Rossana Stella Oliva Braghini - Psicanalista
O que fazer com aquele sentimento de perda e nostalgia que invade a alma, que nos traz a certeza que se tivéssemos vivido em outro tempo teria sido mais fácil a nossa existência? Que teríamos sido mais felizes e realizados? Que a pressa não atropelaria nosso tempo subjetivo e mentes criativas e gentis nos rodeariam, acompanhadas de champanhe, delicadeza e bom gosto? Que tempo mítico é esse que habita em cada um de nós? Essa é uma das questões fundamentais levantadas por Woody Allen em "Meia Noite em Paris", cuja fotografia e música nos envolvem, desde o início, num clima de nostalgia ímpar. Quero assinalar que a resposta que Allen indica para a questão é bem ao gosto psicanalítico. E, aliás, não é uma resposta, é uma interpretação que usa quem quer, como puder.
E falando em interpretação, o diretor surpreende pela simplicidade e lucidez com que marca um contraste genial de dois personagens, melhor dizendo, entre duas posturas de vida que eles carregam. Um é o exemplo típico do acúmulo de conhecimento verborrágico, estéril e inútil, que está na boca do Pedante. O outro, nosso herói, ao sofrer de uma insatisfação aguda em sua vida, ousa se perder nas ruas de Paris para viver um outro tempo (psíquico?), em que vai se apropriando de um saber sobre si que lhe permite começar a levar a vida muito mais perto daquilo que efetivamente o realiza, sem precisar de uma outra época para viver mais plenamente.
É muito lindo o caminho do nosso mocinho, posto que é muito semelhante ao trabalho analítico, quando o analisante ousa se perder pelos caminhos de sua mente para, se tudo correr bem , sua aposta abrir-lhe novas possibilidades.
Um outro ponto tocante é relativo ao amor. As diferenças existem e podem ser motivo de ampliação de visão de mundo de cada um ou não. Um gosta de Beatles e outro de Elvis, tudo bem. Mas mais importante do que as preferências individuais, é ter alguém que consiga testemunhar, reconhecer e respeitar o que para nós é importante.