Por Luciana Oltramari Cezar
Muitos pais encontram-se hoje confusos e inseguros quanto à criação dos filhos. Se reprimem seguindo os métodos antigos ou liberam, baseados no “é proibido proibir” e na fantasia de que frustrar vai fazê-los sofrer demais ou que traumatiza. Teorias, teses, experiências apontam em muitas direções, muitas vezes opostas, o que confunde muito mais do que ajuda. As perguntas que surgem são: Como educar? Qual é o caminho certo? Qual a melhor atitude? A verdade é que não há respostas exatas, nem receitas. Mas há bastante para ser pensado e que pode ajudar muito.
O limite é necessário, pois é estruturante da personalidade, caso contrário , a criança sente-se perdida e desamparada, acreditando tudo poder, o que a deixa angustiada e com medos. É tarefa dos pais orientarem os filhos quanto ao que podem ou não fazer, com atitudes firmes e eficazes. Aos poucos a criança vai internalizando e construindo suas próprias normas de conduta. Não sou partidária de é somente com amor que se ajuda filho a crescer, ou que somente conversar e explicar que funciona, tampouco defendo o uso de violência. Mas um nível de intolerância e indignação tem que estar presente para que os pais dêem um basta e muitas vezes são necessárias ações específicas, onde o discurso não pode estar dissociado do ato.
A criança se torna “abusada” no sentido de manejar com o sentimento de culpa dos pais para se favorecer e conseguir vantagens. Quando uma criança faz manha e a mãe não sente raiva, nem se incomoda, o que fica registrado é que pode então fazer como quer.
Quando falamos de pais, falamos muito mais em função materna e função paterna do que propriamente dos pais reais. O que se leva em consideração é o modo como o pai atua como sujeito da lei, da autoridade e que lugar a mãe dá à palavra do pai. Então a inclusão do pai não é um problema físico. A lei pode ser exercida pela própria mãe quando põe os limites necessários.
Acontece que muitos pais hoje têm medo de enfrentar os filhos e a dificuldade de colocar limites também está muito relacionada com o fato de não tolerarem as reações de ira e de raiva da criança, bem como as suas próprias. Essas reações são sentidas muitas vezes como desamor, como se a raiva sentida invalidasse o amor que existe. Como se amor e ódio não estivessem juntos, presentes sempre na relação. Assim talvez sintam-se os pais, quando dizem não, quando frustram a criança, como se o “não pode”, às vezes tão necessário, fosse sentido muito mais como uma atitude empobrecedora do que estar proporcionando crescimento. Sentem-se culpados de frustrar e também não querem passar trabalho. Porque criar filhos dá muito trabalho, porém também dá muitas alegrias. O limite é na verdade o de não deixar a criança fazer qualquer coisa com o outro, onde começa o espaço do outro e que deve ser respeitado, como um “eu não vou deixar tu fazeres isso comigo”. Experiências de amor e ódio que enriquecem a relação, em que o ódio é sentido porque alguém se importa e não deixa o filho fazer qualquer coisa e onde há um aspecto amoroso de base.
Os pais revivem sua própria infância e não gostariam de frustrar como não queriam ter sido frustrados. Freud dizia que “se prestarmos atenção à atitude de pais afetuosos para com os filhos, temos de reconhecer que ela é uma revivescência e reprodução de seu próprio narcisismo, que de há muito abandonaram”. Tudo aquilo que foram forçados a abrir mão muitas vezes se tenta compensar com os filhos. “A criança terá mais divertimentos que seus pais; ela não ficará sujeita às necessidades que eles reconheceram como supremas da vida. A doença, a morte, a renúncia ao prazer, restrições à sua vontade própria não a atingirão; as leis da natureza e da sociedade serão ab-rogadas em seu favor; ela será mais uma vez realmente o centro e o âmago da criação – ‘Sua Majestade o Bebê’, como outrora nós mesmos nos imaginávamos.”
Por limites, não permitir que façam algo danoso a si ou aos outros é fazer sofrer? O que é sofrer? É ter limites? É não poder ter e fazer tudo o que quer? Obviamente que lidar com a perda é doloroso, porém necessário, é da vida.
Atrás de uma criança impulsiva, que se impõe pela força e pelo grito muitas vezes se esconde uma pessoa insegura e medrosa. É uma defesa, uma couraça que esconde uma indefesa. Ela corre riscos futuros se segue assim.
Qualquer criança para se desenvolver precisa saber da diferença geracional, precisa saber que alguém manda nela. E precisa saber o seu lugar, onde certos lugares estão limitados para os adultos. Criança precisa ser tratada como criança e a infância é um tempo precioso e preciso....Porém há que achar vias de ajudar a construir possibilidades e capacidades de transformar impulsos e a energia que as crianças têm em ações criativas, lúdicas, simbolizando. Para isso tem que ter um adulto com disponibilidade afetiva que represente as ações da criança ou que proporcione vias para que ela faça. Os contos infantis, os brinquedos, que não precisam ser em demasia, podem ser bons recursos ao alcance dos pais.
Luciana Oltramari Cezar é psicanalista do projeto Associação Científica de Psicanálise