O surgimento de uma nova variante do coronavírus, inicialmente confirmada em regiões da África, tem sido motivo de alerta em todo o mundo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é possível que a nova cepa, batizada de Ômicron, se torne a responsável pela maior parte de novos registros de infecção pelo coronavírus, especialmente em províncias sul-africanas, onde o índice de vacinação ainda gira em torno de apenas 25% da população. Os cientistas ainda investigam se a variante Ômicron, que tem 32 mutações, é mais transmissível e letal que outras cepas da Covid-19 e, também, se apresenta maior resistência às vacinas.
A variante Ômicron foi classificada como uma variante de preocupação pela OMS no dia 26 de novembro e, por isso, a organização vem destacando que o momento exige cautela da população. Até o momento, o órgão estima que a nova variante já esteja presente em pelo menos 22 países, incluindo o Brasil, onde três casos foram confirmados em São Paulo entre a última terça (30) e quarta-feira (1º). Os dois primeiros, identificados após sequenciamento genético realizado pelo Hospital Isreaelita Albert Einstein, tratam-se de um homem de 41 anos e uma mulher de 37, vindos da África do Sul. Eles desembarcaram no Brasil no dia 23 de novembro e fizeram exame antes de embarcar novamente no dia 25.
Embora informações iniciais dessem conta de que os dois primeiros casos da variante Ômicron no Brasil se referissem a pessoas que não haviam sido imunizadas, nessa quarta-feira, a vigilância municipal da capital paulista atualizou as informações dos pacientes e informou que ambos foram vacinados com o imunizante da Janssen na África do Sul. Já o terceiro caso da nova cepa, confirmado pela Secretaria do Estado de São Paulo na quarta-feira, foi identificado como um passageiro da Etiópia, de 29 anos, que desembarcou no Brasil no último sábado (27).
Nova variante preocupa pelo número de mutações
Médico sanitarista e mestre em Epidemiologia, Luiz Artur Rosa Filho explica que o surgimento de mutações em um vírus é um processo normal, que faz parte da natureza viral como um mecanismo de defesa contra outros organismos. O que preocupa no caso da variante Ômicron, segundo ele, é o volume de mutações descobertas na nova cepa. “A variante Delta, por exemplo, tinha duas ou três alterações. A Ômicron tem pelo menos trinta alterações no seu código, o que aumenta um pouco a chance de que seja mais resistente a algum tipo de imunizante. Há um indicativo de que pode ser mais patológica e mais infectiva, também, porque em um avião que transportava 250 pessoas, descobriu-se que 60 delas estavam com a variante. Ou seja, passou para muita gente, o que indica uma chance maior de ela ser mais transmissível”, explica.
Ainda segundo o especialista, as principais mutações da nova variante estão relacionadas à proteína “spike”, que está associada à capacidade de entrada do patógeno nas células humanas e é um dos principais alvos dos anticorpos neutralizantes produzidos pelo organismo para bloquear o vírus, motivo pelo qual alterações nessa proteína podem afetar a eficácia das vacinas, embora ainda não haja qualquer evidência de resistência contra os imunizantes produzidos hoje. “Todas essas possibilidades acontecem, principalmente para não vacinados, mas nós temos uma expectativa de que as imunizações atuais ainda deem conta dessa variante como têm dado de todas as outras. Eu diria que o risco de não funcionar, hoje, é pequeno, mas novos estudos vão evidenciar se isso é maior ou menor”, afirma.
Para o médico, a variante Ômicron deve causar números mais preocupantes em países onde o índice de vacinação ainda é baixo. No Brasil, onde 90% dos brasileiros já tomaram a primeira dose da vacina e 79% completaram o esquema vacinal, a chance de ocorrer um novo pico epidêmico é relativamente baixa, segundo ele, uma vez que a vacina reduz a circulação viral e, mesmo em caso de contaminação, provoca sintomas muito mais brandos da doença. “Passo Fundo é um exemplo disso. Nós estamos há pelo menos uma semana com cerca de 70 casos ativos, um número bem baixo em comparação com o momento em que não tínhamos vacinado a população [à época, o município chegou a superar a marca de mil casos ativos]”. Ele salienta ainda a necessidade de vacinar não somente adultos e adolescentes, mas também crianças.
“O mecanismo indutor de variantes é o excesso de casos”
O alto índice de casos de coronavírus em regiões onde a vacinação ainda é baixa — como é o caso de países do continente africano, em que há circulação viral excessiva nesse momento — está entre os principais fatores atribuídos ao surgimento de novas cepas do vírus. O médico Luiz Artur lembra que o Brasil também já foi local de origem de uma variante, na época em que o Amazonas vivia uma explosão no número de casos ativos da doença. “Nós sabemos disso desde a experiência com outros vírus, em outros tempos: o mecanismo indutor de variantes é o excesso de casos. Não à toa a variante amazônica surgiu no Amazonas por conta do excesso de casos que houve lá. O Brasil corre cada vez menos risco disso, mas temos países europeus e os Estados Unidos, por exemplo, que têm menos sucesso na vacinação e estão mais suscetíveis a vivenciarem o surgimento de novas cepas”, explica.
Anvisa pede dados sobre vacinas já autorizadas no país
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou, na quarta-feira, que havia solicitado às desenvolvedoras de vacinas contra a covid-19 autorizadas no Brasil informações sobre estudos em andamento relacionados à nova variante Ômicron. O pedido foi encaminhado à Pfizer, ao Instituto Butantan, à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e à Janssen. As empresas desenvolvedoras das doses, segundo a Anvisa, farão testes de desempenho das vacinas contra a nova variante. A expectativa da agência é que, nas próximas semanas, os dados das avaliações iniciais estejam disponíveis.