Embora a Universidade de Oxford e o laboratório anglo-sueco AstraZeneca Plc tenham surpreendido a comunidade científica internacional ao anunciar, na terça-feira (8), a suspensão global temporária dos ensaios clínicos, em pacientes humanos, para o desenvolvimento da vacina contra a Covid-19, os testes não afetam a credibilidade ou a eficácia da dose para imunização.
A avaliação, feita pelo professor virologista do curso de Medicina da IMED, Deniz Anziliero, considera que o anúncio passou pelo filtro de transparência ao revelar reações adversas que uma das voluntárias, uma mulher britânica, apresentou na fase 3 dos testes desta que é uma das vacinas mais promissoras contra o SARS-Cov-2. “Eles precisam parar, voltar atrás e analisar os passos para identificar se houve algum erro na administração do produto. Como é uma vacina muito esperada, os responsáveis resolveram dar um passo atrás para deixar tudo mais claro possível porque um problema lá na frente perde credibilidade”, ponderou.
A notificação aos países cujas doses estão em fase de teste, entre os quais o Brasil, está longe, porém, de ser um balde de água fria aos cientistas e à população, segundo Anziliero. Isso porque, segundo explicou o professor, a maioria das vacinas produz reações “insignificantes” após serem aplicadas. “Tem se criado muita expectativa em acelerar o processo para disponibilizar a vacina o quanto antes, e é muito perigoso quando os gestores começam a estipular o prazo. Por isso que fazemos ensaios clínicos. O objetivo do ensaio é exatamente esse porque é quando avaliamos a segurança e a eficácia da vacina, e isso precisa de tempo”, frisou.
Mielite transversa e suspensão dos testes
A reação da paciente voluntária, conforme divulgou o site especializado Stat, desencadeou um conjunto de sintomas semelhantes à mielite transversa. A doença inflamatória, como mencionou Anziliero, é muito rara de se manifestar. “A mieliete transversa é um processo inflamatório ainda desconhecido. As grandes suspeitas da comunidade científica é de que ela tenha uma relação com a autoimunidade do indivíduo. Se suspeita que ela surja associadas às infecções virais”, esclareceu. “É um processo inflamatório na região da medula e altera os sinais nervosos que ela emite para o nosso corpo. Geralmente, infecções virais tem esse tipo de manifestações”, prosseguiu. A causa, portanto, pode estar associada mais ao vírus no organismo que a um efeito colateral da vacina, segundo o especialista.
Corrida pela imunização
Mesmo com a suspensão dos testes com a vacina desenvolvida pela farmacêutica AstraZeneca e a Universidade de Oxford, do Reino Unido, outras doses para imunização massiva contra o coronavírus estão em fase de testes no Brasil: a das farmacêuticas Pfizer, dos Estados Unidos e BioNTech, da Alemanha; a vacina Coronavac, criada pela empresa chinesa Sinovac; e a unidade farmacêutica da empresa Johnson & Johnson, última a ter testes clínicos autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O primeiro passo que os pesquisadores precisam dar nesse sentido, conforme explicou o professor, é identificar uma parte do corpo do microrganismo, uma molécula, que provoque resposta do sistema imunológico ao entrar em contato com células humanas. “Quando elaboramos uma vacina, passamos por 5 fases. Nos ensaios pré-clínicos são desenvolvidas de tecnologias e testadas in vitro ou em seres em ratos. Se a vacina tiver uma resposta positiva, é testada em um grupo pequeno e determinada se ela será aplicada no músculo, embaixo da pele ou via oral [por gotinha]. Já na fase 2, como o número de voluntários é maior, seguimos avaliando se a vacina induz resposta imunológica e é segura observando as reações adversas porque amplia o grupo de testagem”, elucidou.