“Um espectro ronda a Europa: o espectro do comunismo”. Com essa célebre frase, Karl Marx e Friedrich Engels abriram “O Manifesto Comunista”, publicado em 1848. Se não era assim na época, hoje o comunismo não passa de um fantasma. Todas as experiências históricas comunistas fracassaram, depois de provocarem enormes tragédias, com milhões de mortos. Desaparecerem “numa espécie de nada” (François Furet). Regimes governados por partidos comunistas, como a China e o Vietnã, tornaram-se prósperas economias capitalistas. A Coreia do Norte não é exemplo para nenhum povo, seu sistema é muito mais uma tenebrosa monarquia despótica do que um regime comunista histórico, de tipo soviético. Cuba vive imersa na estagnação econômica e não provoca mais o fascínio que provocava na esquerda e na intelectualidade latino-americana.
O FANTASMA DO COMUNISMO NO BRASIL
Hoje, democratas andam assustados é com radicais de direita que agitam o fantasma comunista como uma ameaça a fim de justificar seus projetos antiliberais e autoritários. Foi em nome da luta contra o fantasma comunista que vimos multidões pedindo intervenção militar, fechamento do Congresso e do Tribunal Superior. Alguém com a cachola no lugar, acredita, de fato, que o comunismo ameaça o Brasil? É de se perguntar em que armário vivia essa gente, de onde vieram esses que pedem a intervenção de alienígenas e rezam em torno de pneu?
ATOS DE FÉ ELABORADOS PELO INCONSCIENTE
Segundo Gustave Le Bon (1841-1931), crenças políticas e religiosas são sustentadas, quase exclusivamente, por fatores afetivos e místicos. Multidões saturadas de misticismo atribuem “um poder mágico ao mentor que as seduz”, que pode ser saudado aos gritos de Mito, Mito. Hipnotizada, a pessoa torna-se um apóstolo, prestes a sacrificar seus interesses, a sua felicidade e sua própria vida para o triunfo de sua crença. Incautos e ingênuos seguiram a multidão furiosa, praticando atos criminosos que acabariam por levá-los a pagar um altíssimo preço, seja a perda de suas liberdades, seja a perda de sua vida, como aquele infeliz que explodiu sua própria cabeça. “Pouco importa o absurdo da sua crença, que é para o crente uma verdade resplandecente. Crenças de origem mística possuem esse maravilhoso poder de dominar inteiramente os pensamentos e de somente serem influenciadas pelo tempo. (...) Causa pasmo constatar o quanto as convicções sentimentais dão pouca importância às evidências racionais.”
INTOLERÂNCIA E ÓDIO
Esse tipo de crença, um ato de fé elaborado no inconsciente, chega a um grau de intensidade tal que nada lhe pode ser oposto. Por ser considerada uma verdade absoluta, ela se torna, necessariamente, intolerante. Explicam-se assim, diz Le Bon, as violências, os ódios, as perseguições. A turba não admite que alguma coisa possa se interpor entre seu desejo e a realização desse desejo. Para o indivíduo imerso na multidão a noção de impossível desaparece. Isolado o indivíduo sente que não poderia sozinho incendiar um palácio e se for tentado a isso ele resistirá à tentação. Fazendo parte de uma turba, o anonimato dá a ele um sentimento de invencibilidade e perda de responsabilidade pessoal. O indivíduo se torna primitivo, irracional e emocional. O obstáculo ao seu desejo, seja um congresso ou um tribunal de justiça, será atacado com frenesi.
A LUZ NA MINHA CAVERNA
Gustave Le Bon. A Revolução Francesa e a Psicologia das Multidões. Rio de Janeiro. Livraria Garnier, 1922.
Gustave Le Bon. Ensinamentos Psicológicos da Guerra Europeia. Lisboa, Tipografia de Francisco Luís Gonçalves, 1916.