O final do ano por si só é carregado de estresse e irritação. Talvez pelo cansaço das atividades do ano ou pela ansiedade pelas festas, é comum que as pessoas reclamem e se declarem com estresse. Mas para alguns, o problema vai além. É o estresse extremo, que na maioria das vezes está relacionado com o trabalho. Este tipo de distúrbio está sendo chamado de Burnout.
Traduzido como fogo descontrolado, é o estágio mais avançado do estresse, segundo a Isma-BR (International Stress Management Association). É quando a pessoa já está fora de controle. As características são exaustão, ceticismo, alienação e uma postura mais agressiva no trabalho, sensação de incompetência, além de baixa produtividade. Requer acompanhamento médico e, em alguns casos, uso de medicamento (em geral, os antidepressivos).
As frequentes pressões e demandas vividas pelos colaboradores na rotina diária geram um nível de estresse extremamente alto e constante que já afeta a grande maioria dos profissionais economicamente ativos no Brasil. De acordo com pesquisa realizada pela Isma-BR, 70% dos brasileiros sofrem as consequências do estresse.
Já o burnout, que diminui, em média, em cinco horas o desempenho profissional de um portador, atinge 30% da população brasileira economicamente ativa, causando um prejuízo estimado em 3,5% do PIB nacional anual, segundo a Isma-BR.
Como alternativas para minimizar a incidência do burnout por parte da empresa, a Isma-BR aponta a importância de oferecer segurança no trabalho, gratificar os funcionários, proporcionar apoio social e promover um ambiente sem favoritismos e politicagens. Por parte dos funcionários, é importante não ultrapassar os limites por períodos frequentes ou prolongados, diversificar as atividades quando não estiver trabalhando e lembrar que a qualidade de vida é uma missão pessoal e intransferível.
Para esclarecer ainda mais sobre o estresse extremo, o Medicina & Saúde conversou com a psiquiatra Gabriela Valério. Confira.
Medicina & Saúde – Como pode ser definido o burnout?
Gabriela Valério – É um estado de esgotamento físico e mental, cuja causa está intimamente ligada à vida profissional. Uma reação à tensão emocional crônica gerada a partir do contato direto, excessivo e estressante com o trabalho. Essa síndrome faz com que o interesse pelo trabalho da pessoa acometida seja prejudicado. Ela foi observada, originalmente, em profissões predominantemente relacionadas a um contato interpessoal mais exigente, tais como: médicos, psicanalistas, assistentes sociais, comerciários, professores, enfermeiros, atendentes públicos, bombeiros, dentre outras. Essa síndrome tem predileção por profissionais que mantém uma relação constante e direta com outras pessoas, principalmente quando esta atividade é considerada de ajuda (médicos, enfermeiros, professores).
M&S – É correto afirmar que as mulheres são as mais atingidas?
GV - Há uma preponderância nas mulheres, possivelmente devido à dupla jornada de trabalho que concilia a prática profissional e a tarefa familiar. Em relação ao estado civil, é mais comum nas pessoas sem parceiro estável. Pesquisas revelam que os primeiros anos de carreira profissional seriam os mais vulneráveis ao desenvolvimento da síndrome.
M&S – Qual a diferença entre o estresse e o burnout?
GV - Autores defendem a síndrome de burnout como sendo diferente do estresse genérico: essa síndrome envolve atitudes e condutas negativas com relação aos usuários, clientes, organização e trabalho, enquanto o estresse denotaria mais um esgotamento pessoal com interferência na vida pessoal do sujeito e não, necessariamente, na relação com o trabalho.
M&S – Quais os sintomas?
GV - Já foram descritos mais de 130 sintomas relacionados a essa síndrome. Eles podem ser divididos em: manifestações emocionais, físicas e comportamentais. Dentre as primeiras, está a tendência a avaliar o trabalho de forma negativa, sentimentos depressivos, sensação de vazio, esgotamento, fracasso, baixa autoestima, oscilações de humor e outras. Já dentre as manifestações físicas, pode haver fadiga crônica, dores de cabeça frequentes, problemas com o sono, hipertensão arterial, taquiarritmias, diminuição do peso corporal, dores musculares, dores de coluna, gastrite, úlcera gástrica e outras desordens digestivas, alergias e outros. As manifestações comportamentais envolvem o consumo aumentado de café, álcool, medicamentos e drogas ilícitas, baixo rendimento, absenteísmo, distanciamento afetivo, frequentes conflitos interpessoais no ambiente de trabalho e dentro da própria família.
M&S - E como enfrentar essa síndrome?
GV - Existem formas de prevenção e tratamento. A prevenção pode ser realizada pela instituição (empresa) e pelo trabalhador. Por parte da instituição, é possível criar ações para favorecer um bom clima corporativo e aliviar o estresse, propiciar condições adequadas ao desenvolvimento das atividades, investir em treinamento, respeitar o cumprimento das férias. A prevenção por parte do trabalhador pode ser realizada com o investimento na vida social, no lazer e atividade física, repensando o perfeccionismo no trabalho, organizando o cotidiano de trabalho, delegando funções a outras pessoas e pedindo ajuda para resolver problemas. Quando já instalada a síndrome, resta o tratamento, que envolve atividades de relaxamento, psicoterapia e, nos casos mais severos, o tratamento farmacológico para atenuar sintomas como ansiedade, fadiga, alterações do sono, dentre outras.
Colaborou
Gabriela Valério, psiquiatra