De um ateliê tímido que começou há mais de 30 anos, para as telas de milhões de pessoas é mais ou menos assim que podemos resumir a trajetória de Adhemir Preschadt. O trabalho como estilista começou em 1976, ainda como desenhista de modelos em uma loja que vendia tecidos aqui em Passo Fundo. “Eu fui convidado por uma empresa que veio a Passo Fundo para gerenciar essa loja e fazer os desenhos. Na época, a gente vendia o tecido e levava na costureira para fazer os modelos, eu criava os modelos e isso era uma cortesia da loja para a cliente. Como ainda acontece hoje em muitas lojas”, conta. Aos poucos e com o casamento, Adhemir entendeu que o melhor seria abrir o próprio negócio, então, ele e a esposa, migraram para um ateliê de costura e eles mesmos fabricavam as coleções do estilista. Aos poucos, foram surgindo funcionários, costureiras e hoje, o ateliê ocupa uma casa toda reformada com 400m2. Nessa entrevista, Adhemir conta um pouco da sua história, fala das escolhas que fez, do mundo da moda e, claro, do vestido que ficou famoso na novela.
Mix - O mundo da moda é muito amplo, então porque a preferência pela moda festa?
Adhemir - Eu sempre foquei em um negócio que era o que eu gostava, do glamour, da festa, da noiva, da debutante, da formanda. A roupa prêt-à-porter - a pronta-entrega - para indústria nunca me fascinou. Eu acho que cada um segue uma direção, cada estilista segue um caminho. Eu escolhi a alta costura – aqui no Brasil não existe alta costura, a gente chama assim porque são peças mais trabalhadas, com bordados, mais artesanal, mas na verdade não é, alta costura só existe na França. Escolhi essa linha festa porque eu gosto muito.
Mix - Ao longo desses mais de 30 anos de profissão, quais são as principais mudanças que você notou?
Adhemir - Na verdade, a principal questão é que o vestido que você manda fazer, que você compra, você não vai pagar barato como seria em uma loja que tem vários iguais. A invasão dos importados está dificultando muito o nosso trabalho. Todos os estilistas reclamam que são preços muito acessíveis. São vestidos bem bordados, feitos à mão, provavelmente com mão de obra escrava que são vendidos para o mundo todo. Acho que isso está concorrendo muito com o nosso trabalho. A nossa mão de obra é mais cara. Eu até tenho uma linha de vestidos importados, porque é difícil fazer aquele trabalho que eles oferecem, com tanta pedraria, por um preço tão acessível. Se você pagar por uma peça sob medida, você vai ter uma peça atemporal, não é uma roupa para usar uma vez só e isso é uma satisfação muito grande. Tenho clientes que chegam e me dizem: “Adhemir, já faz 15 anos que eu tenho uma roupa e ainda estou usando”. Existe coisa mais linda? Para mim não existe. São roupas que não saem de moda. E se essa noiva for pegar o álbum daqui a 20 anos e for olhar, ela vai se ver sempre linda porque é um vestido sempre atual, clássico, não é modinha. Se você faz um vestido em um costureiro, em um estilista é para usar várias vezes. Você pode até fazer adaptações nele ao longo do tempo.
Mix - Como você faz para encontrar o estilo de cada cliente e dar exatamente o que ela está buscando?
Adhemir - Para isso a gente sempre marca um horário e faz uma entrevista para conhecer a cliente, conversar. Tem um pouco de psicologia nesse trabalho, porque você está lidando com sonhos e expectativas. As pessoas vêm encomendar um vestido e pensam que ele tem que ficar o mais lindo eu já fiz. Então, eu vou procurar fazer e realizar o sonho daquela cliente que vem se imaginando uma princesa, uma rainha, uma sereia, alguma coisa assim. Você vai conversando, descobrindo um pouco mais da personalidade dela e observando, também, muito o biótipo, porque, às vezes, elas trazem fotos da internet com mulheres de 2 metros de altura e elas têm 1 metro e meio. Tem que ir adaptando os detalhes para elas saírem contentes, satisfeitas com aquilo.
Mix - E qual é a sensação de entregar um vestido?
