da prefeitura e de sua estrutura, inclusive quanto às autarquias, fundações e servidores; que regulem, no espaço local, os direitos fundamentais e sociais, suplementando, no que couber, a legislação federal e estadual; que regulamentem e disciplinem as diretrizes do ordenamento da cidade e de seu crescimento sustentável, preservação do meio ambiente e realização da mobilidade e da acessibilidade urbana. 

ON - Qual é a função do vereador?

André - A função do vereador é representar com responsabilidade a sociedade. Quanto à elaboração de leis, cabe ao vereador ficar atento a toda a matéria em tramitação na Câmara, pois cada projeto de lei traz, em seu conteúdo, o relato de um problema relacionado à vida da cidade, dos cidadãos ou das instituições, e a proposta de uma solução. Ao vereador cabe compreender as causas e consequências desse problema e avaliar se a solução proposta no projeto de lei é a mais adequada para a sociedade. Para melhor interpretar o sentimento do povo, o vereador pode propor audiência pública, na câmara, para ouvir os segmentos da sociedade envolvidos com o problema tratado no projeto de lei em tramitação. Na condição de representante da sociedade, é função do vereador acompanhar a administração pública local, seus atos e suas realizações para, anualmente, julgar, após análise do Tribunal de Contas do Estado, as contas do prefeito, que poderão ser aprovadas ou rejeitadas. O exercício responsável do mandato pressupõe a atuação do vereador comprometida com a sociedade e com os fundamentos democráticos, sem se afastar do padrão ético e orgânico estabelecido pelo seu partido. É bom lembrar que o Supremo Tribunal Federal definiu que o mandato pertence ao partido e não à pessoa que o exerce.

ON - O que a sociedade pode esperar do vereador?

André - Se essa pergunta fosse feita na década de 1990, a resposta seria assistencialismo. Hoje é diferente, a sociedade não deve esperar que o vereador cumpra o papel de assistente social ou despachante interno da prefeitura. A democracia evolui e o seu significado foi ampliado. A sociedade deve esperar do vereador disponibilidade para ouvi-la, honestidade no retorno daquilo que foi reivindicado, inclusive se a resposta for negativa, atenção técnica e responsabilidade política na hora de votar os projetos de lei e de fiscalizar as ações de governo e proatividade em busca de alternativas para os problemas da cidade. 

ON - Qual será o papel da próxima legislatura, considerando o atual momento político do país?

André - A Constituição Federal de 1988 foi um marco para a história do Brasil. A partir dela o Brasil vive o maior período democrático de sua história. É a primeira vez que o País realiza mais de dez eleições diretas em sequência, considerando os pleitos municipais, estaduais e federais. Cada eleição que passa acumula-se aprendizado, qualificam-se as regras eleitorais, reduzem-se os espaços para excessos ou abusos, compreende-se melhor o significado da representação política. Com o vereador não é diferente, pois a Constituição Federal de 1988 inovou também ao elevar o município à condição de unidade da federação, ao lado dos estados, do Distrito Federal e da União, por consequência estabeleceu um novo patamar para o exercício do mandato parlamentar, no âmbito local. O grande desafio dos vereadores na próxima legislatura é recepcionar e aprimorar, com o governo e com a sociedade, com responsabilidade e competência, as novas atribuições do município. Se o País está aprendendo a fazer democracia, as instituições estão se qualificando para o exercício de seus novos papéis. Temas importantíssimos entrarão em pauta nos próximos quatro anos, entre eles: o papel do município diante da segurança pública; o papel do município como agente de realização dos programas federais, mas com baixo retorno financeiro dos repasses federais para o atendimento dos respectivos encargos; estruturação da cidade e das diretrizes de mobilidade urbana e de acessibilidade, de ordenação da construção civil, o uso e a ocupação dos espaços públicos, os novos estágios dos sistemas de ensino e de saúde... A missão dos vereadores na próxima legislatura é envolverem-se com esses grandes temas, abrir debates qualificados, fomentando a participação da sociedade, em audiências públicas, pluralizando, de forma legítima, os ângulos de interpretação. O papel da próxima legislatura é fortalecer a câmara como um Poder, afirmando-a cada vez mais como uma instituição republicana. 

ON - O que é preciso para ser um bom vereador, mesmo que o eleito não tenha o conhecimento técnico necessário?

André - A Constituição Federal não exige, como condição para ser vereador, grau de escolaridade ou conhecimento técnico para o exercício do cargo. Se fosse assim, haveria uma espécie de elitismo democrático. Isso não afasta, no entanto, a responsabilidade do partido político em instruir minimamente os seus filiados sobre as funções relacionadas ao cargo de vereador. Depois de eleito, cabe ao vereador qualificar-se para o exercício de suas atribuições, dedicar tempo para o seu aperfeiçoamento, estudar o regimento interno da câmara, para entender as regras da atividade parlamentar. O problema não é o vereador não saber, desde que ele se mostre disposto a aprender; grave é o vereador não querer saber.  

ON - Você considera importante que o candidato também tenha conhecimento mínimo das atribuições de um vereador para ser candidato?

André - Mais importante do que o candidato ter conhecimento técnico sobre o exercício do cargo de vereador é o candidato ter a clara noção da responsabilidade política da função que ele assumirá. Não se trata de uma aventura ou de algo que permita supor ser possível exercê-la "do jeito que dá". Não se trata de um bico, mas de uma missão do mais alto valor republicano. Ser vereador não é um encargo pessoal, trata-se de uma função social, cuja execução exige responsabilidade. Ninguém é vereador para si e sim para a sociedade. Se isso for compreendido pelo candidato, a busca pelo conhecimento técnico passa a ser natural. É atribuição dos partidos políticos possibilitar aos seus filiados essa percepção.

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