Cadê a UPA que estava aqui?

Apontada como alternativa para desafogar as emergências hospitalares, as UPAs esbarram em entraves burocráticos e falta de recursos para sua manutenção

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O próximo prefeito de Passo Fundo precisará lidar com a pressão popular que pede pela construção da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) no município. A política – lançada em 2003 pelo Ministério da Saúde – realiza o trabalho intermediário entre a unidade básica de saúde (UBS) e as emergências dos hospitais: no papel, a intenção é que a UPA funcione 24 horas por dia, sete dias por semana, e possa resolver grande parte das urgências e emergências, como pressão e febre alta, fraturas, cortes, infartos e derrames. A saga para receber uma UPA na cidade, no entanto, está longe de chegar ao fim: dois projetos foram elaborados em duas áreas diferentes; a verba já chegou ao caixa municipal e foi retirada pelo próprio Ministério da Saúde; e nada da UPA em Passo Fundo.

Na última quarta-feira (14) o Ministério da Saúde anunciou a qualificação de seis unidades no RS: o ministro Ricardo Barros afirmou que o repasse às prefeituras deverá aliviar o Estado, que vinha arcando com o custeio de todas UPAs. Apenas unidades em funcionamento, no entanto, foram contempladas e passam, a partir de agora, a contar com o financiamento federal de R$ 1,775 milhões mensais. Nenhuma das cidades é da região: se trata de Bento Gonçalves, Santa Maria, São Leopoldo, Sapiranga, Tramandaí e Viamão. Nesta reportagem o leitor acompanha os motivos para a demora no processo e, mais que isso, as propostas dos candidatos a prefeito de Passo Fundo para buscar agilidade – e/ou solução – à questão.

Onde tudo começa
Assim como a maioria das cidades de médio e grande porte do país, Passo Fundo se credenciou em um dos editais lançados pelo governo federal ainda em 2010. O documento que habilitava o município chegou junto com a verba: estava tudo pronto para Passo Fundo ter, sim, sua própria UPA. Com o dinheiro em caixa e o projeto aprovado, era só começar a obra que, a princípio, ficaria localizada no atual estacionamento do Hospital Municipal – uma área pública, com o tamanho suficiente para a nova unidade. Em 2013, no entanto, uma vistoria da Secretaria Estadual de Saúde impediu o início da obra. “Eles disseram: se vocês construírem aqui, ou interditam a UPA ou interditam o hospital. Um não pode ficar ao lado do outro”, conta o secretário municipal de saúde, Luiz Arthur Rosa Filho, que esteve presente na vistoria do terreno. Esta negativa zerou o processo: um novo projeto foi solicitado para, então, sair a busca de uma nova área.

A partir disso a UPA foi remanejada para onde hoje está o Estádio Municipal Delmar Sitoni – local onde se realiza a maior parte dos jogos amadores da cidade. A aprovação do novo terreno chegou em setembro de 2015, mas neste momento Passo Fundo já não tinha mais dinheiro para construção da unidade: a verba federal foi recolhida pelo Ministério da Saúde, que percebeu a demora para utilização do recurso. Logo, o projeto para construção da UPA de Passo Fundo estava aprovada – mas não havia dinheiro para a sua realização. Quando questionado, o Ministério afirmou que lançaria em março de 2016 um novo edital – mas até agora, nenhum comunicado ou edital foi estabelecido.

Responsabilidade de quem?
Carazinho, Frederico Westphalen e Erechim, por exemplo, fazem parte das cidades gaúchas que receberam a verba para construção do prédio do governo federal e o já possuem uma UPA. Das três, no entanto, apenas a unidade de Erechim abriu suas portas – e o local não funciona exatamente como previsto pelo projeto primário, que prevê atendimento constante e ininterrupto. O problema, de acordo com o secretário municipal da saúde erechinense, Plínio Costa Jr., é a falta de dinheiro para manter a unidade. A princípio, a UPA é uma política federal e, portanto, conta com este recurso para que funcione. “Nossa UPA está aberta, mas é o município quem banca”, começa.

