Dia Nacional de Doação de Órgãos: o som da vida não pode parar

Campanha permanente da Fundação Universidade de Passo Fundo (FUPF) incentiva as pessoas a comunicarem à família o desejo de ser um doador

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Fotos: Tainá Binelo e Natália FáveroFotos: Tainá Binelo e Natália Fávero
Fotos: Tainá Binelo e Natália Fávero
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Se a doação de órgãos sempre enfrentou momentos difíceis, em tempos de pandemia a situação é ainda mais preocupante. Em 2019, foram feitos 15,8 mil transplantes de órgãos (coração, fígado, pâncreas, pulmão, rim) e, em 2020, esse número não chegou a 10 mil (9,9 mil), ou seja, uma queda de 37%. Atualmente, mais de 30 mil pessoas esperam por um transplante no país. Assim, o dia 27 de setembro, Dia Nacional de Doação de Órgãos, é ainda mais significativo neste ano. Nesse sentido, a Fundação Universidade de Passo Fundo (FUPF) lançou, em 2020, a campanha “O som da vida não pode parar”, uma ação permanente que visa conscientizar sobre a importância da doação e incentivar as pessoas a comunicarem a seus familiares e amigos o desejo de ser um doador.

Cumprindo com a sua missão educativa, a Fundação, por meio dos seus alunos, professores e funcionários, quer romper paradigmas e preconceitos em relação a um tema tão sério, delicado e que pode salvar a vida de muitas pessoas. No Brasil, o desejo de doar deve ser manifestado em vida para a família, porque é ela quem toma a decisão final. “Nós acreditamos que com a nossa campanha chamada “o som da vida não pode parar”, por ter um tom suave e com a música como pano de fundo, ela pode ter essa potência de, aos poucos, modificar a consciência das pessoas”, destaca o presidente da FUPF, professor Me. Luiz Fernando Pereira Neto, que há cerca de um ano e meio também entrou para a fila de transplantes e pretende levar essa bandeira adiante ao ser um porta-voz da doação de órgãos.


“Na minha concepção a doação se tornou uma pauta de vida. A partir do problema encaminhado, vou sempre estar prestando meus depoimentos”

Aos 50 anos, Luiz Fernando Pereira Neto faz muitas coisas. É presidente da FUPF, é professor da Faculdade de Direito, é advogado militante, esposo, pai de duas crianças, e músico amador e, agora, também é uma entre milhares de pessoas que aguardam por um transplante no Brasil. No ano passado, aos 49 anos, em meio a uma pandemia, descobriu o problema renal e recebeu a notícia de que precisaria de um transplante. A rotina teve que se integrar a uma nova programação de cuidados com a saúde e hemodiálise três vezes por semana.

O professor revela que passou por um misto de sentimentos e fases nestes um ano e meio à espera de um transplante. Primeiro foi a vez da surpresa ao receber a notícia e, por muitas vezes, a negação, do “por que eu?”, mas depois veio a aceitação, a força e o desejo de ser um porta-voz em defesa da doação de órgãos. “Às vezes não nos damos conta, mas somos transformados em instrumento de algo maior em termos humanitários e é assim que eu vejo”, comenta o professor, revelando que já tem planos para essa causa e espera em breve ser transplantado. “Para mim, a doação de órgãos é uma pauta de vida. A partir do problema encaminhado, vou sempre estar prestando meus depoimentos e me envolvendo em ações e campanhas que possam modificar a mentalidade da sociedade em relação a esse tema tão sensível”, revela.

Para Pereira Neto, não há nada mais humano e fraterno do que o ato de doar órgãos. “Ninguém leva a sua matéria para eternidade. Nós levamos nosso espírito, nossa alma, aquilo que a gente fez, inclusive o ato de solidariedade. É um ato humano extremo e sagrado, por isso nós temos que mudar este pensamento coletivo. É assim que nós temos que pensar: menos preconceito e mais solidariedade”, afirma o professor.


