A Neurose Obsessiva na Sociedade Atual

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Por Rossana Braghini - psicanalista

 

1 OBSESSIVO: modelo de subjetivação do século XIX
Imaginem o pequeno de seis anos de idade: cabelos cuidadosamente repartidos na lateral, bermudas, camisa e sapatos imaculadamente limpos; tema feito, lição de casa na ponta da língua e material escolar em ordem. Resumo: o querido da mamãe, professora, vovó e demais familiares. Quando se torna adulto, seja que profissão exerça, vai ter jeito de funcionário público bom mocista, que todos gostam e admiram. Este futuro pai de família foi, até meados do século passado, o ideal de subjetivação masculina. Era comum ser assim. Por isso, somente quando os conflitos passavam aos sintomas muito sérios, eram notados como tais. O que era gritante na época, o escândalo, vinha das histéricas que desafiavam o saber médico com seus sintomas corporais sem nenhuma causa orgânica, para melhor denunciar a surdez social em relação ao sexual. O que não podia ser dito, aparecia no corpo.
2. HISTERIA E PERVERSÃO: ideal de subjetivação da atualidade
Atualmente esta condição se inverte: as histéricas já não causam escândalo. Estão na crista da onda. No entanto, os obsessivos, sejam mulheres ou homens, neste cenário performático sentem-se um pouco fora de seu tempo, com sua delicadeza de sentimentos junto a suas maniazinhas e rituais de organização. É o bom mocismo fora de moda. As inibições ou restrições auto-impostas no tocante à vida sexual e social causam sofrimento e vergonha, principalmente se comparado à performance das histéricas e dos perversos que parecem ser o paradigma de subjetivação da atualidade.
3. O Obsessivo e a FALTA ESTRUTURAL
Filho predileto de sua mãe, não crê que seu pai foi tão prestigiado quanto gostaria. Logo, nos avatares de tornar-se sujeito, não atravessou todo o percurso como poderia. Como consequência, a falta estrutural que todos nós temos, gera-lhe uma constante angustia. Como forma de aplacar esta angústia, ele tenta ser perfeito o tempo inteiro. E, para o obsessivo, ser perfeito é não deixar nunca nenhum furo, preencher todos os espaços e resolver todos os problemas (os seus e o dos outros).
4.O Obsessivo no AMOR
No amor ele não é diferente. Tenta aplacar ao máximo o desejo de sua amada, para que nada lhe falte. Nas formas mais contundentes da neurose, tentará controlar o ser amado até o ponto de imobilizá-lo, engessá-lo, de forma que não o surpreenda com alguma demanda que ele não possa imediatamente satisfazer.
5. As CONEXÕES perdidas
O marco do obsessivo são as conexões perdidas entre o sujeito do inconsciente e o eu da razão. A “muralha” entre um e outro é tão espessa que tornou o diálogo impossível. E quando o diálogo é impossível sobrevém o sintoma. O sintoma para o obsessivo nada mais é que mandatos que ele deve obedecer. Que mandatos? Continuar sendo o bom menino e executar as ordens dadas, esquecendo todo o resto, e sobretudo, o seu desejo. O trabalho psicanalítico, quando bem sucedido, busca reconectar as conexões perdidas, reatando o diálogo entre o sujeito do inconsciente e o eu racional.
* Publicado na Revista Viver Saúde

 

1 OBSESSIVO: modelo de subjetivação do século XIXImaginem o pequeno de seis anos de idade: cabelos cuidadosamente repartidos na lateral, bermudas, camisa e sapatos imaculadamente limpos; tema feito, lição de casa na ponta da língua e material escolar em ordem. Resumo: o querido da mamãe, professora, vovó e demais familiares. Quando se torna adulto, seja que profissão exerça, vai ter jeito de funcionário público bom mocista, que todos gostam e admiram. Este futuro pai de família foi, até meados do século passado, o ideal de subjetivação masculina. Era comum ser assim. Por isso, somente quando os conflitos passavam aos sintomas muito sérios, eram notados como tais. O que era gritante na época, o escândalo, vinha das histéricas que desafiavam o saber médico com seus sintomas corporais sem nenhuma causa orgânica, para melhor denunciar a surdez social em relação ao sexual. O que não podia ser dito, aparecia no corpo.

2. HISTERIA E PERVERSÃO: ideal de subjetivação da atualidadeAtualmente esta condição se inverte: as histéricas já não causam escândalo. Estão na crista da onda. No entanto, os obsessivos, sejam mulheres ou homens, neste cenário performático sentem-se um pouco fora de seu tempo, com sua delicadeza de sentimentos junto a suas maniazinhas e rituais de organização. É o bom mocismo fora de moda. As inibições ou restrições auto-impostas no tocante à vida sexual e social causam sofrimento e vergonha, principalmente se comparado à performance das histéricas e dos perversos que parecem ser o paradigma de subjetivação da atualidade.

3. O Obsessivo e a FALTA ESTRUTURALFilho predileto de sua mãe, não crê que seu pai foi tão prestigiado quanto gostaria. Logo, nos avatares de tornar-se sujeito, não atravessou todo o percurso como poderia. Como consequência, a falta estrutural que todos nós temos, gera-lhe uma constante angustia. Como forma de aplacar esta angústia, ele tenta ser perfeito o tempo inteiro. E, para o obsessivo, ser perfeito é não deixar nunca nenhum furo, preencher todos os espaços e resolver todos os problemas (os seus e o dos outros).

4.O Obsessivo no AMORNo amor ele não é diferente. Tenta aplacar ao máximo o desejo de sua amada, para que nada lhe falte. Nas formas mais contundentes da neurose, tentará controlar o ser amado até o ponto de imobilizá-lo, engessá-lo, de forma que não o surpreenda com alguma demanda que ele não possa imediatamente satisfazer.

5. As CONEXÕES perdidasO marco do obsessivo são as conexões perdidas entre o sujeito do inconsciente e o eu da razão. A “muralha” entre um e outro é tão espessa que tornou o diálogo impossível. E quando o diálogo é impossível sobrevém o sintoma. O sintoma para o obsessivo nada mais é que mandatos que ele deve obedecer. Que mandatos? Continuar sendo o bom menino e executar as ordens dadas, esquecendo todo o resto, e sobretudo, o seu desejo. O trabalho psicanalítico, quando bem sucedido, busca reconectar as conexões perdidas, reatando o diálogo entre o sujeito do inconsciente e o eu racional.

* Publicado na Revista Viver Saúde

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