O trabalho do Brasil no controle do tabagismo foi reconhecido internacionalmente pela Bloomberg Philanthropies, que conferiu ao país no mês de março o “Prêmio Bloomberg para o Controle Global do Tabaco”. A premiação é um reconhecimento ao papel desempenhado pelo Ministério da Saúde e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no monitoramento epidemiológico do uso do tabaco e na implantação de políticas públicas para enfrentar o desafio da luta contra o fumo. Ao justificar a escolha do Brasil para o prêmio, a entidade internacional destacou a atuação do país no controle do tabagismo. “O trabalho que o Ministério da Saúde fez é modelo para outros países que também atuam nessa área”, ressalta o documento da Fundação Bloomberg.
Responsável por cerca de 6 milhões de mortes por ano em todo o mundo, o tabagismo pode chegar a matar 8 milhões de pessoas em 2030, caso não sejam implantadas medidas para conter o avanço do fumo no planeta. No Brasil, no entanto, o número de fumantes permanece em queda. A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada pelo Ministério da Saúde em parceria com o IBGE, revela que o índice de pessoas que consomem cigarros e outros produtos derivados do tabaco é 20,5% menor que o registrado cinco anos atrás. Em 2013, do total de adultos entrevistados, 14,7% afirmavam fumar. Esse índice era de 18,5% em 2008, conforme a Pesquisa Especial de Tabagismo do IBGE (PETab).
A priorização do atendimento ao tabaco em unidades básicas de saúde também pode ser mensurado pela PNS. De acordo com a pesquisa, 73,1% das pessoas que tentaram parar de fumar conseguiram tratamento, um aumento importante em relação a 2008, quando o índice era de 58,8%. Atualmente são mais de 23 mil equipes de saúde da família em todo o país prontas para oferecer o tratamento ao tabagismo em 4.375 municípios. Em 2013 e 2014, o Ministério da Saúde destinou R$ 41 milhões para compra de medicamentos ofertados no tratamento contra o tabagismo.
Além do tratamento no Sistema Único de Saúde para quem deseja parar de fumar, a pasta atua na elaboração de leis que contribuem para a redução do tabagismo. Em 2011, foi sancionada a Lei 12.546, que altera a sistemática de tributação do IPI e institui uma política de preços mínimos para os cigarros. O preço mínimo do cigarro passou de R$ 1 para R$ 3 e deve chegar a R$ 4,50 neste ano.
O fumo em ambientes fechados também foi proibido em todo o país a partir de dezembro de 2014, com a abolição inclusive as áreas para fumantes – os conhecidos fumódromos. Em casos de desrespeito, o estabelecimento pode receber advertência e multa, além de ser interditado e ter seu alvará de funcionamento cancelado. As multas variam de R$ 5 mil a R$ 1,5 milhão, em caso de desrespeito às normas sanitárias. Além disso, ficou proibida a publicidade de produtos com tabaco em todo o território nacional.
Essas mudanças na legislação brasileira, além da inclusão de imagens nos maços alertando os malefícios para a saúde, impactaram positivamente no hábito de fumar. Mais da metade dos entrevistados da Pesquisa Nacional de Saúde (52,3%) afirmam que pensaram em parar de fumar devido a estas advertências.
O cigarro é responsável por cerca de 200 mil mortes por ano no Brasil e a Organização Mundial de Saúde reconhece o tabagismo como uma doença epidêmica. A dependência da nicotina expõe os fumantes continuamente a mais de quatro mil substâncias tóxicas, que são fatores de risco para aproximadamente 50 doenças, principalmente as respiratórias e cardiovasculares, além de vários tipos de câncer como o de pulmão e brônquios. O fumo responde hoje por 90% dos casos de câncer de pulmão e 25% das doenças vasculares, como infarto.
Entrevista
Medicina & Saúde – De maneira geral, ações como a proibição de fumar em locais públicos favorecem a saúde da população?
Rodrigo Ughini Villarroel – Certamente, pois além de servir como um estímulo para que os tabagistas abandonem este hábito, também protege o não fumantes do tabagismo passivo, que hoje é considerado uma importante causa evitável de morte. Quando uma pessoa não tabagista respira a fumaça do cigarro por estar próxima de um fumante, ela inala todas as substâncias tóxicas (pelo menos 69 são reconhecidamente cancerígenas) do cigarro da mesma maneira que o fumante, e fica exposta aos mesmos riscos.
Medicina & Saúde – Na sua opinião, quais outras medidas poderiam ser tomadas como o mesmo propósito?
Rodrigo Ughini Villarroel – Campanhas de conscientização visando evitar o início do tabagismo entre os jovens para obtermos um real impacto a longo prazo nas taxas de mortalidade relacionadas ao cigarro, pois uma das medidas mais eficazes na prevenção do câncer é diminuirmos a quantidade de tabagistas. No Brasil, a cada 5 minutos morre uma pessoa por doenças relacionadas com o cigarro.
Medicina & Saúde – Quais danos à saúde causa quem é fumante?
Rodrigo Ughini Villarroel – Fumantes tendem a morrer mais cedo que não fumantes. Estima-se que um em cada dois fumantes vai morrer devido a esse hábito, pois o cigarro mata mais que o álcool, acidentes de carro, AIDS e homicídios somados. O tabagismo está relacionado com pelo menos 30% das mortes por câncer. São vários os cânceres relacionados com o cigarro: pulmão, laringe (cordas vocais), cavidade oral, faringe, esôfago (tubo que comunica a garganta com o estômago), estômago, pâncreas, colo uterino, rim, bexiga, ovário, colon (intestino grosso) e leucemia mieóide aguda. Pelo menos 70% das mortes por câncer de pulmão estão relacionadas ao tabagismo. Menos da metade das mortes relacionadas ao cigarro são por câncer, pois o tabagismo também está relacionado com doenças do coração, aneurismas, bronquite, enfisema e derrames cerebrais. Além disso, o cigarro também reduz a fertilidade, aumenta o risco de parto prematuro e de mal formação fetal, pode causar pneumonia e piora de asma, catarata, osteoporose, úlceras e doenças vasculares. É importante destacar que pesquisas mostram que mesmo fumando tão pouco como um a quatro cigarros ao dia, existe risco de complicações sérias na saúde, ou seja, em se tratando de tabagismo, não existe uma “dose segura”.
Medicina & Saúde – Existe uma "fórmula" para parar de fumar?
Rodrigo Ughini Villarroel – Obviamente não existe uma “fórmula infalível” e o sucesso depende também em grande parte da determinação do fumante em interromper o vício. Entre as medidas que podem ser adotadas para auxiliar nesse processo estão o aconselhamento e terapia comportamental, medicações substitutivas da nicotina (por adesivos ou gomas de mascar), antidepressivos e medicações qus simulam o efeito da nicotina a nível cerebral, como a vareniciclina.
Colaborou
Rodrigo Ughini Villarroel, oncologista, coordenador médico do Centro de Oncologia e Hematologia do Hospital da Cidade de Passo Fundo. Membro da American Society of Clinical Oncology (ASCO); Membro da European Society for Medical Oncology (ESMO); Membro da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC)