Na propriedade de Luciano André Seefeld, em Campo Novo/RS, são mais de 80 hectares ocupados com trigo. O cereal se encaixa num programa de rotação de culturas e, em 2016, chegou a render mais de 80 sc/ha. Dez anos atrás, porém, a média variava entre 25 e 35 sc/ha. A evolução de apenas uma década já é notável. Entretanto, o cereal vem evoluindo há muito mais tempo. A história do trigo se confunde com a própria história da humanidade. O trigo estava lá quando o homem começou a plantar e a criar animais. O cidadão do Neolítico já cultivava o trigo nos entornos de 7000 antes de Cristo, na região da Mesopotâmia, junto aos rios Eufrates e Tigre. Da Mesopotâmia, o trigo se espalhou pelo mundo. Hoje, faz parte da alimentação de mais de 7 bilhões de pessoas, do café da manhã ao jantar.
No Brasil, o trigo chegou em 1534, na capitania de São Vicente. O clima quente dificultou a expansão da cultura e foi no Rio Grande do Sul, na segunda metade do século XVIII, que o cereal começou a se desenvolver. A partir da década de 40, as plantações de trigo se expandiram para o Paraná, que se transformou no principal Estado produtor do Brasil. Pesquisas com sementes permitiram aumentar a área plantada e o rendimento da cultura. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 1977 colhia-se em média 11 sc/ha de trigo no Brasil. Em 2016 esse número passou para 53 sc/ha em média, um aumento de quase 400%. O desenvolvimento da cultura passou pelo melhoramento genético para chegar ao patamar que está hoje. Para o presidente do Conselho Deliberativo da Abitrigo (Associação Brasileira da Indústria do Trigo), Marcelo Vosnika, esse aumento na produtividade deve-se às melhorias na genética do trigo, aos trabalhos de fertilização, correção de solo e avanços nos tratamentos fitossanitários. “A pesquisa em genética é de grande relevância no progresso alcançado, nos ganhos de produtividade e qualidade industrial”. A opinião de Luciano, que viu de perto a produtividade da sua propriedade mais do que dobrar em menos de 10 anos, é a mesma. “Os rendimentos vêm aumentando devido ao melhoramento genético, manejo da cultura e aumento da fertilidade do solo”.
Evolução agronômica
Segundo Lorenzo Mattioni Viecili, engenheiro agrônomo e gerente comercial da Biotrigo Genética, o melhoramento genético proporcionou uma evolução significativa na estrutura das plantas. “Hoje são plantas com estatura mais baixa, com melhor porte, mais firme e com características de maior perfilhamento, objetivando uma melhor formação de componente de rendimento”. Essa evolução no tipo agronômico possibilita melhor resistência ao acamamento, o que garante mais segurança para o rendimento e qualidade do grão a ser colhido. A melhora das cultivares quanto a adaptação por região também é um avanço. “Temos as mesmas cultivares sendo semeadas no Rio Grande do Sul e em Goiás. Essas cultivares com ampla adaptação estão sujeitas a mais estabilidade produtiva independentemente da variação ambiental”. A pesquisa no trigo, também conseguiu resultados na parte fitossanitária, hoje tendo cultivares já em produção nas lavouras com ótimas resistências as principais doenças do trigo, como manchas foliares, giberela e a brusone. Com a pesquisa genética, conseguimos minimizar a pressão destas doenças e trazendo mais estabilidade produtiva.
Na opinião do Superintendente Técnico da Cooperativa Coamo, de Campo Mourão/PR, Aquiles Dias, praticamente todos os problemas agronômicos da cultura foram resolvidos por meio da pesquisa. “Temos potencial para concorrer com quase toda a triticultura internacional. Sem o esforço e o investimento em pesquisa genética não teríamos este avanço na cultura. Pena que o mercado ainda seja o maior entrave para o desenvolvimento do trigo”.
Desafios para o futuro
As frustrações com a cultura e a consequente diminuição na área plantada são os grandes desafios para a continuidade da cultura. Para Maurício Ghiraldelli, diretor da Correcta Alimentos, nos últimos anos, com a profissionalização da pesquisa, o produtor começou a trabalhar da "porteira para fora", visando produzir trigos que atendam o mandante da cadeia, ou seja, o consumidor final. “Acredito que a grande evolução da pesquisa foi equilibrar os interesses dos principais agentes: o produtor e a indústria. O produtor visa uma boa produtividade com baixa suscetibilidade às doenças, e a indústria visa ter um trigo homogêneo e de boa qualidade para atender aos seus clientes”. ?
Para Daniel Osório, diretor comercial do Moinho Dona Alda, de Bom Sucesso do Sul/PR, o trigo é um dos principais alimentos e continuará tendo sua grande relevância. Ele afirma que os avanços em produtividade são notórios e que o desafio hoje é homogeneizar a qualidade, com direcionamento em variedades, como trigo pão/melhorador. As novas cultivares presentes hoje no mercado já atendem a essa demanda.
De acordo com Lorenzo, a qualidade do trigo produzido no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, principalmente, sofreu uma evolução graças às ofertas de melhores materiais para o cultivo. “Hoje, podemos encontrar lotes de trigo produzidos com qualidade igual ou superior aos trigos importados que têm referência em qualidade de farinha. Essa evolução aconteceu porque a pesquisa está alinhada com a indústria moageira, ou seja, em trabalho conjunto lançamos cultivares com aptidões de qualidade que atendam às demandas industriais e dos consumidores”, finaliza Lorenzo.