Adhemir - Essa é a melhor parte. Porque para criar, você pega o papel, desenha, vai definir o tecido, definir os detalhes todos, mas depois, quando a roupa está pronta, quando a cliente veste e diz: “Meu Deus, era tudo que eu sonhava”, é a melhor parte. Muitas choram e eu choro junto.
Mix – E o vestido na novela? Como aconteceu tudo?
Adhemir - Para mim foi um grande presente que ganhei. Porque as emissoras sempre procuram estilistas de áreas próximas e dessa vez me acharam aqui em Passo Fundo. Eu fiz uma feira no Bourbon, no ano passado e fiz esse vestido para a feira. A produção da novela pesquisou muito, porque naquele mês de setembro, mês da feira, seria o casamento da personagem da Grazi Massafera na novela. Eles já tinham uma linha para o figurino dela, mas como aconteceram algumas mudanças com a personagem, ela ficou rica, então o vestido tinha que ser um pouco mais sofisticado, mas sem sair do enredo da personagem, principalmente a parte das rendas, a leveza, por ser um casamento na praia. Eles, na verdade, já tinham vários figurinos, mas quando eles viram a foto do vestido, não sei como no meu Facebook, eles entraram em contato, mandaram as medidas dela e eu adaptei o vestido para o corpo dela. O vestido foi e ficou perfeito e fez esse imenso sucesso. Até hoje as pessoas ligam para saber informações, do Brasil todo, tem uma lista grande de interessadas aguardando a liberação. Eu não posso liberar ele ainda porque, como ele fez muito sucesso e foi usado por uma artista global, tem várias revistas pedindo para fazer fotos, ele ainda está rodando pelo Brasil. No momento que for liberado, a gente vai começar a ligar para as clientes que estão interessadas.
Mix - Você viaja muito em busca de referências?
Adhemir - Eu viajo anualmente para fazer pesquisas, para trazer novos materiais, coisas que não existem no Brasil e isso tudo vai agregando. Porque uma roupa bem feita, como a nossa, tem o seu segredo, tem sua matéria-prima e tem coisas que você não encontra aqui. Por isso é importante, sair. Só em revistas e internet você não consegue ter o contato com a peça. Fora daqui eu tenho esse contato, tenho amigos e lá eu tenho acesso aos maiores costureiros do mundo, posso olhar as peças, como são feitas e tudo isso.
Mix - O mundo da moda é mesmo tão glamourso como todo mundo imagina?
Adhemir - Tem o seu glamour, mas é um trabalho muito duro, é muita responsabilidade. Eu trabalho a semana toda, em casa eu não penso em moda, eu durmo tranquilo, mas no fim de semana eu trabalho, porque quem corta as roupas sou eu. Além de criar, eu corto todas as peças e distribuo para as costureiras. Toda essa parte é feita por mim, eu decido o tipo de bordado, vou atrás do material, desde o alfinete, do ganchinho da roupa, do zíper, tudo é por minha conta. Então, é bem trabalhoso, fora os incômodos. Não é só ver a loja, com as roupas maravilhosas, gente feliz – claro que aqui a gente só fala em alegrias, ninguém fala em tristeza – mas tem também a parte incômoda.
Mix - Você tem planos para o futuro? Sair daqui talvez?
Adhemir - Na verdade, eu comecei aqui muito pequeno, na galeria central. A gente abriu uma loja de 4x4, começamos trabalhar lá e fomos crescendo. Depois disso, alugamos uma casa na Vergueiro, mas nós morávamos junto e isso era um pouco complicado, o trabalho e a casa serem no mesmo lugar. Eu queria sair da casa e ter um trabalho. Com o tempo, minha esposa que já tinha o imóvel onde é o ateliê hoje, fez todas as mudanças, criou todo esse espaço e nós resolvemos ficar por aqui. Eu trabalho também em Balneário Camboriú, vou uma vez por mês para lá ou dependendo da demanda. Mas todo o trabalho que a gente pega lá é desenvolvido aqui em Passo Fundo, lá não tem mão de obra para esse tipo de costura. Tudo é feito por aqui. Eu me divido entre essas duas cidades, mas o foco principal é aqui em Passo Fundo, porque a fábrica está aqui. É aqui que se resolve, é aqui que se faz tudo.