Os cuidados na pós-colheita de grãos são fundamentais para para garantir que a qualidade do produto se mantenha até o momento da venda. Neste final de safra de inverno, o preço do trigo, uma das culturas de maior expressão econômica neste período, está abaixo do esperado e especialistas recomendam aguardar um momento de entressafra para proceder a comercialização e, com isso, conseguir melhores preços. O governo federal está tentando, por meio de leilões realizados pela Conab, elevar os preços praticados, mas ainda assim, os valores estão abaixo do ideal. Com isso, quem puder, deve esperar para vender.
Assim como o manejo durante todo o ciclo produtivo é importante para garantir a qualidade do produto, os cuidados de pós-colheita são fundamentais para garantir que todo o esforço e investimentos na produção não tenham sido em vão. Os engenheiros agrônomos Dr. Nathan Levien Vanier e Dr. Moacir Cardoso Elias, professores da Faculdade de Agronomia “Eliseu Maciel”, da Universidade Federal de Pelotas, responsáveis pelo Laboratório de Pós-Colheita, Industrialização e Qualidade de Grãos, orientam os produtores quanto aos principais cuidados a serem tomados a partir de agora.
De acordo com eles, o armazenamento na propriedade rural, além do preço, permite reduzir custos com frete, que geralmente é mais caro na época da colheita, e ter um controle imediato do metabolismo dos grãos recém colhidos, uma vez que imediatamente são realizadas as operações de pré-limpeza e secagem. Quando o armazenamento ocorre fora da propriedade, em geral o produtor não tem interferência direta. Entretanto, conforme prevê a Lei Brasileira de Armazenagem, nesse caso haverá a responsabilidade técnica de um engenheiro agrônomo ou um engenheiro agrícola, especializado na área e devidamente registrado no CREA.
Grãos são organismos vivos
Os professores explicam que para se evitar perdas qualitativas e quantitativas durante o armazenamento é fundamental compreender que grãos são organismos armazenados vivos, que respiram e têm metabolismo ativo. Além disso, há presença de organismos associados que também respiram, produzem calor, água e gás carbônico, acabando por acelerar ainda mais o metabolismo dos grãos armazenados, como é o caso de fungos, ácaros e insetos. Se a umidade e a temperatura de armazenamento não forem adequadas, e se medidas de controle sanitário não forem corretamente tomadas, danos imediatos e latentes ocorrerão. Tais danos são irreversíveis e acumulativos. Dependendo da intensidade, podem reduzir o valor comercial do trigo.
Cuidados necessários
O primeiro cuidado destacado pelos pesquisadores é de que não é recomendável deixar grãos secarem na lavoura, mas sim depois de colhidos. Uma vez colhidos, úmidos, o trigo deve ser limpo e seco imediatamente. O período de espera para secagem deve ser o menor possível. Parâmetros de secagem devem seguir recomendações técnicas e parâmetros, como temperatura da massa de grãos, que não deve exceder 40°C, para que não prejudique a atividade de enzimas que exercem papel fundamental no processo de panificação, ao liberar açucares fermentáveis para que o pão cresça, por exemplo.
O carregamento de silos e armazéns graneleiros deve respeitar critérios técnicos, visando permitir boa porosidade na massa de grãos. Caso contrário, haverá dificuldade para arrefecer a massa durante o armazenamento, ao utilizar o sistema de aeração natural ou em resfriamento artificial, para quem dispõe desse recurso.
Cuidado com a temperatura
A orientação é para que a massa de grãos seja mantida em temperatura baixa, a fim de manter baixas as taxas respiratórias dos grãos e dos microrganismos. Abaixo de 16ºC os insetos são controlados sem necessidade do uso de inseticidas químicos. Em temperaturas mais baixas ocorrem menores perdas em quantidade e em qualidade. Medidas complementares incluem uso de exaustores para remoção de ar saturado dos silos. Igualmente importante são a higienização das unidades armazenadoras durante a entressafra e o controle de pragas de acordo com as recomendações técnicas do Receituário Agronômico, prescritas e supervisionadas por engenheiro agrônomo.
