O diagnóstico de câncer faz com que a maioria dos pacientes passe a ver a vida sob outra perspectiva. Com o bancário aposentado Vilson Alberti Santin, a notícia gerou diversos traumas e mudanças bruscas. Depois de fumar e beber por cerca de 30 anos, recebeu o diagnóstico de câncer bucal. Descobriu a doença com 48 anos de idade em uma consulta de rotina. Ele sentia um desconforto no fundo da boca quando entrava em ambientes climatizados. Hoje, já com 57 e quase sem voz, ele sente as sequelas do cigarro e da bebida. “Tenho dificuldades para deglutir, falar e mastigar. Os dentes estão mais frágeis pelas radioterapias e estou quase sem voz”, conta o aposentado que também sofria com a baixa imunidade e, por isso, inclusive mudou de cidade e estado buscando um clima mais estável. Apesar de já ter passado por duas cirurgias e 33 sessões de radioterapia, o diagnóstico precoce auxiliou para um tratamento eficaz da doença. Nesta semana o diagnóstico completa 10 anos e o Carcinoma Epidermóide de Palato Mole está controlado.
Cláudia Schavinski, oncologista clínica do Centro do Tratamento do Câncer (CTCAN) que acompanhou o tratamento e hoje faz o controle da doença do aposentado, ressalta a importância do diagnóstico precoce, através de exames rotineiros na boca. Feitos por um profissional de saúde, eles podem diagnosticar lesões no início, antes de se transformarem em câncer. “A população deve fazer o auto-exame da boca a cada 6 meses. Já aqueles que bebem e fumam devem estar mais atentas e fazer uma avaliação com profissional pelo menos uma vez ao ano”, alerta. O acompanhamento é importante pois o Brasil é o quarto lugar em incidência no mundo e em 2016 são estimados mais de 15 mil novos casos. A taxa de cura nos casos iniciais pode chegar a 80%, contudo nos estágios avançados da doença, o tratamento tende a ser mais agressivo e a chance de cura se reduz proporcionalmente.
Causas e diagnóstico precoce
Os principais fatores de risco são: vício de fumar cigarros ou cachimbo, consumo frequente de álcool e no caso de câncer de lábio, a exposição solar sem proteção. Conforme a cirurgiã dentista do CTCAN, Alexandra Silveira, outras causas também são consideradas fatores que predispõem ao câncer de boca, como: má higiene bucal, pela maior quantidade de microorganismos ou traumas constantes na mucosa da boca. Ela explica que o uso de próteses dentárias mal ajustadas, dentes com restaurações ou bordas cortantes, ou mesmo queimaduras repetitivas ocorridas por alimentos muito quentes como, por exemplo, o chimarrão são situações que agridem as mucosas orais predispondo o aparecimento de neoplasias. Outros fatores que podem ser considerados são a presença do papiloma vírus (HPV), idade superior a 40 anos e uma dieta desequilibrada.
Fumo
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), o hábito de fumar é responsável por 80 a 90% das causas de câncer bucal. Atualmente mais de 10% da população brasileira são fumantes. Vilson, que atribui quase 100% ao fato de ter sido fumante o desenvolvimento do câncer, faz uma recomendação. “Eu aconselharia a todos os fumantes que dessem uma repensada na próxima carteira, no próximo maço. Eu tenho certeza que o fumo e o álcool me levaram a esse estágio. Gostaria que todas as pessoas repensassem o cigarro”, pede. Para a oncologista Cláudia, a educação do público e o acesso a informações relacionadas aos fatores de risco; sinais e sintomas de alerta; a realização do autoexame bucal; além da capacitação dos profissionais cirurgiões-dentistas, são fundamentais para o diagnóstico das doenças bucais e seu tratamento adequado.
Sinais de alerta
De acordo com a oncologista, é comum os pacientes confundirem os tumores na boca com aftas. No entanto, o principal sintoma deste tipo de câncer é o aparecimento de feridas na boca que não cicatrizam por mais de duas semanas. “Outros sintomas são ulcerações superficiais com menos de 2 cm de diâmetro e indolores, podendo sangrar ou não, e manchas esbranquiçadas ou avermelhadas nos lábios ou na mucosa bucal”, explica. Ela alerta para algumas lesões que podem passar despercebidas. “É importante observar o tempo de duração destas alterações e procurar atendimento odontológico ou médico caso não haja melhora dos sintomas. Dificuldade de fala, mastigação e deglutição, além de emagrecimento acentuado, dor e presença de linfadenomegalia cervical (íngua no pescoço) são sinais de câncer de boca em estágio avançado”, complementa.
Homens x mulheres
Os homens são mais afetados que as mulheres, conforme a cirurgiã dentista, porque apresentam uma somatória dos três principais fatores de risco para neoplasia bucal. “Eles fumam muito mais que as mulheres, bebem mais álcool e se expõem mais continuamente as radiações solares sem proteção”, alerta. Somente no Rio Grande do Sul, em 2016, são estimados 2.260 novos casos de câncer de cavidade oral em homens e 490 novos casos em mulheres, segundo projeções do Instituto Nacional do Câncer (INCA). No Brasil, a estimativa é de 11.140 novos casos em homens e 4.350 em mulheres. "O melhor tratamento é a prevenção, e a prevenção do câncer de boca é basicamente feita a partir da redução dos fatores etiológicos, bem como a visitas regulares ao dentista para se ter um diagnóstico precoce”, complementa Alexandra.