OPINIÃO

Estados Unidos da América - Uma democracia ameaçada? (2)

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Fascita ou não ?

Dizem alguns que o bicho tem bico de pato, grasna como pato, anda como pato, e, portanto, se não é pato, é um bicho muito parecido. Essa tirada espirituosa lembra a discussão corrente e acalorada no jornalismo e nas polêmicas entre cientistas políticos: Donald Trump é fascista ou não? Nas disputas políticas, partidárias e ideológicas a expressão “fascista” é usada a torto e a direito, geralmente para atacar adversários. A boa ciência política não dá respaldo a esse uso. É mais um insulto do que um conceito que permitiria entender o que está acontecendo de fato.

 

Robert Paxton e o facismo

           Robert Paxton (92 anos), autor do livro “Anatomia do Fascismo”, um dos principais estudos sobre o tema, entrou na polêmica sobre Donald Trump. Num artigo escrito em 2017, ele achava que não se devia aplicar a Trump uma etiqueta tão tóxica, como o adjetivo “fascista”. Muitos gestos de Trump recordavam “os absurdos gestos melodramáticos de Mussolini”. A insistência em jogar a culpa da decadência nacional aos estrangeiros e às minorias era um componente básico do fascismo europeu, assim como Trump faz com os imigrantes, especialmente os latinos. Porém, o historiador americano, julgava que o adjetivo “fascista” estava sendo usado de forma tão ligeira e superficial, que tinha perdido seu poder esclarecedor. Apesar de algumas semelhanças, existem mais diferenças de Trump com os fascistas europeus da primeira metade do século 20, dizia ele.

 

 

Invasão do Capitólio

 

No dia 6 de janeiro de 2021, o historiador diz ficou perplexo com o que viu na televisão. Uma multidão invadindo o Congresso Americano. Muitos usavam bonés com a inscrição MAGA (Make America Great Again), uns vestiam gorros cor de laranja próprios do grupo de extrema direita Proud Boys, outros se vestiam de forma estrambótica. Paxton diz que ficou “absolutamente estarrecido”, quem era aquela gente com roupa de camuflagem e alguns até com chifres. Disse que nunca imaginou que pudesse acontecer um espetáculo como aquele em seu país. O violento acontecimento, com vários feridos e cinco mortos, fez Paxton mudar de opinião. Ele eliminou qualquer objeção ao uso do adjetivo “fascista” para se referir a Donald Trump.

 

 

Ameaças reais à democracia

            Para o historiador americano ficou difícil não ver naquela insurreição ecos dos Camisas Negras de Mussolini que, em 1922, marcharam até Roma e tomaram a capital. Em 1923, Hitler e seus seguidores tentaram a região da Baviera, da qual Munique era a capital. Se tivesse sucesso, com a Baviera sob seu controle, Hitler marcharia para Berlim. Não deu e Hitler foi preso. Serviu de lição: ele percebeu que para chegar ao poder deveria utilizar as liberdades democráticas da então República de Weimar. Essa República tem uma história pedagógica sobre como morrem as democracias que não enfrentam seus inimigos. Um dia iremos falar mais dela.

  

Marchas antidemocráticas

            Marchas antidemocráticas, como as lideradas por Mussolini e Hitler, são bastante comuns na história. Num pequeno espaço de tempo vimos duas: trumpistas invadindo o Capitólio e bolsonaristas invadindo a Praça dos Três Poderes em Brasília. Isso parece corroborar uma das mais famosas citações de Karl Marx: os grandes fatos e os grandes personagens da história são encenados duas vezes, a primeira como tragédia e a segunda como farsa. A marcha dos trumpistas e a dos bolsonaristas encenaram uma farsa. Foram frustradas pela falta de adesão nacional e pela resistência das instituições republicanas.

  

A história dirá se o bicho é pato ou não

            Se Trump é fascista ou não, a história dos próximos anos dirá. O próprio Paxton acha que o adjetivo “fascista” mais confunde do que explica. Parece pato, mas ainda não temos uma opinião conclusiva se é, de fato, um pato.


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