Rossana Stella Oliva Braghini- Psicanalista
A queda da Lei do Pai no século 21 trouxe um novo cenário para a vida amorosa, profissional e de relações. Falo da busca do Pai amparador, papel que foi dividido em outras épocas entre a Igreja e o Estado. Um exemplo: até o final da década de sessenta a escolha entre ser engenheiro, médico ou advogado autônomo podia andar pareada com a alternativa de um trabalho na esfera pública, como ser funcionário do Banco do Brasil.
Esta eleição se dava mais pelas características subjetivas de cada sujeito, já que a lógica de mercado absorvia relativamente bem as duas posições. Hoje, para a grande maioria dos profissionais que saem da faculdade em busca de trabalho, o sonho do emprego público se transformou quase em sinônimo de sobrevivência digna em termos financeiros, com um “estresse” aceitável. Os que se arriscam a ser profissionais liberais reclamam do ônus, equivalido a uma angústia intolerável frente ao dia de amanhã. É bem verdade que temos uma contrapartida no emprego público, uma vez que os que trabalham nele muitas vezes reclamam da rotina e da falta de possibilidade de exercer mais sua criatividade, mas isto porque esta escolha, como já disse antes, não foi baseada em características subjetivas do sujeito; no mais das vezes, esta opção esteve ancorada no medo. O que aconteceu foi que a queda da Lei do Pai, somado ao advento de uma política neoliberal, gerou no ser humano uma sensação de desamparo ímpar. Se amparado demais entorpece a capacidade criativa, o desamparo desenfreado cria rotas de busca de acolhimento por vezes equivocadas. Este é o caso de muitas afiliações em “igrejas”, em qualquer igreja, e que bem pode ser a igreja científica, desde que ela nos forneça uma ilusão de segurança. Uma sensação que não estamos sós, de que algo nos protege, nos rege (nos limita também) para além de nós mesmos. Grosso modo é o que em psicanálise chamamos da Lei do Pai.