O secretário explica que é “praticamente impossível” Erechim manter a unidade como previsto pelo Ministério da Saúde já que não recebe auxílio do governo federal ou estadual para isso. “Se depender da verba federal ou estadual não tem como. Ganharíamos, por exemplo, R$ 500 mil do federal para pagar uma parte e restaria outros R$ 500 mil para o município. É inviável”, ressalta. A pressão popular, no entanto, pedia pela UPA. O jeito foi aproveitar o espaço e transformá-la em uma espécie de ambulatório que concentra em si o Centro de Referência da Mulher e UBS do centro. Assim o gasto mensal previsto pelo projeto cai de R$ 1 milhão para R$ 120 mil – mas, desta vez, apenas com recursos municipais. Como reduziu tanto? A resposta está no tempo de funcionamento: em Erechim, ela opera como um posto de saúde: atende de segunda a sexta-feira, 12 horas por dia. Fraturas e atendimentos ortopédicos, por exemplo – que são previstos como tratamento das UPAs – são encaminhados ao hospital que fica na quadra próxima – Hospital Santa Terezinha, que atende pelo Sistema Único de Saúde (SUS), já que a unidade ainda não possui equipamento de raio x e infraestrutura suficiente para oferecer este tipo de trabalho.

Em Carazinho, a UPA segue fechada desde sua conclusão, há mais de um ano. A intenção do município, como informou um representante da Secretaria Municipal de Saúde, é que o local se transforme – assim como em Erechim – em ambulatório que não funcione 24 horas, já que também não há condições financeiras para tal procedimento. O local já tem um aparelho de raio x comprado, além da empresa que realizará a instalação dos armários e outros materiais de uso geral – e nada além disso. Com as portas fechadas, as únicas pessoas que frequentam o local são guardas de segurança, por medo do vandalismo. “Todos clamam [pela UPA], inclusive nós, gestores públicos. Para isso precisamos da portaria do governo, para que possamos financiar a obra. É da nossa vontade, mas não temos condições”, reafirmou o representante.

Isso acontece por que, quando o projeto das UPAs foi proposto, não houve uma adaptação correta sobre como se financiaria R$ 1 milhão por mês para funcionamento das unidades – valor que representa o cálculo estimado do valor que engloba desde a manutenção até o pagamento de funcionários. No acerto com o governo federal, ficaria resolvido que este pagaria R$ 500 mil (50%), o Estado entraria com mais 25% (R$ 250 mil) e o município, por fim, com o restante. “O problema é que o governo federal oferece R$ 500 mil como um gasto fixo. Se a UPA, num mês, custar R$ 1,5 milhão, o município precisa colocar R$ 750 mil para fugir da dívida”, explica o secretário Luiz Arthur. Em Passo Fundo, portanto, não existe nenhuma possibilidade credenciamento da UPA com ajuda do recurso federal. “O governo federal não conseguiu nem abrir as que já tem. Ele não tem uma solução para Frederico Westphalen ou Carazinho. Os municípios, por consequência, ficam com medo de abrir por possível falta de pagamento e, enquanto isso, vão ficando como elefantes brancos nesses lugares”, completa.

Qual é a chance?
A maior possibilidade é que se os técnicos do governo estadual não tivessem recusado a construção da UPA atrás do Hospital Municipal, Passo Fundo já teria seu prédio construído. “Neste caso, ou ela estaria funcionando as custas do município, ou estaria fechada, como estão tantas outras”, acrescenta Rosa Filho. Hoje a chance de termos uma UPA é praticamente nula. “Esta não é uma mais política federal. Eu diria que faz dois anos que não é uma política levada a sério. Quem pensou isso em 2003, pensou em unidades intermediárias entre hospitais e unidades básicas de saúde; e pensou certo, mas na hora de operacionalizar, elas não foram feitas de maneira utilitária”, pontua o secretário de Passo Fundo. Por isso cabe dizer que, no momento, nada está acontecendo que dê andamento ao processo da implantação da UPA em Passo Fundo. A aposta, no entanto, é que nos próximos anos o governo federal flexibilize o processo e pague determinado valor para os municípios construírem suas próprias centrais de atendimento. “Eu diria que a UPA é uma política ultrapassada. Ninguém pretende construir uma, por que ninguém vai conseguir pagar”, finaliza Rosa Filho.

E aí, candidato?
O município segue nas tratativas para receber uma UPA há, pelo menos, quatro anos. Como prefeito de Passo Fundo, como o candidato deve atuar para trazer, o mais breve possível, uma UPA para o município? E se não for uma UPA, qual a melhor solução? Qual a sua proposta?