“Ah...essa pandemia me atrapalhou. Já podia estar transplantado”

O agricultor Dilamar Braga foi um dos entrevistados para a notícia sobre o Setembro Verde no Portal da UPF no ano passado. Conversamos novamente com ele para saber como passou este ano e o agricultor revelou as dificuldades durante este período de pandemia. Além de continuar enfrentando as consequências da insuficiência renal e a espera por um transplante, Braga enfrentou à covid-19. “Acabei pegando a Covid e fiquei onze dias internado, precisei de oxigênio, mas graças a Deus eu venci”, comenta o agricultor que mora em Pontão e continua a sua rotina de hemodiálise três vezes por semana em Passo Fundo.

A pandemia também contribuiu para adiar o transplante. “Ah...essa pandemia me atrapalhou. Já podia estar transplantado. O médico achou melhor esperar até passar um pouco mais essa pandemia. Em agosto, completei nove anos de hemodiálise. Mas estou confiante. Acredito que no começo de 2022 possa realizar o transplante”, revela Braga, que encontrou um doador vivo compatível.


Transplante de rim é o mais realizado no Brasil

Antes da pandemia, eram cerca de 6 mil transplantes de rim por ano. No entanto, em 2020 foram feitos cerca de 2,7 mil. No Rio Grande do Sul, que somava 500 transplantes por ano, foram realizados só 340 no ano passado e apenas 148 até agosto de 2021, sendo que quase mil pessoas estão na lista de espera, de acordo com dados da Central de Transplantes do Rio Grande do Sul. “O transplante pode realizar-se com rins provenientes de pessoas que faleceram (doador falecido) ou com um rim doado por uma pessoa viva (doador vivo)”, explica a professora orientadora da Liga Acadêmica de Nefrologia da Faculdade de Medicina/UPF, Dra. Fabiana Piovesan.


A pandemia afetou drasticamente os transplantes de órgãos

O Brasil tem mais de 32 mil pacientes cadastrados em lista de espera para um transplante de órgãos sólidos: rim, fígado, coração, pulmão, pâncreas e córnea. No entanto, em 2020, foram realizados cerca de 9,9 mil transplantes. Em comparação ao ano de 2019, o número de transplantes em geral caiu 37%. “A pandemia afetou drasticamente os transplantes de órgãos em todo o país, sendo o menor dos últimos oito anos. E as causas dessa diminuição foram o sistema de saúde sobrecarregado pela Covid, muitos pacientes infectados, diminuição do número de doações (muitas vezes devido à diminuição de acidentes e doadores com complicações graves), bem como a precaução das equipes transplantadoras devido ao cenário caótico que enfrentamos”, comenta a professora Fabiana.

As taxas de doadores efetivos caíram em torno de 26,1% em 2021. As quedas foram de aproximadamente 18,4% no transplante renal, 6,9% no hepático e 27,1% nos transplantes de pulmão e coração, segundo dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).

O diretor da Faculdade de Medicina da UPF e médico do Hospital São Vicente de Paulo, Dr. Paulo Reichert, que liderou a equipe que realizou o primeiro transplante de fígado no interior gaúcho, nos anos 2000, também comenta este cenário da doação de órgãos durante a pandemia. “Sem dúvida, a pandemia trouxe uma série de consequências a todos nós e uma das áreas mais afetadas é a dos transplantes de órgãos. Em 21 anos de história do transplante de fígado em Passo Fundo, esse foi o período com menor número de ofertas de órgãos, menor número de procedimentos executados. Aguarda-se ansiosamente o retorno à normalidade. Temos uma expectativa de que com a melhora dos números da pandemia, com a diminuição de novos casos e das internações, as doações voltem aos patamares que tínhamos antes do início de 2020. Por enquanto, o momento é e continua bastante preocupante”, destaca Reichert.


Sobre a campanha:

A campanha da FUPF “O som da vida não pode parar” é realizada em parceria com a Rádio UPF e UPFTV, e conta com o apoio do projeto FAC Movimento da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac/RS) e projeto “Melodias que conscientizam a doação de órgãos”. Saiba mais em www.upf.br/fupf/o-som-da-vida.



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