O termo “autismo” foi empregado pela primeira vez por Bleuler (psiquiatra suíço), em 1911, para designar a perda de contato com a realidade, do que decorria grande dificuldade ou impossibilidade de comunicação. Em 1943, há 70 anos, um médico austríaco radicado nos Estados Unidos chamado Leo Kanner (psiquiatra infantil) descreveu 11 crianças que apresentavam comportamento peculiar (“um isolamento extremo desde o início da vida e um desejo obsessivo pela preservação da mesmice”), na sua obra intitulada “Autistic disturbances of affective contact”. Foi Kanner também que em 1949 cunhou o termo “mãe-geladeira”, referindo-se às mães de crianças autistas, termo este de há muito já excluído por não haver qualquer relação entre o comportamento materno como causa do autismo. Desde então, o autismo é estudado e pesquisado no mundo inteiro pela comunidade científica, sendo que atualmente é preferido o termo Transtornos do Espectro Autista (TEA), que engloba o autismo infantil, a síndrome de Asperger, a síndrome de Rett, o transtorno desintegrativo da infância e os transtornos invasivos da infância sem outra especificação. O autismo, hoje, é conceituado da seguinte forma: é um distúrbio de desenvolvimento complexo (uma disfunção encefálica orgânica) que é definido de um ponto de vista comportamental, com etiologias múltiplas e graus variados de gravidade. Portanto,hoje se sabe que há uma base biológica, estrutural, no encéfalo dos portadores de autismo, as quais não estão completamente definidas, cujas consequências são comportamentais.
Entre as etiologias (causas) temos: casos idiopáticos, ou seja, casos em que apesar de investigação exaustiva não se consegue demonstrar a etiologia (há evidências, nestes casos de que é uma condição decorrente da ação de múltiplos genes, mas ainda desconhecidos), e casos secundários, a várias condições (são alguns exemplos: esclerose tuberosa, síndrome do x-frágil, fenilcetonúria...).
Os TEA acometem principalmente meninos (exceto a síndrome de Rett, que acomete somente meninas), na proporção de mais ou menos 3:1, e o início sintomatológico é bastante precoce, conforme observações dos pais das crianças acometidas, permitindo também a possibilidade de um diagnóstico precoce por profissionais experientes, já por volta desta idade. Porém, a quantidade e a intensidade dos sintomas são variáveis de paciente a paciente, implicando em graus variados de autismo/TEA. Algum grau de deficiência mental é encontrado em cerca de 70 a 80% dos autistas, e mesmo aqueles com inteligência preservada terão dificuldades de utilizá-la no seu dia a dia, seja para regular a interação social ou para comunicar-se adequadamente.
Há critérios bem definidos para o diagnóstico, sendo que há prejuízos significativos nas áreas da interação social e da comunicação (linguagem verbal e não verbal), bem como o fato de que o indivíduo autista pode apresentar alguns comportamentos repetitivos e estereotipados. Exames complementares, como exames de imagens (tomografia computadorizada, ressonância magnética), eletroencefalogramas, exames laboratoriais, entre os quais exames genéticos, deverão ser solicitados conforme a indicação clínica, como forma de tentativa de elucidação da causa, bem como da detecção de morbidades associadas (exemplo: epilepsia).
O complexo sintomatológico do autismo/TEA será objeto de uma segunda coluna, bem como os tratamentos indicados.
José Renato Donadussi Pádua, médico neuropediatra