Em uma das sessões mais tensas do ano, os vereadores de Passo Fundo aprovaram ontem, por 15 votos a 2, o Substitutivo ao Projeto de Lei 14-2018 para que toda a menção à palavra 'gênero' no Plano Municipal de Educação (PME), seja sempre complementada pelos adjetivos 'masculino' e 'feminino'. O resultado da votação foi recebido com vaias por metade do público que ocupava o plenário, formado por professores da rede municipal e representantes de grupos LGBTS. Já, a outra metade, identificada pela bandeira do Movimento Ordem e Progresso (MOP), aplaudiu a decisão. Ao final da votação, os ânimos se acirraram, com provocações e ameaças. O presidente da Casa, vereador Pedro Danelli, teve de encerrar a sessão. O projeto segue para apreciação do Executivo.
O projeto original, prevendo a retirada da palavra "gênero", do PME, havia sido apresentado em 2017, pelos vereadores Mateus Wesp (PSDB) e Ronaldo Rosa (Solidariedade), mas acabou arquivado. Ele voltou à pauta este ano com apresentação do Substitutivo feito pelo vereador Roberto Gabriel Toson.
Logo na abertura dos trabalhos, as primeiras vaias dos manifestantes contrários à alteração do Plano, foram direcionadas para o vereador Paulo Neckel, ao solicitar a suspensão da sessão por falta de silêncio no local. O mesmo grupo vaiou o vereador Mateus Wesp quando ele sugeriu a intervenção das forças de segurança para acalmar os ânimos. A Brigada Militar estava presente no local. Por várias vezes, o presidente Danelli ameaçou suspender a sessão em razão dos protestos.
Autor do projeto original, em uma de suas falas, Wesp apresentou no telão, 14 pontos justificando a aprovação do Substitutivo. "Quem não concorda com a especificação, o detalhamento da palavra 'gênero', e quer deixar o termo vago e aberto, provavelmente acredita na teoria/ideologia de gênero e tem a pretensão de ensinar às crianças e adolescentes que existem centenas de outros gêneros sem vinculação com o sexo biológico (e que não estão previstos no ordenamento jurídico brasileiro, nem possuem embasamento científico). É contra essa pretensão que nos opomos", justificou no oitavo ponto.
Dos 17 vereadores presentes, apenas Alex Necker (PC do B) e Gleisson Consalter (PSB), votaram contra. Márcio Patussi (PDT) e Fernando Rigon (PSDB) estavam em Porto Alegre. Necker justificou sua decisão alegando inconstitucionalidade na matéria. Segundo ele, a aprovação do Plano, em 2015, foi uma ampla discussão da sociedade e que as mudanças somente poderão ocorrer após um período de quatro anos. "Esse prazo está previsto na própria legislação quando aprovamos o PME. Essa política pública precisa ser monitorada e respeitado o período. Após, será chamado um grande fórum, reunindo todos os setores envolvidos no debate, para ver se procede alguma alteração. A modificação aprovada hoje é um retrocesso para a educação municipal. Não é à toa que em vários lugares do Brasil, municípios que fizeram modificações similares, todas foram consideradas inconstitucionais ou tornadas liminarmente sem valor" observou.
Autor do Substitutivo, o vereador Roberto Toson disse que existe 'uma linha adotada pelo Executivo de levantar o discurso da inconstitucionalidade da proposta'. "Quando apresentei o Substitutivo foi com o intuito de enquadrar o que diz nossa Constituição Federal, nossa Lei de Execuções Penais, nosso Regime Previdenciário, Código Civil, tudo isso. O Plano Municipal foi instituído por uma lei ordinária, portanto, não pode se sobrepor a nossa Lei Orgânica Municipal. Ocorre que essa lei ordinária institui certos pré-requisitos, como a necessidade de discussão popular, através de fóruns fora da Câmara de Vereadores, e o prazo mínimo de quatro anos para que seja discutida. Isso não é previsto na nossa Lei Orgânica. Estamos sim, de acordo com nossa lei, que é superior ao PME, é ele quem deve se adequar. Colocamos o Plano dentro das diretrizes da nossa Lei Orgânica. Temos o respaldo favorável da Procuradoria da Câmara de Vereadores ao nosso Substitutivo", declarou.
Professor municipal e integrante da direção colegiada do CMP/ Sindicato, Altair José Follador, disse que a alteração do Plano, não altera atuação em sala de aula, apenas cria um debate que desgasta a imagem do professor. "É por isso que estamos protestando. O Plano, na verdade, orienta as políticas públicas, não aquilo que o professor vai fazer na sala de aula. Ele diz, por exemplo, que tem de haver creche para todas as crianças, uma formação do professor para enfrentar a complexidade dentro da sala de aula. A questão de gênero, por exemplo, diz respeito quando vem uma criança fazer a matrícula. Ela é filha de um casal homoafetivo. Essa criança será tratada dentro da rotina da sala de aula, terá dias das mãe, dos pais. O professor estará preparado para lidar com essas questões" explica.
Frases durante a sessão
"Não vou ser sugado por uma ideologia política que quer desestruturar a família brasileira" Ronaldo Rosa
"Pensei que não havia baderna maior que a rua Independência em Passo Fundo, mas hoje vi que tem". Paulo Neckel
"Esses tempos de aceitar essas frescuras e palhaçadas nas escolas acabou". Renato Tchieker
"Disseram nas redes sociais que iriam me dar um 'bafo'. Estou há 22 anos na Casa. Já prendi muito bandido, dei tiro, levei tiro, na atividade de policial, nunca levei bafo e não vai ser agora". Luis Miguel Scheis