Antônio Rodrigues (PSTU)
“Os cortes do orçamento federal na área da saúde feitos por Dilma e aprofundados por Temer são responsáveis pelo atraso na construção da Unidade de Pronto Atendimento. É preciso pressionar o Ministério da Saúde pela liberação das verbas e, ao mesmo tempo, gerar maiores receitas municipais com a aplicação do IPTU progressivo, onde os ricos pagarão mais, os pobres menos e os desempregados serão isentos”.

Celso Dalberto (PSOL)
“A nossa posição é que, imediatamente após assumir a Prefeitura, encaminharemos a UPA. Passo Fundo precisa de um sistema de prontuários integrados acessível a rede hospitalar, para evitar a necessidade de duplicação de atendimento e aumentar a eficiência dos processos. Propomos garantia de acesso a política de saúde mental, com implantação do CAPS; saúde para todos e a garantia que nenhum LGBT deixe de receber atendimento médico adequado e política de atendimento aos idosos. Saúde de qualidade significa construir uma gestão voltada à prevenção e ao investimento na atenção primária e secundária para reduzir as superlotações nos hospitais e pronto atendimentos”.

Luciano Azevedo (PSB)
“É possível ver que desde o início da gestão nunca deixamos de buscar a consolidação de uma estrutura de UPA para Passo Fundo. Além da dificuldade burocrática e financeira referente à UPA, também temos outro quadro: o não repasse de recursos. Por lei, a gestão das UPAs são compartilhadas entre as três esferas – Município, Estado e União –, mas, o que está acontecendo é uma sobrecarga das prefeituras, que acabam tendo de investir mais do que as outras duas esferas. O Governo Federal não tem garantido sequer o funcionamento das unidades que estão prontas, inclusive, não credenciando nenhum serviço desde 2013. Apenas no Rio Grande do Sul, há 14 unidades prontas que estão fechadas por este motivo. É importante lembrar que avançamos muito na estrutura da saúde, com 15 novas unidades básicas de saúde e três CAIS revitalizados. Vamos continuar investindo nessas melhorias. Em levantamento feito pela Revista Istoé, Passo Fundo foi considerada a melhor cidade média do país em saúde. Mesmo assim, sabemos que é preciso avançar ainda mais”.

Osvaldo Gomes (PP)
“Em meu primeiro governo em Passo Fundo, nos anos 1993 a 1996, estabelecemos as bases da atual estrutura de saúde pública da cidade. Através do projeto CURA (Bird – Banco Mundial), obtivemos recursos para iniciar o que naquela época representava uma inovação muito importante na estruturação da Rede Básica de Saúde das Cidades. Coerente com o programa da Organização Pan Americana da Saúde (OPAS) “Saúde para todos”, iniciamos um projeto, previsto no Plano Municipal de Saúde. No segundo mandato, de 2001 a 2004, com o projeto da Rede Centros Integrados de Atenção a Saúde (CAIS), construímos e colocamos em funcionamento os CAIS Boqueirão, Petrópolis, São Cristóvão, Hípica e Luíza. Desta forma existia um cinturão de proteção as unidades hospitalares sediadas na cidade – HSVP, HC e HMCS; unidades que possuem serviços de urgência e emergência, mas que pela natureza e complexidade instalada, são serviços macro-regionais e recebem usuários da região sul do Brasil. Portanto, é prioridade de imediato reestruturar o pronto-atendimento 24 horas no Hospital Municipal para atender a demanda dos passo-fundenses. A seguir, vamos operacionalizar o projeto para implantação de uma UPA24h de porte III na cidade”.

Rui Lorenzato (PT)

 “Nossa cidade possui hospitais e especialistas de referência para todo o sul do Brasil, mas a atenção básica, de responsabilidade exclusiva da prefeitura deixa a desejar. Apenas um em cada quatro passo-fundenses é atendido pela estratégia de saúde da família, faltam exames e as consultas levam meses para serem realizadas. Por não ter o atendimento básico, qualquer problema acaba sendo resolvido nos hospitais. Nosso compromisso é fortalecer o SUS para ter uma atenção integral, garantindo que a Estratégia de Saúde da Família chegue a 100% da população. As Unidades de Pronto Atendimento - UPA são uma política criada pelos governos Lula e Dilma do PT. Nosso governo garantirá a contrapartida da prefeitura para a implantação da UPA. Até hoje esta obra não saiu do papel pois a prefeitura não teve decisão política e prioridade em implantar este serviço. O recuso para a construção já estava garantido desde a gestão Dipp e Cecconello e a obra não saiu do papel”. 

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