Entre as mulheres diagnosticadas com câncer de mama no Brasil, 45,3% descobrem a doença em estágio avançado. Apenas 10,9% ficam sabendo no início, quando a chance de cura é maior. Além disso, aquelas que se tratam pelo Sistema Único de Saúde (SUS) precisam esperar 188 dias, em média, entre o diagnóstico e a cirurgia, tempo que cai para 15 dias, se a paciente tiver plano de saúde, segundo dados do Fenama.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão auxiliar do Ministério da Saúde no desenvolvimento e coordenação das ações integradas para a prevenção e o controle do câncer no Brasil, recomenda a realização anual do exame clínico das mamas por um profissional de saúde a partir dos 40 anos.
Porém, nos últimos anos, está crescendo o número de casos entre mulheres jovens, ou seja, com menos de 40 anos. Uma das possíveis explicações é o estilo de vida moderno, que deixou a maternidade para mais tarde e incluiu alimentos com mais gordura na dieta das mulheres.
Para explicar sobre a incidência, diagnóstico e prevenção, o Medicina & Saúde conversou com o médico ginecologista e mastologista Leandro Pacheco. Confira.
Medicina & Saúde – O câncer de mama está afetando mais mulheres jovens?
Leandro Pacheco – Sim e isto tem chamado muito a atenção. Somente nos casos que eu atendi em 2010 foram 15 pacientes abaixo dos 40 anos. Isso não existia. A maior incidência ocorre entre os 50 e 60 anos, mas recentemente saiu um estudo que mostrou um aumento de quase 30% em pacientes jovens sem história familiar e sem fator de risco detectável. Operei pacientes de 31, 32, 33, 27 anos, pacientes que nunca se imagina que terão um câncer de mama e normalmente são tumores mais agressivos. Isso nos preocupa bastante.
M&S –Qual seria a explicação para este aumento?
LP - Conversando com outros profissionais da área e olhando a literatura, pode-se afirmar que tem relação com estilo de vida. O que está acontecendo? As mulheres estão engravidando cada vez mais tarde. Primeiro vem a faculdade, a pós-graduação, a especialização, o mestrado, só que com isso elas vão adiando a gravidez, vão descuidando da prática de atividade física e da alimentação. Minha opinião é de que tem muito a ver com a questão alimentar. Nossa dieta é rica em gordura, especialmente gordura saturada.
M&S – Qual a dica para tentar evitar este processo?
LP – Alimentação saudável e exercício físico para combater o fator ambiental e, se possível, engravidar mais cedo e amamentar. Não se pode afirmar categoricamente que amamentar reduz o risco de câncer de mama, porque alguns trabalhos mostram que sim outros não comprovam. De outro lado, o uso do anticoncepcional oral não aumenta risco, embora muito se fale a respeito. Até agora não foi provado que usar anticoncepcional oral por muito tempo aumente o risco. Mas outro fator que temos visto bastante é bebida alcoólica. A ingesta de bebida de maneira moderada a severa pela mulher aumenta risco para câncer de mama.
M&S – De maneira geral, quais são os fatores de risco para câncer de mama?
LP - Os mais comuns estão relacionados aos fatores ambientais e modo de vida: dieta rica em gordura, sedentarismo, estresse intenso e depressão profunda por perda de um ente querido, por exemplo, nunca ter engravidado, gravidez tardia (depois dos 30 anos), nunca ter amamentado, menopausa tardia (depois dos 55 anos), menarca precoce (em torno dos 11 anos). Por que? Porque tudo isso expõe a mulher a mais tempo de produção de hormônios. Também entra como fator de risco o uso de reposição hormonal conjugada por mais de cinco anos. O fator genético só aparece em torno de 15% dos casos. 70% dos casos de câncer de mama são ao acaso, não se encontra uma causa específica de por que a paciente teve câncer de mama
M&S – Como é feito o diagnóstico?
LP - Basicamente, o que se orienta é que se não tiver história familiar, a investigação deve ser feita anualmente a partir dos 40 anos. Ressaltando que no histórico familiar contam mãe, irmã e filha, familiares de primeiro grau. Familiares de segundo grau, como avó, tia, só se tiver mais de um na família ou que tenham tido precocemente, antes dos 50 anos de idade. Para quem não tem fator de risco se faz a primeira mamografia e ultrassom mamária com 35 anos de idade. Se não houver nada, passa, a partir dos 40 anos de idade, a fazer estes exames anualmente.
M&S – Autoexame, deve-se fazer?
LP - Para paciente de consultório, que vai ao seu ginecologista todos os anos, se o médico fizer o exame, a paciente não precisa fazer o autoexame. Existe um estudo canadense que mostra que o autoexame aumenta o número de exames, biopsias e cirurgias desnecessárias, porque as pacientes não sabem se apalpar adequadamente. Então, normalmente vão detectar alguma alteração e mais por uma questão de segurança do próprio médico, ele acaba pedindo uma biópsia. Mas num país como o Brasil, onde uma paciente pode demorar até seis meses para fazer uma mamografia, paciente que não vai ao consultório ou que não consulta regularmente, eu sugiro que faça seu autoexame mensal uma semana depois da menstruação, de preferência debaixo do chuveiro, com a mama molhada, usando um sabonete para facilitar. Existem mamógrafos suficientes para cobrir toda a população dentro da faixa etária necessária, que vai dos 40 aos 69 anos de idade, porém a maioria das pacientes não faz, ou porque esses mamógrafos são da rede privada e não fazem SUS ou pelo medo de fazer o exame, alegando dor durante o processo. Nestes casos, temos que ser um pouco mais radicais: o que dói mais, fazer o exame ou perder uma parte da mama?
M&S – Quando mais cedo o diagnóstico, melhor?
LP - Quanto mais precoce a lesão, mais fácil de ter cura, menos radicais são a cirurgia e o tratamento. Quanto mais precocemente se fizer o diagnóstico, melhor para a paciente, pois pode ter uma chance de até 97% de cura. Precoce são tumores de um centímetro para menos.
M&S – Como é feito o acompanhamento médico depois de um tratamento para câncer?
LP - A paciente tratada de câncer de mama tem que consultar com mastologista ou oncologista nos primeiros três anos de quatro em quatro meses. Do terceiro ao quinto ano, de seis em seis meses e dali em diante, anual, sempre fazendo exame físico, de imagem, fazendo exames de laboratório, ou seja, acompanhando. É importante que a paciente tratada de câncer de mama não aumente de peso. Os trabalhos mostram que o aumento de peso após o tratamento aumenta a chance de ter uma recidiva em até 30%.
M&S – É correto afirmar que se o câncer não voltar no prazo de cinco anos, a paciente está curada?
LP - O período de cinco anos é considerado como o prazo limite, mas no câncer de mama é um pouco diferente. Qualquer outro câncer, a chance de recidiva a partir do quinto ano diminui praticamente a zero. No câncer de mama é diferente, porque existem duas mamas. O que se sugere sempre é o maior cuidado no início, pois no câncer mama a maior chance de voltar a doença é no início. Não da para afirmar que está curada com cinco anos, tem que acompanhar anualmente para o resto da vida, porque fica com predisposição. Uma vez tendo passado pela doença, a paciente tem três vezes mais chance de ter câncer de mama do que aquela paciente que nunca teve. Não dá para relaxar no acompanhamento.
Colaborou
Leandro Pacheco, médico ginecologista e mastologista