Principais problemas
Conforme os professores, no país há um déficit em capacidade estática de armazenamento. Atualmente, menos de 10% das unidades estão localizadas nas unidades de produção. Além disso, há falta de conhecimento por parte de alguns armazenistas que não seguem as recomendações técnicas para as operações de pré-armazenamento, armazenamento e conservação. Dentre os problemas mais comuns, estão a utilização de temperatura do ar de secagem acima da recomendada; armazenamento com umidade acima da recomendada; ocorrência de correntes convectivas na massa de grãos armazenados; presença de insetos e roedores; intensificação de defeitos metabólicos devido a erros no manejo tecnológico; e utilização inadequada do sistema de aeração ou de resfriamento.
Perdas na armazenagem
Algumas pesquisas estimam em pelo menos 10% as perdas no armazenamento. Tais perdas ocorrem pela própria respiração e pelo metabolismo dos grãos armazenados, bem como pela atividade de microrganismos e insetos, por exemplo. Os professores destacam que para ser considerado de boa qualidade e enquadrado como Tipo 1, o trigo, dentre outros fatores, precisa ter Ph mínimo de 78. Para isso, é necessário que os grãos tenham maturação completa na lavoura e que haja o menor consumo possível de suas reservas energéticas. Isto se consegue com manejo adequado de colheita, transporte, limpeza, secagem, armazenamento e operações de manutenção.
Outro problema comum é a intensificação de defeitos denominados metabólicos, que são aqueles que evoluem com o armazenamento, tais como grãos manchados, ardidos e mofados. Quanto maior for o teor de grãos com estes defeitos, menor será a qualidade do trigo. Para que haja controle da ocorrência destes defeitos, assim como no caso de perdas quantitativas, é necessário adotar manejo em todas as etapas da produção e estocagem.
Controle de pragas
Outro tipo de problema que pode ser enfrentado é a ocorrência de pragas nos silos. Os insetos Rhizoperta dominica e Tribolium castaneum são comumente encontrados em trigo armazenado, mas não são os únicos. Os professores explicam que o primeiro é capaz de atacar grãos íntegros enquanto o segundo se alimenta de grãos já danificados por outros insetos e/ou ação mecânica, e também se alimenta de farinhas. Muitos insetos já adquiriram resistência a alguns inseticidas, resultado do manejo inadequado utilizado por armazenistas para o controle de pragas.
Os tratamentos químicos mais utilizados são o expurgo, com fosfeto de alumínio ou fosfeto de magnésio, e o uso de inseticidas líquidos, com poder residual. Já os tratamentos físicos incluem o resfriamento artificial e o uso de terra de diatomáceas. O expurgo, onde é liberado o gás fosfina, é o único capaz de eliminar todas as fases de vida dos insetos (ovo, larva, pupa e inseto adulto). A fosfina extermina, entretanto não imuniza, ou seja, deve ser aplicada a cada reinfestação. Cuidados com hermeticidade do ambiente de expurgo e com o tempo de exposição são imprescindíveis para obter sucesso no controle de pragas e para evitar acidentes.
A terra de diatomáceas é um pó inerte à base de algas diatomáceas, rico em sílica, que causa a morte dos insetos por desidratação. Conforme os pesquisadores, é um método interessante e bastante utilizado. Além dos insetos, o controle dos roedores também não pode ser neglicenciado. Eles causam perdas ao consumir os grãos armazenados e transmitem doenças, causando riscos à saúde das pessoas que trabalham nas unidades armazenadoras, e muitas vezes até dos consumidores. Para controlá-los é necessário conhecer os hábitos de vida da espécie presente na unidade armazenadora e adotar estratégias de controle, que incluem uso de iscas e pó raticida, em armadilhas.
Curso
Com o objetivo de capacitar os profissionais que atuam na área de secagem, armazenamento e conservação de grãos, a Fundação Pró-Sementes de Apoio à Pesquisa, em parceria com o Laboratório de Pós-Colheita, Industrialização e Qualidade de Grãos da UFPel, estará promovendo em Passo Fundo, nos dias 15 e 16 de dezembro de 2016, o “Treinamento de Pós-Colheita de Grãos”. Informações porem ser obtidas no site www.fundacaoprosementes.com.br.