O avanço da vacinação no Brasil traz esperança de controle da pandemia. Aliada a queda dos indicadores no país, a percepção da população sobre a pandemia mudou. Pela primeira vez, a maioria dos brasileiros acredita que ela está parcialmente controlada (53%) ou totalmente controlada (5%), conforme pesquisa Datafolha divulgada ontem (15) pelo jornal Folha de São Paulo.
“Essa é talvez uma das sensações mais traiçoeiras que podemos ter nesse momento: achar que está tudo controlado, pois isso nos leva a crer que podemos relaxar nas medidas de proteção, higienização e distanciamento social, que é o que todos nós ansiamos em fazer há mais de um ano. No entanto, é nesse momento de baixa na guarda que damos oportunidade para variantes mais infecciosas ou que estejam relacionadas a um quadro mais grave da doença possam se proliferar”, explica o Professor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) e Doutor em Virologia, Gustavo Olszanski Acrani.
O mais prudente, neste caso, é pensar que a pandemia não está controlada, conforme o professor. Os números de julho de 2020 no país, similares aos atuais, são apontados como motivo para a preocupação. “Estávamos longe de pensar naquela época que a pandemia estava controlada. Por que hoje, com a curva neste mesmo patamar, iríamos pensar em interpretar isso como uma situação de controle?”, questiona o especialista.
Passo Fundo
A cidade vive uma queda dos indicadores, com o número de casos ativos em 439 e hospitalizações em 89. No entanto, o professor apresenta outro ponto de vista. Ele lembra que há um ano, em 13 de julho, a cidade tinha 245 casos ativos. “Alcançamos um patamar de números de casos e óbitos próximos ao observado antes deste terceiro pico ou onda da pandemia, ocorrido de abril a junho deste ano. Nós apenas descemos do pico, e estamos mantendo esse nível há algumas semanas, efeito este que pode ser atribuído à vacinação”, analisa o professor.
A vacinação na cidade é considerada eficaz pelo professor da Universidade de Passo Fundo (UPF), Luiz Carlos Kreutz, Doutor em Virologia. “A organização do processo de vacinação é muito eficaz, vacina muitas pessoas de forma efetiva e rápida”, afirma Luiz. Ainda assim, ela é considerada baixa no sentido epidemiológico para alcançar a imunidade coletiva, conforme Gustavo.
Flexibilizações
Diversos fatores são elencados como motivos para a não ampliação das flexibilizações pelo professor Gustavo. Um estudo, segundo ele, mostra que os anticorpos de pessoas que tiveram Covid-19 e se curaram ou que foram vacinados são seis vezes menos eficientes em neutralizar a variante brasileira, a P.1, a cepa predominante no país. Estudos também mostram “ligeiro aumento em casos de Covid-19 em idosos já imunizados”. A maioria não são graves e as causas ainda estão sendo investigadas.
“Estamos em um momento de emergência de novas variantes, como a Delta e a B.1.621, [...] o que agrava toda a situação, uma vez que as vacinas atuais apresentam eficácia menor a estas cepas virais. Levando isso em conta, fica claro que não devemos pensar em novas flexibilizações”, resume o especialista.
"Estamos indo na direção certa, não podemos colocar tudo a perder" - Luiz Carlos Kreutz
O professor Luiz Carlos acredita que algumas atividades não devem ser restritas, como comércio, mas que não poderiam ser liberadas atividades que permitam aglomeração de pessoas. “Eu acredito que o ideal seria flexibilizar aquilo que permite o bom funcionamento e se possa assegurar o fluxo de pessoas”, afirma. O frio e a tendência a ambientes fechados são agravantes neste momento. “Acho que temos que ter paciência, estamos percebendo que os números apontam para o controle, são positivos, o número de casos ativos e internações diminuiu e índice de transmissão do vírus está abaixo de um. Estamos indo na direção certa, não podemos colocar tudo a perder flexibilizando atividades que poderiam colocar em risco esse processo”, destaca o professor. Ele aponta como atividades de risco o transporte, especialmente de estudantes intermunicipais, bares e restaurantes com número de pessoas acima do determinado. “Essas atividades quando se extrapolam o limite mínimo, isso é uma situação de risco importante”, explica.
Normalidade
A tão aguardada normalidade ainda tem alguns obstáculos a enfrentar. A própria vacina tem um efeito indesejado: a sensação de proteção. “Estar vacinado não garante a volta à normalidade, pois a pandemia não é uma doença do indivíduo, mas do coletivo”, explica Gustavo. Especialistas e estudos apontam a taxa de 70% de imunização para que seja formada a barreira imunológica. “Atingindo isso, o próximo passo vai ser esperar a redução no número de casos, redução da taxa de contágio e aí sim, pensar em alguma coisa chamada normalidade”, projeta Gustavo.
"A pandemia não é uma doença do indivíduo, mas do coletivo" - Gustavo Olszanski Acrani
O prazo estimado pelo governo estadual para vacinar toda a população com mais de 18 anos, até setembro, é lembrado pelo professor Luiz Carlos. “A partir dali vamos nos sentir todos mais confortáveis a voltar à normalidade, mas acredito que mesmo após a segunda dose muitas pessoas voluntariamente vão tomar cuidados redobrados quando estiverem em ambientes fechados”, diz Luiz.