Com R$ 4,9 bilhões, Fundo Eleitoral triplicou desde 2018

Saiba como funciona o regramento de distribuição e uso, e quanto cada partido vai receber para financiar a próxima campanha. PL e PT são os maiores beneficiários

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Foi na esteira do debate sobre os efeitos da influência econômica na política, gerada a partir da contribuição privada às candidaturas, que adota-se em 2017 o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), comumente chamado de Fundão Eleitoral. De lá para cá, o caixa público se tornou a principal fonte financiadora das agremiações para a disputa pelos votos que ocorre a cada dois anos. Às vésperas de mais um pleito, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tornou público que, neste ano, 29 partidos receberão um total de R$ 4.961.519.777,00, valor estabelecido pelo Congresso Nacional para gastos com a corrida eleitoral, e que representa cerca de três vezes mais do que o total destinado a esse fim em 2018 (R$ 1,7 bilhão), primeira eleição com esse aporte público.

O Fundo Eleitoral é o principal meio de obtenção de recursos pelas siglas para o período, mas não o único. A ele, junta-se o Fundo Partidário, com objetivo natural diferente. O primeiro é voltado exclusivamente para o financiamento de campanhas eleitorais e é distribuído somente no ano da eleição. Já o Fundo Partidário é destinado à manutenção dos partidos políticos e é distribuído mensalmente para custear despesas cotidianas das legendas, como contas de luz, água, aluguel, passagens aéreas e salários de funcionários.

Por mais de cinco décadas, o Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, o Fundo Partidário, foi a única fonte de recurso público destinado aos partidos políticos. Até que, em 2017, o Congresso Nacional aprovou a criação do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para compensar o fim do financiamento privado estabelecido em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“Quando o Supremo decide dessa forma, se passou a proibir que pessoas jurídicas fizessem doações, especialmente para as campanhas em todos os níveis”, pontua o professor do Direito da Universidade de Passo Fundo (UPF), Doutor em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Giovani Corralo. “Assim, são dois fundos: o Fundo Partidário, que anualmente destina recursos para os partidos políticos, em torno de R$ 1 bilhão por ano, e o Fundo Especial de Campanha a cada dois anos, ora para as eleições estaduais e federais, ora para as eleições municipais”. Ele evidencia, todavia, que é corriqueiro as siglas reforçarem o caixa da campanha com o Fundo Partidário. “O que a gente observa é que, nas eleições, os partidos destinam recursos do Fundo Especial de Campanha e também recursos do Fundo Partidário para as candidaturas. Não há problemas quanto a isso”, resume.

Giovani Corralo é professor do Direito da UPF, Doutor em Direito do Estado pela UFPR, autor de diversos artigos científicos e livros.- Foto arquivo pessoal

Passados cerca de nove anos desde a decisão do STF, Corralo aponta que a questão ainda gera divergência. “O que se discute até hoje é até que ponto o Supremo Tribunal Federal deveria ter declarado inconstitucionalidade da nossa legislação que permitia a doação de pessoas jurídicas para campanhas. Até que ponto nós não tivemos um ativismo do Supremo Tribunal Federal, que eu particularmente concordo com essa crítica. Em outras palavras, eu estou naqueles que não vê inconstitucionalidade na nossa legislação que previa a possibilidade de pessoas jurídicas doarem recursos para campanhas, mas em 2015 o Supremo firmou esse entendimento, e, enquanto mantido, é o que vale”, reitera.

Além do Brasil, o sistema é adotado amplamente pelo globo, como na Alemanha, França, México, e Estados Unidos, por exemplo, em maior ou menor grau e com suas especificidades. “Cada democracia criou o seu modelo e os seus critérios para o uso de recursos públicos que variam de Estado para Estado. O modelo brasileiro, então, é um modelo único, e que nos leva a essa conciliação de recursos privados de pessoas físicas [até 10% da declaração do IR do último ano], com recursos públicos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Campanha”.

O total de recursos distribuídos pelo Fundo Eleitoral é definido pela Lei Orçamentária Anual (LOA) e transferido pelo Tesouro Nacional ao TSE, responsável pelo repasse dos valores aos diretórios nacionais dos partidos políticos.

