Em seu discurso de posse, Trump falou em uma nova “era de ouro”, dos EUA. Seguindo uma linha do excepcionalismo americano, Trump já deu alguns indícios de como estará orientada a política externa americana. A primeira preocupação geopolítica de seu discurso é a imigração ilegal, que também tem um contorno doméstico. Na sequência do discurso, Trump apresentou outra preocupação geopolítica, essa absolutamente externa, com o Canal do Panamá. Assim, o primeiro sinal dele em relação à conturbada política internacional, é essencialmente marítima e isso quer dizer muito. Para que Trump possa retomar a ideia de dominância americana e conduzir a sua eventual guerra tarifária, será necessário eliminar os riscos vinculados às rotas marítimas essenciais para o comércio global de bens, bem como a passagem das frotas militares. Mas qual seria a razão ao se começar com o Canal do Panamá?
Canal
Construído pelos americanos, o canal foi entregue aos panamenhos ainda no governo Carter, em um tratado que estabeleceria neutralidade em relação à administração do mesmo. Um ponto relevante a se considerar é que o canal é a principal passagem entre os oceanos Atlântico e Pacífico, desviando do Ártico e da América do Sul, rotas inviáveis. Hoje, 1/3 da frota militar americana está no Pacífico, 1/3 no Golfo e mais 1/3 no Atlântico. Em caso de eventual guerra em alguma parte do globo, as frotas precisariam do canal para o seu deslocamento. Ocorre que a China vem investindo de forma pesada em infraestruturas no canal, possuindo inclusive duas zonas portuárias, na entrada e saída da passagem marítima, elevando a preocupação de Trump, sobre os riscos na segurança internacional do canal, levando-se em conta a tensão sino-americana. Outro ponto são as elevadas taxas cobradas à circulação dos navios americanos no canal. Como bom negociador, Trump quer barganhar as taxas e recuperar alguma influência no canal, a fim de se evitar cenários comprometedores em termos geopolíticos.
Vias marítimas
O sinal de Trump com o Panamá é claro, os EUA precisarão retomar a sua influência perdida, não só com os conflitos mundiais terrestres, mas essencialmente com as tensões que se dão nas águas internacionais, que trazem impactos diretos à qualquer pretensão americana de expansão. Outros desafios que Trump deverá lidar são: 1) a tensão no Mar do Sul da China (onde a China reclama, em um delírio expansionista, todo o mar, gerando um conflito com os diversos países ribeirinhos naquela porção marítima); e 2) a questão envolvendo os houthis no Iêmen, que tem criado um transtorno no Mar Vermelho ao trânsito de navios comerciais, também tomará destaque. Ocorre que uma das Ordens Executivas de Trump declarou uma série de grupos estrangeiros como terroristas. A partir de agora, o tratamento com os houthis certamente mudará, trazendo uma nova configuração naquela porção marítima. Não bastassem os conflitos terrestres que emergiram recentemente no globo, os conflitos marítimos terão um significado relevante à geopolítica global e, nessa seara, ainda veremos o entrechocar inevitável entre dois projetos de expansão distintos, o americano e o chinês.