O mercado da erva-mate tem passado, nos últimos anos, por altos e baixos motivados por condições climáticas, diminuição de áreas de cultivo por diversos fatores, e, ainda, uma produção maior do que a demanda. Por outro lado, o produto tão tradicional para os gaúchos, além de outros estados brasileiros e países vizinhos, apresenta versatilidade de usos que precisam ser aprimorados. Entre eles, há, inclusive, pesquisas que estudam o uso na alimentação animal. Para se manter, ou iniciar um investimento, no setor é necessário um bom planejamento estratégico, análise de mercado e foco na qualidade do produto. Quem analisa o mercado é o engenheiro agrônomo da Emater Regional de Passo Fundo Ilvandro Barreto Mello.
O Nacional – O preço da erva-mate tem variado nos últimos anos. Quais são os principais fatores que têm influenciado?
Ilvandro Mello - O aumento ocorrido no ano de 2013/2014 no preço da erva-mate foi mais em função da estiagem ocorrida em 2011/2012 que causou uma redução significativa na produção, atingindo índices em ervais monitorados de até 30%; e, não devido à redução de área. O preço da arroba (15 kg folha verde) em janeiro de 2013 era cotado em R$ 11,00 passando em outubro do mesmo ano a R$ 28,40. Essa diferença alterou as relações de mercado e levou a volta de novos plantios motivados pelo preço elevado. Com o retorno da normalidade de chuva, o melhor manejo adotado pelo produtor influenciado pelo preço da arroba, a redução no intervalo da poda das erveiras e colheita de áreas anteriormente abandonadas em função do preço baixo, colocou grande oferta de folha no mercado; e, em consequência o preço atual retornou aos índices praticados lá no início de 2013.
ON - Por que alguns produtores rurais têm desistido da produção da erva-mate?
IL - Os produtores estabilizados na atividade ervateira, ao contrário, continuam mantendo a produção. Alguns até estão ampliando, visto possuírem boa produtividade de seus ervais, mercado consolidado, mão de obra disponível, baixo custo de produção e aptidão para a cultura da erva-mate. Os arranquios seguem para aqueles produtores que não possuem viabilidade no negócio, por erros estratégicos, baixas produtividades de seus ervais, dificuldades de acesso ao mercado, falta de mão de obra e, por vezes, não possuírem uma tradição ervateira consolidada. Os arranquios podem também ser motivados pela opção a outra matriz produtiva que melhor se adeque as condições individuais desses estabelecimentos rurais.
ON - Considerando o mercado e as diversas utilizações da erva-mate, não deveríamos ter um quadro de maior interesse?
IL - Analisando o cenário de produção da erva-mate nos últimos quinze anos, vemos que os números indicam que a produção aumentou 15,41%. A exportação cresceu 23,63%, a importação reduziu em 99,63% e o consumo interno aparente aumentou apenas 5,16%. Esses movimentos comerciais não demandaram erva-mate suficiente para suportar a oferta existente, por isso dos preços estarem nestes valores atuais.
Com relação às diversas utilizações da erva-mate existem perspectivas muito positivas em função das múltiplas aplicações do produto. Passando pela diversidade de produtos cosméticos, bebidas, higiênicos e alimentícios, inclusive, de características nutracêuticas. No entanto, para a produção desses novos produtos utiliza-se o extrato de erva-mate, que com pouca quantidade usada é capaz de produzir grandes quantidades de produtos industrializados.
O grande consumo de folha atualmente está diretamente ligado ao chimarrão e ao Tereré, porém, são produtos regionalizados e que para serem consumidos é necessário estarem embutidos no hábito, nos usos e costumes culturais da população. Há estudo em andamento do uso da erva-mate na ração animal, o que de fato poderia criar uma demanda significativa de folha, podendo inverter, portanto, a relação oferta/demanda de hoje.
ON - Para quem ainda investe na produção, quais as maiores dificuldades?
IL - A gestão adequada da cadeia produtiva é hoje um dos principais desafios do setor ervateiro, envolvendo as instituições representativas do setor que ligue todas as etapas da produção. Tendo isso, facilita o planejamento e as estratégias da atividade ervateira o que evitaria estes altos e baixos vividos pelo setor desde 1554, quando iniciou a história da erva-mate.
ON - E as oportunidades de mercado, quais são, como aproveitar?
IL - Ao que se refere ao produtor rural fazer os investimentos em erva-mate próximos a parques industriais instalados. Onde existe uma boa estrutura industrial a erva-mate é competitiva com outras atividades agrícolas em termos de rendimento econômico. Já em regiões desprovidas de indústrias os plantios não tendem a ter sucesso. Também é preciso observar a qualidade da erva-mate procurada pela indústria e pelo consumidor. Ervais nativos e com qualidade comprovada de produto sempre têm mercado garantido. Isso passa pela escolha genética das mudas e pelo manejo usado desde a implantação do erval.
Para a indústria a oportunidade de mercado está intimamente ligada ao entendimento do consumidor. É preciso compreender a necessidade e a preferência dos consumidores de cada região, pois ela muda de acordo com essas localidades. Ter uma estrutura para fabricação e logística de distribuição do produto bem organizada.
ON – E quais os maiores mercados atualmente?
IL - Para a erva-mate como um todo é válido analisar que o ponto de grande consumo no Brasil é o Rio Grande do Sul e em termos mundiais o Uruguai, a Síria e o Chile. Já os produtores são o Brasil, a Argentina e o Paraguai. Todos os produtores focam esses grandes mercados de consumo e isso deriva em uma grande competição mercadológica. A boa notícia, é que hoje a erva-mate está sendo consumida em quase todo o mundo em diferentes formas. Exportações expressivas do produto já superam a marca de 30 países. É um mercado com reação lenta, mas positiva pelo fato de ser de forma contínua.
ON - A Emater tem também um projeto que certifica a qualidade da erva-mate produzida. O os dados disponíveis revelam?
IL - A Emater-RS tem um programa de certificação de processo de produção de erva-mate, que analisa a forma que o produto está sendo produzido desde a lavoura até o beneficiamento final. Analisa o processo por qual passa a erva-mate em todas as etapas de produção. Verifica-se uma maior preocupação pela qualidade do produto, tanto por parte de alguns produtores, como de algumas indústrias. Isto é positivo. As melhorias não estão na velocidade que se espera, mas vêm acontecendo. É, de fato, também um requisito seletivo para a obtenção de mercado. Em breve, a erva-mate produzida com esses cuidados atendendo as boas práticas de produção agrícola e de fabricação permanecerão no tempo, a que não atender, deixará de existir. Seleção natural pelo próprio consumidor e pela legislação sanitária que protege o produto.