A disseminação de informações sobre supostos efeitos colaterais de algumas vacinas tem preocupado o Ministério da Saúde, que percebe queda no índice de cobertura dos imunizantes. Embora o Brasil seja reconhecido pela qualidade de seu programa público de vacinação ?- foi por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI) que o país alcançou importantes resultados, como a erradicação da varíola, o controle da poliomielite e a eliminação do sarampo e da rubéola congênita como problemas de saúde pública ?-, grupos contrários à vacinação têm crescido por todo o país.
O comportamento de desconfiança quanto à eficácia das vacinas já tem sido registrado em outros países há algum tempo. Na Europa, por exemplo, o alto número de casos de sarampo reportados somente neste ano fez com que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarasse situação de surto. De acordo com autoridades do Centro Europeu para a Prevenção e o Controle de Doenças, o surto aconteceu por haver um acúmulo de indivíduos não vacinados. A baixa cobertura de imunização nestes países estaria associada aos grupos que se recusam a se vacinar ?- mais ainda, se recusam a vacinar os próprios filhos.
No Brasil, o comportamento tem ganhado força pelas redes sociais, em que grupos são criados para compartilhar informações sobre efeitos colaterais das vacinas. A maior parte dos membros destes grupos são pais que optam por não vacinar os filhos, baseando-se principalmente em artigos e notícias publicadas em blogs de outros países a respeito dos supostos efeitos negativos causados pelas imunizações. Segundo a pediatra e coordenadora do Programa de Residência Médica de Pediatria do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), Wania Ebert Cechin, as principais desconfianças rondam a vacina do HPV, da gripe, da tríplice viral e da febre amarela.
Prova disso é o índice muito abaixo do esperado na vacinação contra a gripe em crianças, em Passo Fundo, neste ano: enquanto a meta era vacinar 90% do público-alvo, apenas 65,4% dessa meta foi alcançada. Quanto à vacina do HPV, a adesão ainda menor. Em 2015, na primeira etapa de vacinação, o público-alvo era de 4 mil e 115 meninas, mas apenas 2 mil e 928 procuraram as Unidades Básicas de Saúde para receber a dose. Na segunda etapa, das 4 mil e 201 meninas esperadas, apenas 2 mil e 82 foram vacinadas. Em 2016, o número foi ainda menor: completaram o esquema vacinal somente 767 meninas.
A pediatra explica que sempre existiram dúvidas e incertezas em relação à aplicação das vacinas e, apesar de considerar positivo que os pais questionem os pediatras sobre a importância e a segurança de vacinar seus filhos, julga como necessário que esses pais questionem também as informações encontradas em redes sociais. ?"É essencial que a fonte seja confiável, para que não se contraia uma doença que poderia ser evitável com uma vacina. Os efeitos colaterais, quando existem, são pequenos, sem maior importância. As vacinas passam por cinco a 10 anos de testes de eficácia e eficiência, nos quais são observados todos os controles internacionais de segurança. Não existem vacinas cem por cento seguras, no entanto, usar os efeitos adversos para não vacinar não parece ser de bom senso?".
De acordo com o secretário da Saúde do município, Luiz Arthur Rosa Filho, vacinas novas ?- como a do HPV ?- tendem a ter maior resistência, mesmo sendo de conhecimento comum que os efeitos colaterais são extremamente raros. ?"O Brasil acabou com várias doenças em função da vacinação. Não há dúvida nenhuma que levar seu filho para vacinar é o que há de melhor a se oferecer para ele, mas ainda enfrentamos resistência por parte da população. A vacina do HPV, por exemplo, vai ter efeito na mulher lá com 30 ou 40 anos de idade, então o próprio pai não consegue valorizar a vacina naquele momento, não consegue ver o benefício. E isso preocupa um pouco.
Esse benefício é de longo-prazo e, muitas vezes, é um benefício coletivo, ou seja, você vacina o seu filho, o vizinho vacina o dele, para que a doença não circule na cidade?". É justamente na questão de benefício coletivo que mora o problema. Pessoas que se recusam a receber a vacina quebram a corrente da coletividade em questão vacinal e ficam suscetíveis a contraírem doenças, que podem ser transmitidas para outras pessoas e voltarem a circular. ?"Suspender as campanhas de vacinação traria muitos prejuízos à população com o retorno de epidemias do passado. Não há intervenção médica de melhor relação custo-benefício do que as vacinações, e o programa de imunizações do Brasil é justo motivo de orgulho, pelos imensos benefícios que tem gerado, sem qualquer restrição de acesso a ricos ou pobres?", Wania finaliza.
CONASS
Em nota, o Conselho Nacional de Secretários da Saúde (CONASS) diz que repudia a atuação dos grupos ?"anti-vacina?", pois estes estariam tentando minar a credibilidade das vacinas e consequentemente o alcance das ações de imunização, disseminando informações sem qualquer evidência científica. Diz ainda que ?"as estratégias de vacinação no Brasil, bem como a inclusão de vacinas no Programa Nacional de Imunizações (PNI), são decisões respaldadas em bases técnicas e científicas, considerando as evidências epidemiológicas e sua eficácia e segurança. A incorporação de qualquer imunobiológico no país é definida após registro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), a partir de criteriosa avaliação do Comitê Técnico Assessor de Imunizações do Ministério da Saúde. Este comitê conta com a participação de pesquisadores renomados e a representação das diversas sociedades científicas envolvidas com o tema. Todas as vacinas utilizadas são ainda submetidas a um rigoroso controle desde sua origem, tendo sua logística de distribuição e rede de frio organizada no sentido de manter esta qualidade?".