Nessa CPI, que investiga a responsabilidade pela má gestão da pandemia pela Covid-19 no Brasil e cuja mortalidade logo atingirá meio milhão de brasileiros, houve depoimentos curiosos. Evidentemente alguma coisa não andou bem no Brasil. Numa crise sem precedentes na história da Pátria, não teve uma campanha nacional para enfrentar a doença. Forneceram-se instruções conflitantes por redes sociais e eximiram-se de responsabilidades. Para um vírus que se dissemina por via respiratória, as medidas básicas, como o uso de máscaras e a prevenção de aglomerações, foram sempre alvo de críticas. Já tínhamos notícia da exitosa experiência do uso de máscara na Gripe Espanhola, 1918, quando essa proteção diminuiu a curva ascendente dos infectados. A fantástica rapidez na elaboração de vacinas que vieram como a mais importante estratégia contra a Covid-19 não foi aproveitada pelo Brasil. Nós, que deveríamos estar fazendo a compra “precoce”, preferimos discutir precocidades inúteis.
Estratégia diversionista
Nos debates da CPI da Covid-19 se percebe facilmente o grupo que defende a política que foi adotada no combate da pandemia e aquele que a critica. Reconheça-se que tem sido muito difícil defender os programas de enfrentamento estabelecidos pelo governo à luz dessa mortalidade enorme. A estratégia diversionista trouxe debates fora de contexto como a autonomia dos médicos para receitarem medicações sem indicações de bula. É certo que o médico tem essa prerrogativa, mas, com certeza, é muito melhor prescrever alternativas testadas em outras partes do mundo e avalizadas pelos órgãos historicamente envolvidos com as políticas médicas consensuais e seguras. Podem ser citadas a Organização Mundial da Saúde, a ANVISA, o Centers for Disease Control and Prevention, a European Medicine Agency e outros. Na verdade, com essa mortalidade, não estamos no papel de ensinar, mas sim de resignadamente e humildemente apreender.
Alegria e esperança
Entre os depoentes na CPI, apareceu de tudo. Tivemos muitos “enroladores”, mentirosos, pseudocientistas, mas, mesmo assim, muitas coisas vieram à tona. As informações, entretanto, eram confusas e tendenciosas. Foi com alegria e esperança que assistimos o depoimento da Dra. Luana Araújo, Infectologista e com mestrado em Saúde Pública pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. Essa Universidade, por acaso, coordena os dados estatísticos sobre a pandemia em todo mundo. A Dra. Luana foi convocada para trabalhar no Ministério da Saúde e após 10 dias foi dispensada porque “seu nome não foi aprovado”. De última.
Rolo compressor
Ela, com uma elegância inusitada, trouxe os conhecimentos epidemiológicos pertinentes à pandemia. Rebateu com determinação as informações distorcidas com as quais alguns senadores tentaram lhe encurralar. Reafirmou o que se encontra nos bons livros e nos estudos de qualidade. Foi um rolo compressor. Não se deixou enganar ou resvalar para a política rasteira que, em alguns momentos, tentaram lhe envolver. Criticou, com propriedade, a falta de condução da pandemia. Um farol de bom senso. No meio da refrega, percebendo que um garçom lhe serviu um copo com água, disse, gentilmente: “muito obrigada”.
Como diria meu amigo João Luiz Roth, de Santa Maria, que categoria!
(*) Hugo R. K. Lisboa, MD, PhD é endocrinologista e professor de Medicina da IMED