Por que um candidato a vereador bem votado pode não ser eleito?

País adota dois sistemas distintos para a eleição de legisladores e prefeitos: o proporcional e o majoritário. Entenda as diferenças

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Apesar de contar com 21 cadeiras no Legislativo Municipal, dentre os que aparecem na lista dos 21 candidatos mais votados para vereador (a) em Passo Fundo, em 2020, cinco não foram proclamados eleitos, e não assumiram mandato. A explicação está no sistema proporcional de votação, adotado no Brasil nas eleições para a Câmara dos Deputados, assembleias legislativas estaduais, Câmara Legislativa do Distrito Federal e câmaras municipais, conforme determina a Constituição Federal e o Código Eleitoral. Diferente da eleição majoritária, usada no pleito para prefeito, não basta ser o escolhido pelo maior número de eleitores para representá-los no Parlamento.

Nas eleições para o cargo de vereador, os parlamentares eleitos são definidos por meio de critérios de classificação que têm como base os cálculos do quociente eleitoral e do quociente partidário. A Resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nº 23.677/2021, com as alterações promovidas pela Resolução nº 23.734/2024, dispõe, entre outros pontos, sobre os sistemas eleitorais proporcional e majoritário.

A norma explica que, nas eleições para as prefeituras de municípios com menos de 200 mil eleitoras e eleitores, basta a maioria simples: quem tiver mais votos se elege, não havendo a possibilidade de segundo turno nessas localidades. Por aqui, são cerca de 150 mil eleitores cadastrados, ou seja, a definição ocorre em um turno apenas.

Para os cargos legislativos, no entanto, o processo que resulta na definição de quem ocupará as cadeiras é distinto. Com o sistema proporcional, não se considera apenas a votação nominal (individual) da candidata ou candidato, mas também o total de votos dados ao partido ou federação. “Primeiro, são somados os votos de cada partido ou federação, e depois, em uma segunda etapa, os de cada candidato (a), sendo eleitos (as) os mais votados (as) de cada partido conforme as vagas que o partido obteve”, resume o advogado Leandro Gaspar Scalabrin. As federações partidárias são consideradas como um só partido político.

O advogado Leandro Gaspar Scalabrin- Foto arquivo pessoal

Conforme entende, o sistema proporcional é o que confere mais representatividade aos eleitos e eleitas, que representarão uma parcela maior da sociedade, através da mediação dos partidos políticos e federações. “A Câmara de Vereadores é o lugar de se formar a ‘vontade geral’ da cidade, a partir das ‘vontades parciais’ de cada ‘parte’ da sociedade que conseguiu eleger um (a) ‘representante’. A pessoa eleita não representa a si própria na Câmara, mas uma parte da sociedade, e quanto maior for essa parte que ela representa, mais legitimidade tem o sistema e mais fortalecida a democracia”, considera o advogado.

O sistema proporcional contribui, na prática, com o fortalecimento dos partidos como instituições políticas. “Eles são fundamentais na democracia. Quando você vota em um candidato ou candidata, você também está votando num partido, que media a relação dos cidadãos (eleitores) e seus representantes, os quais ficam submetidos ao mandato e fidelidade partidária, aos princípios, valores, programa e ideologia do mesmo, pela razão de que esse (a) representante não se elegeu apenas com os seus próprios votos, mas com um número ‘x’ de votos de todo o partido que ele ou ela vai representar”, complementa Leandro Scalabrin.

Considerando que, diferentemente das eleições majoritárias, as vagas conquistadas em eleições proporcionais pertencem aos partidos, quem preenche essas vagas só pode se desfiliar durante a janela partidária - período de 30 dias anteriores ao prazo de filiação para concorrer à eleição. Desvio do programa partidário ou grave discriminação também são razões previstas em lei para troca de partido. Mudanças de legenda para além desses motivos podem levar à perda do mandato.

Os cálculos

O quociente eleitoral é determinado pela divisão da quantidade de votos válidos apurados pelo número de vagas a preencher. Para o cálculo, despreza-se a fração, se igual ou inferior a 0,5, ou arredonda-se para um, se superior.

O quociente partidário é o resultado do número de votos válidos obtidos pelo partido dividido pelo quociente eleitoral (desprezada a fração). O total corresponderá ao número de cadeiras a serem ocupadas pela legenda.

Com base nos cálculos, o partido ou a federação verifica os candidatos mais votados nominalmente para o preenchimento das vagas. Serão eleitas e eleitos somente aqueles que tiverem votos em número igual ou superior a 10% do quociente eleitoral. Serão esses que vão ocupar as vagas a que o respectivo partido ou federação tem direito. Se houver sobras de vagas, elas serão distribuídas pelo cálculo da média de cada partido ou federação.

