Final de Ano...

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Rossana Stella Oliva Braghini- Psicanalista
Todo fim de ano é a mesma coisa. As pessoas se queixam do cansaço e justificam automaticamente “pela correria do final do ano”. E todos que escutam esta justificativa se identificam com ela e assentem imediatamente com a cabeça.  Que correria? Acaso não passamos o ano inteiro correndo? Então não deve ser isto, mas certamente o significante “final de ano” sim. Eu ousaria uma hipótese para o pouco que nos concerne coletivamente, já que cada história é sempre única. É o marco simbólico de cada ano terminando que cria o cansaço e não o contrário. Digamos que o mês de dezembro representasse para nós 1/3 do ano, mesmo assim não estaríamos tão “cansados”, ou se preferirem... “estressados” (*). Por isso vou arriscar meu palpite: acho que no mais das vezes trata-se mesmo de uma tristeza que é capturada pelo corpo, lida como cansaço.
Tristeza por quê? Elencarei três razões que me ocorrem. A primeira é porque mais um ano se passou e em cada um de nós ficaram pendências. Pendências conosco mesmo. Falo daquele sonho engavetado, das exigências que pensamos ter atirado pela janela e que retornaram... e finalmente uma das mais insidiosas: aqueles “mal-estarezinhos”, que julgamos inócuos e por isso mesmo provisoriamente (nos últimos 10 anos), colocamos delicadamente “em outro lugar”, mas que não passa dia sequer sem que nos torturem. Não demos o devido tempo para nos levar a sério... talvez por isso mesmo é que precise haver tanta correria...
A segunda é que mais um ano se passou e de fato não estamos ficando mais jovens, ou seja, o tempo está passando e, mesmo como uma lembrança indesejada, a idéia de que somos finitos bate à nossa porta. Portanto é melhor aproveitarmos bem, para quem sabe o que significa isso.
A terceira razão das tristezas de final de ano: me lembro do meu natal, aos seis ou sete anos de idade em Erechim (terra da minha mãe na casa da minha avó). Pinheiro natural imenso que batia no teto, as bolinhas vermelhas (simples para os parâmetros de hoje), o algodão nos galhos, presença do Papai Noel e meu primeiro triciclo vermelho que eu nem esperava, dentro dos pneus borracha branca assim como nas terminações do guidão de ferro. Enfim, uma Ferrari Testarossa, se eu fosse um adulto. E claro, para terminar, uma febre de 39 graus, para dar suporte a tanta emoção não suficientemente metabolizada. Já aos 11 anos notava um clima um pouco mais denso. Sempre tinha fulana que não se dava com sicrana ou que achava que não tinha reconhecimento familiar merecido e o climão se fazia... Continuava bom, mas já não mais “tão bom”. Eu já sentia saudades dos meus 7 anos... Concluo com isto que o real da vida não deve ter mudado tanto assim, já que os parentes sempre foram os mesmos, mas a minha percepção sobre a vida sim.
Então, diante das tristezas e cansaços do final do ano, seja porque engavetamos nossos sonhos, não prestamos atenção aos sinais de incomodo ou não podemos voltar a ter sete anos, talvez uma ideia seja interessante: entre a impotência do “acho que não consigo fazer nada” e a negação do “está tudo bem”, que costuma aparecer como uma idealização quase delirante nas festas natalinas e de ano novo, em “que todos devem se divertir”, quem sabe criar, neste fim de ano, algo que nos traga uma alegria genuína e, se não conseguirmos pensar em nada, talvez seja hora de buscar ajuda...
(*) Não resisto a um comentário: que desgraça maltratar uma palavra assim: utilizá-la para significar tudo e dizer nada sobre o sujeito

Por Rossana Stella Oliva Braghini- Psicanalista


Todo fim de ano é a mesma coisa. As pessoas se queixam do cansaço e justificam automaticamente “pela correria do final do ano”. E todos que escutam esta justificativa se identificam com ela e assentem imediatamente com a cabeça.  Que correria? Acaso não passamos o ano inteiro correndo? Então não deve ser isto, mas certamente o significante “final de ano” sim. Eu ousaria uma hipótese para o pouco que nos concerne coletivamente, já que cada história é sempre única. É o marco simbólico de cada ano terminando que cria o cansaço e não o contrário. Digamos que o mês de dezembro representasse para nós 1/3 do ano, mesmo assim não estaríamos tão “cansados”, ou se preferirem... “estressados” (*). Por isso vou arriscar meu palpite: acho que no mais das vezes trata-se mesmo de uma tristeza que é capturada pelo corpo, lida como cansaço.

Tristeza por quê? Elencarei três razões que me ocorrem. A primeira é porque mais um ano se passou e em cada um de nós ficaram pendências. Pendências conosco mesmo. Falo daquele sonho engavetado, das exigências que pensamos ter atirado pela janela e que retornaram... e finalmente uma das mais insidiosas: aqueles “mal-estarezinhos”, que julgamos inócuos e por isso mesmo provisoriamente (nos últimos 10 anos), colocamos delicadamente “em outro lugar”, mas que não passa dia sequer sem que nos torturem. Não demos o devido tempo para nos levar a sério... talvez por isso mesmo é que precise haver tanta correria...A segunda é que mais um ano se passou e de fato não estamos ficando mais jovens, ou seja, o tempo está passando e, mesmo como uma lembrança indesejada, a idéia de que somos finitos bate à nossa porta. Portanto é melhor aproveitarmos bem, para quem sabe o que significa isso.

A terceira razão das tristezas de final de ano: me lembro do meu natal, aos seis ou sete anos de idade em Erechim (terra da minha mãe na casa da minha avó). Pinheiro natural imenso que batia no teto, as bolinhas vermelhas (simples para os parâmetros de hoje), o algodão nos galhos, presença do Papai Noel e meu primeiro triciclo vermelho que eu nem esperava, dentro dos pneus borracha branca assim como nas terminações do guidão de ferro. Enfim, uma Ferrari Testarossa, se eu fosse um adulto. E claro, para terminar, uma febre de 39 graus, para dar suporte a tanta emoção não suficientemente metabolizada. Já aos 11 anos notava um clima um pouco mais denso. Sempre tinha fulana que não se dava com sicrana ou que achava que não tinha reconhecimento familiar merecido e o climão se fazia... Continuava bom, mas já não mais “tão bom”. Eu já sentia saudades dos meus 7 anos... Concluo com isto que o real da vida não deve ter mudado tanto assim, já que os parentes sempre foram os mesmos, mas a minha percepção sobre a vida sim.

Então, diante das tristezas e cansaços do final do ano, seja porque engavetamos nossos sonhos, não prestamos atenção aos sinais de incomodo ou não podemos voltar a ter sete anos, talvez uma ideia seja interessante: entre a impotência do “acho que não consigo fazer nada” e a negação do “está tudo bem”, que costuma aparecer como uma idealização quase delirante nas festas natalinas e de ano novo, em “que todos devem se divertir”, quem sabe criar, neste fim de ano, algo que nos traga uma alegria genuína e, se não conseguirmos pensar em nada, talvez seja hora de buscar ajuda...


(*) Não resisto a um comentário: que desgraça maltratar uma palavra assim: utilizá-la para significar tudo e dizer nada sobre o sujeito

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