Idosos, empréstimos consignados e seus efeitos nas relações familiares

Por Caroline Stumpf Buaes

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Até pouco tempo atrás, os idosos não chamavam a atenção como uma importante classe de consumidores no Brasil, devido a sua baixa representatividade na estrutura populacional brasileira e também a seu suposto reduzido poder econômico. Hoje, esta situação está bem diferente. Além do aumento da expectativa de vida das pessoas com mais de 60 anos, os idosos tiveram também, nas últimas décadas, uma melhora na sua condição financeira, com o aumento dos benefícios sociais, e, assim, passaram a despertar o interesse de diversos setores comerciais interessados em atender as demandas desse segmento populacional. 

Seguindo esta tendência, diferentes instituições financeiras e órgãos bancários, com o apoio de criativas campanhas publicitárias, estão atraindo milhões de idosos a cada ano para a contratação de créditos, sobretudo o chamado “consignado”. Com uma impressionante adesão na faixa de clientes com mais de 60 anos, o crédito consignado consiste em uma consignação de descontos para pagamentos de empréstimos e cartão de crédito, contraídos nos benefícios da Previdência Social com taxas de juros reduzidas em relação às praticadas pelo mercado. As regras principais são a limitação do número de prestações do crédito (até 60 meses) e os pagamentos mensais, que não podem exceder 30% da receita líquida do benefício.

No entanto, precisamos atentar para o fato que, mesmo que o crédito consignado promova a inclusão das pessoas idosas no mercado de consumo, muitos deles não compreendem as regras aplicadas aos empréstimos e encontram dificuldades em se planejar para o impacto dos descontos no orçamento mensal, cortando gastos com saúde, alimentação, plano de saúde e medicação.

No contexto brasileiro, pensões e aposentadorias tornaram-se especialmente importantes em um mercado de trabalho precário e instável, marcado pela dificuldade de acesso, pelo trabalho informal e pela instabilidade de emprego das gerações mais jovens. Podemos observar, por meio de dados demográficos, o aumento de famílias chefiadas por idosos com filhos e netos residindo no mesmo espaço. O aumento de auxílio a pessoas que convivem com o idoso torna-se muitas vezes um fator que contribui para o crescimento de dívidas. Dentre as principais razões citadas pelas pessoas com mais de 60 anos para contrair empréstimos é contratá-lo para outros membros da família. É possível pensarmos que a contratação de empréstimos seja realizada tanto como tentativa de manutenção das necessidades básicas de sobrevivência como de liquidar dívidas. Desse modo, pode tanto gerar situação de dependência e exploração financeira quanto de empoderamento do idoso ao fornecer ajuda a outros membros no contexto familiar.

Portanto, é importante mantermos permanente reflexão sobre como o uso do dinheiro afeta as relações dos idosos no âmbito familiar, uma vez que a problemática produzida pelas relações afetivo-financeiras pode resultar tanto em relações intergeracionais mais solidárias quanto mais fragilizadas e conflituosas.

Caroline Stumpf Buaes é professora da Escola de Psicologia da IMED

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