Cooperação científica traz avanços para tratar leucemia

Medicina & Saúde - O Consórcio Internacional da leucemia promielocítica aguda (LPA) conseguiu reduzir em quase 50% a mortalidade precoce em pacientes com a doença em países em desenvolvimento, em comparação com as nações desenvolvidas.

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Estudo de consórcio internacional de cientistas mostra que, por meio do networking e da educação médica, é possível obter resultados promissores e, sobretudo, semelhantes, no âmbito do resultado terapêutico e da qualidade dos cuidados empreendidos em casos da onco-hematologia. O Consórcio Internacional da leucemia promielocítica aguda (LPA) conseguiu reduzir em quase 50% a mortalidade precoce em pacientes com a doença em países em desenvolvimento, em comparação com as nações desenvolvidas. O estudo é coordenado no Brasil pelo médico hematologista Eduardo Rego, do Centro de Terapia Celular do Hemocentro de Ribeirão Preto (CTC-HRP), ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP.

A LPA, doença-alvo da pesquisa, apresenta elevado índice de mortalidade precoce, mas tem bom prognóstico se detectada e tratada em fase inicial. Rego explica que o estudo também obteve uma melhoria operacional nos controles de casos, resultando em sobrevida e sobrevida livre da doença semelhante aos relatados em países desenvolvidos.

Outras seis instituições brasileiras de referência participam do Consórcio: Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, Fundação Hemope (Pernambuco); Universidades Federais de São Paulo (Unifesp), do Paraná (UFPR), Minas Gerais (UFMG) e Rio Grande do Sul (UFRGS). Completam a lista México, Chile e Uruguai, além de instituições dos Estados Unidos e Europa.

No período de junho de 2006 a setembro de 2010 foram acompanhados um total de 183 pacientes, sendo 122 do Brasil, 30 do México, 23 do Chile e oito do Uruguai. Em novembro de 2011, o prontuário foi atualizado. Destes, 153 (85%) atingiram remissão completa; 27 (15%) morreram até o 30º dia de tratamento (precoce), entre o diagnóstico e a primeira avaliação morfológica da medula óssea; sendo 9 casos com óbito na primeira semana. As causas principais das mortes foram hemorragia (48,1%), infecção (25,9%) e síndromes diferenciadas (18,5%).

“Uma das características dessa doença é a elevada mortalidade nos primeiros dias após o diagnóstico. Pesquisa realizada em 10 centros brasileiros, antes da formação do consórcio, observou que tal mortalidade girava acima de 30%. Com a experiência e a estratégia adotada pelo Consórcio essa taxa caiu pela metade. Verificamos ser possível chegar a uma taxa de sobrevida de 80%”, afirma Rego.

 

Terapia

Outro aspecto apontado pelos pesquisadores no resultado é o fato de a maioria das mortes durante a indução serem causadas por hemorragia, portanto é a coagulopatia associada à LPA que deve ser apontada como efeito tardio em programas de educação médica, pois pode ser combatida com a administração precoce do ácido all-trans-retinóico (ATRA) e quimioterapia, que utiliza uma classe de drogas denominada “antracíclicos”.

Existem diversos tipos dessa substância, entretanto o mais utilizado no exterior é a idarurrubicina, de elevado custo. O estudo mostrou que outra droga da mesma classe – a daunorrubicina, de menor custo e mais facilmente encontrada no mercado brasileiro – pode alcançar os mesmos resultados. “Foi uma demonstração muito clara em nossa pesquisa. Estabelecemos parâmetros entre os dois medicamentos”, aponta Rego. O especialista explica que os pacientes do consórcio usaram daunorrubicina e os resultados em termos de remissão completa foram extremamente semelhantes ao uso de idarrubicina, aplicada, por exemplo, no protocolo espanhol, Programa para el Estudio de la Terapéutica en Hemopatía Maligna (PETHEMA).

Como a leucemia promielocitica aguda está sempre associada a alguma lesão cromossômica específica que envolva os cromossomos 15 e 17, é possível detectar um gene anômalo, formado exatamente pela fusão destes dois pontos de quebra na célula da leucemia. Com isso, é possível monitorar o tamanho da massa tumoral, utilizando-se métodos, por exemplo, de reação em cadeia de polimerase (PCR), tanto qualitativo quanto quantitativo.

“A partir deste método, conseguimos mostrar que o melhor momento para avaliarmos a resposta ao tratamento é após a segunda fase da quimioterapia (fase de consolidação – sendo a primeira a fase de indução e, a terceira, a de manutenção). Observamos que os resultados positivos após a fase de indução não previam a recaída do paciente, ao passo que resultados positivos após a fase de consolidação mostravam isso. Além disso, demonstramos, em alguns poucos casos de má evolução, a possibilidade de detectar a alteração molecular antes da recaída clínica. Com isso, conseguimos instituir o tratamento antes mesmo de o paciente ter uma franca recaída da doença”, expõe Rego.

O estudo Improving acute promyelocytic leukemia (APL) outcome in developing countries through networking, results of the International Consortium on APL foi publicado na revista Blood, periódico científico de referência mundial na especialidade da Sociedade Americana de Hematologia (ASH, na sigla em inglês). Segundo Rego, que também é membro da diretoria da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH), o Consórcio Internacional da LPA foi criado com o objetivo de estabelecer uma rede entre países em desenvolvimento que pudessem trocar experiências e dados de seus pacientes, e receber apoio de grupos de referência da Europa e Estados Unidos. O fomento do estudo foi exclusivamente de iniciativa pública. No Brasil, o financiamento foi provido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

 

(Fonte: Agência USP de Notícias)

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