Valor triplicou

No pleito de 2018, foi distribuído R$ 1,7 bilhão do Fundo Eleitoral para as legendas financiarem as campanhas daquele ano. Nas Eleições Municipais de 2020, o montante totalizou R$ 2,03 bilhões. Nas Eleições Gerais de 2022, a quantia atingiu R$ 4,9 bilhões, que foram divididos entre os 32 partidos registrados no TSE naquele momento. Conforme a lei aprovada pelo Congresso Nacional, o valor do Fundo Eleitoral para as Eleições Municipais de 2024 será de R$ 4,9 bilhões. Os dados são do TSE.

Arte Édson Coltz/ Foto divulgação TSE


Os recursos do FEFC são distribuídos conforme os seguintes critérios: 2%, divididos igualitariamente entre todas as legendas com estatutos registrados no TSE; 35%, divididos entre os partidos que tenham, pelo menos, um representante na Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos obtidos na última eleição; 48%, divididos entre as siglas, na proporção do número de representantes na Câmara, consideradas as legendas dos titulares; 15%, divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes no Senado Federal, consideradas as legendas dos titulares.

Nesse contexto, no atual processo eleitoral, o partido que vai receber a maior fatia do total do fundo será o PL. A legenda poderá dividir R$ 886,8 milhões entre seus candidatos aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador. Em segundo lugar, está o PT, que receberá R$ 619,8 milhões. Em seguida, aparecem o União (R$ 536,5 milhões); PSD (R$ 420,9 milhões); PP (417,2 milhões); MDB (R$ 404,6 milhões) e Republicanos (R$ 343,9 milhões). O Agir, DC, PCB, PCO, PSTU e UP ficarão com os menores recursos e poderão gastar em torno de R$ 3,4 milhões nas suas campanhas – veja na tabela a lista completa.

Arte Mateus Batistella/ O Nacional


Critérios de distribuição nas siglas

Para receber os recursos, cada partido precisa definir critérios de distribuição às candidatas e aos candidatos, de acordo com a lei, respeitando, por exemplo, a cota por gênero e raça. O plano deve ser homologado pelo TSE.

Tais critérios devem prever a obrigação de aplicação do total recebido do Fundo de acordo com os seguintes percentuais: para as candidaturas femininas, o percentual corresponderá à proporção dessas candidaturas em relação à soma das candidaturas masculinas e femininas do partido, não podendo ser inferior a 30%; para as candidaturas de pessoas negras, o percentual corresponderá à proporção de mulheres negras e não negras da sigla, homens negros e não negros da legenda; os percentuais de candidaturas femininas e de pessoas negras serão obtidos pela razão dessas candidaturas em relação ao total de candidaturas do partido em âmbito nacional.

“O TSE tem uma resolução especificamente sobre os recursos do Fundo Especial de Campanha, que somente ficam à disposição do partido político após cada partido, de forma autônoma, apresentar os critérios para a utilização desses recursos, critérios que têm que ser aprovados pela direção executiva nacional do partido”, esclarece o Dr. Giovani Corralo.

Em sua visão, essas regras têm auxiliado numa distribuição mais equânime dos recursos, mas pondera “que são os partidos que dispõem de autonomia para definir os critérios para a distribuição e, é claro, que podem trazer desequilíbrio dentro dos próprios partidos em relação àqueles que já possuam mandato, comparativamente a quem não possua. São critérios que os partidos definem e que são válidos, observando-se aí essa proporção de candidaturas masculinas e femininas e também de candidaturas de negros e negras”.

Os recursos do Fundo Eleitoral que não forem utilizados nas campanhas devem ser devolvidos ao Tesouro Nacional, de maneira integral, no momento da apresentação da respectiva prestação de contas pelos partidos políticos. Esse balancete é uma exigência do TSE para, também, acompanhar o uso do dinheiro. “A Justiça Eleitoral tem feito seu trabalho de averiguar se esses recursos têm sido utilizados de acordo com a nossa legislação. Recentemente, vimos uma polêmica envolvendo o Partido Cidadania, referente a recursos do Fundo Partidário, que o TSE decidiu pela devolução de R$ 1,5 milhão de recursos que foram utilizados indevidamente em 2019. Então, nós falamos sim de um trabalho que a Justiça Eleitoral tem feito para analisar a prestação de contas e obviamente se esses recursos têm sido utilizados de acordo com o que prevê a nossa legislação: Fundo Partidário para as ações dos partidos políticos, e também podendo ser usado para as campanhas, e o Fundo Especial de Campanha exclusivamente para aquelas ações lícitas dos candidatos nos processos eleitorais”, finaliza.

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