Distribuição das sobras tem nova regra

Em fevereiro deste ano, o Plenário do STF invalidou restrição de acesso de partidos e candidatos à segunda etapa de distribuição das sobras eleitorais, vagas não preenchidas nas eleições proporcionais. Com a decisão, todos os partidos poderão participar da última fase de distribuição dessas vagas, antes reservada aos que atingissem cláusula de desempenho.

Por maioria de votos, prevaleceu o entendimento de que a aplicação dessa cláusula de desempenho, que exigia o atingimento de 80% do quociente eleitoral, para os partidos, e 20% para os candidatos, introduzida no Código Eleitoral pela Lei 14.211/2021, na última fase da distribuição de vagas, inviabilizaria a ocupação de lugares no parlamento por partidos pequenos e por candidatos que tenham votação expressiva.

A lei estabelece que as vagas nas eleições proporcionais são distribuídas em três fases. Inicialmente as vagas são distribuídas aos partidos que obtiveram 100% do quociente eleitoral e preenchidas pelos candidatos que tenham tido votos em número igual ou superior a 10% do quociente.

Na segunda fase, em que começam a ser distribuídas as sobras, participam os partidos com pelo menos 80% do quociente eleitoral, e os candidatos com votação igual ou superior a 20% desse quociente.

Ainda havendo vagas residuais, as sobras das sobras, a lei prevê que as cadeiras sejam distribuídas aos partidos que apresentarem as maiores médias. Ou seja, a partir das eleições deste ano, todos os partidos e federações podem concorrer às últimas vagas, que são obtidas diretamente pelas legendas que tiverem a maior média e ocupadas pelos seus candidatos mais votados.

Na visão do advogado Leandro Scalabrin, mesmo com a decisão do STF, não significa que as legendas menores serão favorecidas. “A tendência seguirá sendo a de reduzir o número de partidos e federações com representação, e os que tiverem assento aumentarem sua representação. As federações partidárias são a alternativa de sobrevivência dos pequenos partidos, assim como as candidaturas coletivas – que ainda não são regulamentadas para essa eleição – sejam a tendência das próximas eleições”.

A média de cada partido é determinada pela quantidade de votos válidos recebidos dividida pelo quociente partidário mais 1. O partido ou federação com maior média leva a vaga. Se mais de uma cadeira estiver sobrando, essa operação é refeita acrescentando mais 1 ao divisor do partido que recebeu a vaga anterior.

Suplentes

Segundo a norma, serão considerados suplentes dos partidos políticos e das federações que obtiveram vaga os mais votados sob a mesma legenda ou federação e que não foram efetivamente eleitos. A lista de suplentes obedecerá à ordem decrescente de votação. Em caso de empate na votação, a ordem se dará de forma decrescente de idade. Na definição de suplentes, não há exigência de votação nominal mínima.


Afinal, quantos votos elegem um vereador em Passo Fundo?

Os cálculos, portanto, levam em conta os números obtidos durante a votação, que neste ano ocorrerá no domingo, 6 de outubro. Entretanto, tomando por base os resultados das últimas duas eleições, o advogado Leandro Scalabrin faz uma projeção do índice necessário pelo candidato ou candidata para conquistar uma das 21 vagas no Parlamento passo-fundense no próximo pleito.

Conforme recorda, em 2020, ninguém se garantiu no posto com menos de 3.567 votos do seu partido. “Nenhum vereador ou vereadora se elegeu sozinho em 2020 – pois nenhum fez essa quantia de votos”, frisa. Esse número de votos foi o necessário para eleger a última vaga preenchida, a 21ª vaga. Todos os demais ocupantes de uma das cadeiras se elegeram com votação entre 3.567 e 4.739 votos, “mas ninguém fez sozinho essa votação”, reitera.

Para o cálculo, Scalabrin considera que, em 2020, estavam aptos a votar 146.664 eleitores em Passo Fundo, sendo que 37.337 (25%) se abstiveram, e 100.988 votaram. “Destes, houve 9.807 votos nulos, anulados e brancos, restando 99.520 votos válidos. O número de votos válidos dividido pelo número de vagas (21) é que determinada o quociente eleitoral, que foi de 4.739 votos. Treze vagas foram preenchidas por quociente eleitoral. As outras oito vagas foram preenchidas pelas sobras dos votos. Em cada uma das vagas das ‘sobras’ é feito o cálculo da média de votos de cada partido por vaga, de modo que foram contemplados os partidos que fizeram votação abaixo do quociente”.

Nas eleições seguintes, em 2022, houve um aumento significativo do número de votos válidos em Passo Fundo, variando de 99.520 para 117.440. “Mantido o mesmo número de votos válidos em 2024, podemos estimar 5.606 o número de votos do quociente eleitoral e em 4.200/4.300 o número de votos para se eleger as últimas vagas da Câmara de Vereadores ‘pela média’”, completa.

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