Apesar de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ter visto com preocupação a liberação sem garantia de eficácia e segurança, foi sansionada a lei que autoriza o uso da substância fosfoetanolamina sintética, apelidada de "pílula do câncer", por pacientes diagnosticados com tumores malignos.
Em função disso, o Ministério da Saúde está participando da elaboração de regulamentação para o uso, pesquisa e fornecimento do medicamento. A regulamentação reforça o estudo da substância, implementando um Comitê Gestor, com o objetivo assegurar e acompanhar a realização de pesquisa científica em terapias inovadoras, garantindo a segurança e a eficácia dos tratamentos contra a neoplasia maligna, além de estimular a pesquisa científica, os testes pré-clínicos e clínicos necessários para o registro sanitário da fosfoetanolamina sintética junto à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
O Plano poderá fomentar ainda o desenvolvimento da monoetanolamina e outras substâncias potencialmente ativas no tratamento da neoplasia maligna. Será reforçado à Anvisa a priorização da análise de pedidos de pesquisa clínica e registro da fosfoetanolamina sintética.
Considerando indispensável a regulamentação do disposto no parágrafo único do art. 4º da citada Lei, que condiciona o fornecimento da fosfoetanolamina sintética, está sendo sugerido a prescrição médica em talonário numerado que permita o rastreamento do paciente (com justificativa para o uso), além da realização de exames regulares para acompanhamento do estado de saúde do usuário.
Os estabelecimentos fornecedores de fosfoetanolamina sintética deverão manter balanço específico com a movimentação da substância. Além disso, os interessados arcarão com todos os custos para aquisição da fosfoetanolamina sintética, pois é um medicamento que não foi incorporado do SUS (Sistema Único de Saúde). Para isso, seria necessária a avaliação pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS), que faz análise baseada em evidências, levando em consideração aspectos como eficácia, acurácia, efetividade e a segurança da tecnologia.
Como destacado na Justificativa do Projeto que originou a Lei nº 13.269, de 13 de abril de 2016, trata-se de possibilidade de fornecimento da substância em fase de estudos para pacientes em estado avançado da doença. Por esse motivo, será necessário a assinatura de termo de responsabilidade resguardando “a autonomia humana, o direito de expressar sua vontade, o direito que cada indivíduo tem de fazer suas próprias escolhas e assumir a responsabilidade por elas”.
O termo de responsabilidade deverá especificar que o uso da fosfoetanolamina sintética não substitui as terapias convencionais, bem como que o paciente se compromete a realizar exames periódicos para acompanhar a evolução do tratamento e assume os riscos de eventuais efeitos colaterais dele advindos.
CFM não recomenda prescrição do medicamento
O Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou nota na última semana na qual recomenda aos médicos brasileiros a não prescreverem a fosfoetanolamina sintética para tratamento de câncer até que a eficácia e a segurança da substância sejam reconhecidas por evidências científicas.
Em março, o CFM, a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) já alertavam para a liberação do uso da fosfoetanolamina sem que o medicamento passe por todas as fases dos testes clínicos. No artigo intitulado “O perigoso caso da ‘pílula do câncer’”, os presidentes das três entidades se posicionaram contra o então projeto de lei, que entendiam se “risco à saúde pública e um agravo ao poder constituído das entidades médicas”.
Surgimento da pílula
A fosfoetanolamina sintética começou a ser estudada pelo professor Gilberto Orivaldo Chierice, hoje aposentado, enquanto ele ainda era ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da USP. Algumas pessoas tiveram acesso às cápsulas contendo a substância, produzidas pelo professor, que usaram como medicamento contra o câncer. O instituto disse, em nota, que a produção da droga foi um “ato oriundo de decisão pessoal” de Chierice.
Em junho de 2014, a USP reforçou a proibição de produção de qualquer tipo de substância que não tenha registro, caso das fosfoetanolamina sintética. O instituto editou portaria determinando que “tais tipos de substâncias só poderão ser produzidas e distribuídas pelos pesquisadores do IQSC mediante a prévia apresentação das devidas licenças e dos registros expedidos pelos órgãos competentes determinados na legislação [do Ministério da Saúde e da Anvisa]”. De acordo com a instituição, desde a edição da medida, não foram apresentados registros ou licenças que permitissem a produção das cápsulas para uso como medicamento.