Doações restritas

Com a proibição de doações de empresas à corrida eleitoral, os candidatos remetem-se a campanhas mais enxutas. Confira o que já foi traçado de gastos e despesas pelos candidatos a prefeito de Passo Fundo

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A minirreforma eleitoral sancionada em 2015 prevê que os candidatos a prefeito de Passo Fundo não gastem mais que R$ 440,9 mil na campanha eleitoral. A arrecadação deste valor – que corresponde a 70% do valor gasto pela campanha mais cara de 2012 – só pode acontecer com ajuda de doações de pessoas físicas ou do fundo partidário; doações de empresas, portanto, estão proibidas. Até o momento, a candidatura com maior valor registrado é a de Luciano Azevedo (PSB), que busca a reeleição. Dos R$ 162,3 mil que figuram na conta, R$ 118,8 mil estão declarados como doações de pessoas físicas. O restante é recurso do próprio candidato (R$ 43,5 mil). Do valor recebido, pouco mais de R$ 93 mil já foram gastos. A maior despesa do candidato é em serviço de produção de conteúdo para rádio e televisão (R$ 85 mil), seguido de publicidade de material impresso (R$ 9 mil).

Atrás dele está o progressista Osvaldo Gomes, que doou R$ 55 mil para a própria campanha e recebeu outros R$ 6 mil de pessoa física – o que totaliza R$ 61 mil em caixa. De acordo com o sistema do TSE, nenhuma despesa foi contratada até o momento. Já o candidato petista, Rui Lorenzato – que teve as primeiras doações registradas nessa sexta-feira (2) – possui R$ 10,7 mil na conta. Do total, R$ 7,3 mil são doações de pessoas físicas e outros R$ 3,4 mil de recursos próprios. Por ora, nenhuma despesa está registrada, mas há estimativa de que R$ 6,8 mil sejam gastos em transportes. Segundo ele, a campanha toda do PT de Passo Fundo deve custar, no máximo, de R$ 80 a R$ 100 mil. Até agora, o candidato do PSTU, Antônio Rodrigues, conta com recursos de R$ 1,6 mil para a campanha. Ele é o que mais recebeu doações exteriores: doou os primeiros R$ 600 e recebeu o restante de outros membros do partido. Nenhuma despesa foi registrada até o momento.

Por fim, o candidato do PSOL, Celso Dalberto, é o único que ainda não possui nenhum saldo em caixa: não recebeu doações nem registrou despesas até o fechamento desta edição. De acordo com ele, o material de rádio, televisão e panfletos foram realizados junto do partido a nível estadual e, portanto, constarão como doação no final da campanha. “Já não contávamos com doações de empresas antes. A partir de agora teremos a contribuição individual dos próprios militantes”, comentou, com acréscimo de que no máximo R$ 20 mil serão gastos na campanha deste ano.

Legislação ainda está longe do ideal”, diz procurador

Ainda que o objetivo do Supremo Tribunal Federal (STF) seja, a partir das novas regras de doação e prestação de contas, tornar o processo eleitoral mais igualitário, as mudanças não foram acompanhadas por uma reforma legislativa adequada. Esta é a visão do promotor de Justiça e coordenador do Gabinete de Assessoramento Eleitoral (GAEL) do Ministério Público do RS, Rodrigo López Zillio. Segundo ele, o congressista, em seu trabalho de sanção das novas regras, não buscou o aperfeiçoamento dos mecanismos de fiscalização nem o trato das prestações de contas eleitorais.

“Agora vamos ter uma eleição em outubro que vai ter um panorama novo, algo que a gente ainda não viveu. As empresas têm sido os maiores financiadores de campanha eleitoral. Se pegarmos as eleições de 2014, por exemplo, as empresas foram doadoras de cerca de 90% dos recursos declarados. Como vai funcionar uma eleição na qual a maior fonte de doação hoje é vedada de recurso?”, questiona Zillio. Esta mudança poderá, segundo ele, abrir portas para o aumento significativo do chamado 'caixa dois' – as empresas acabariam contribuindo com a campanha de modo ilegal, o que transforma o contexto das eleições de outubro em um “salto no escuro”, como refere o promotor. Por este motivo, a legislação eleitoral segue distante do considerado adequado. “A legislação ainda está longe do ideal. Posso afirmar ela confere alguns mecanismos de punição ao uso do caixa dois, que na esfera penal é punido como crime de falsidade ideológica eleitoral e pode acarretar em reclusão; na cível-eleitoral pode levar até a cassação e perda do mandato do diploma do candidato beneficiado pelo ilícito”, explica Zillio.

Segundo Zillio, a crítica em relação a legislação eleitoral é que o sistema atual de prestação de contas é ineficaz, já que o candidato tem suas contas de campanha desaprovadas e, ainda assim, não fica impedido de ser diplomado. “Ainda que ele cometa uma grave falha na questão de financiamento de campanha, para ter seu diploma cassado ou que se impeça a sua diplomação não basta a análise do Tribunal de Contas”, acrescenta. Para haver a condenação, é necessário que se abra uma nova ação que se discuta abuso econômico e de poder.

Mesmo que a legislação ainda esteja longe do ideal, a fiscalização melhorou a partir da minirreforma, com mecanismos que obrigam a divulgação dos recursos arrecadados pelos candidatos em até 72 horas após seu recebimento, por exemplo. “Isso confere, sim, mais transparência ao processo de prestação de contas, mas continua pecando no seu resultado final. Quando a Justiça Eleitoral analisa as contas dos candidatos no processo da prestação de contas, não existe nenhuma sanção que vai acarretar uma negativa ou uma diminuição na esfera jurídica do candidato”, aponta Zillio. Isso significa que as contas desaprovadas não acarretam em nada aos candidatos com contas ilegais – exceto se discutida em ação própria.

Fiscalização e denúncia

A legislação eleitoral segue sendo construída, mas é o eleitor quem tem papel fundamental nas eleições de 2016. “Sugiro que cada eleitor dispense um pouco do seu tempo e vá no dia 15 de setembro no site do TSE para verificar se o seu CPF não está sendo indevidamente usado para acobertar doações de empresas”, começa Zillio. O que pode ocorrer, como explica, é que, por conta da proibição de doações de empresas, aumente o uso indevido de CPFs “laranjas”. Ou seja: se pega o CPF de pessoas físicas, que não sabem que estão sendo usadas para irrigar dinheiro de empresas nas campanhas. “A partir disso se cria um laranjal de CPFs para legalizar recursos empresariais. Isso é um crime eleitoral, uma transgressão a legislação. Ao fazer isso, o eleitor exerce o papel de fiscalizador”, aponta. Denúncias de eventuais casos semelhantes podem ser encaminhadas ao Ministério Público para ações cabíveis. 

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