CANTANDO HINO PARA PNEU E PEDINDO INTERVENÇÃO EXTRATERRESTRE
Imagens incríveis mostraram pessoas em volta de um pneu cantando o hino nacional. Uma das mais bizarras aconteceu em Porto Alegre: um grupo de manifestantes protestava contra o resultado da última eleição presidencial, pedindo uma intervenção extraterrestre. Também se manifestavam contra uma suposta e fantasiosa ameaça comunista. Como isso acontece? Por que aquelas pessoas agiam dessa forma? O que as levou a invadir a Praça dos Três Poderes e promover terríveis atos de vandalismo no interior dos prédios do Congresso, do Palácio da Alvorada e do Supremo Tribunal Federal?
O CHAMADO DA TRIBO OU A FÚRIA DAS MASSAS
De acordo com Le Bon e Freud, dadas certas circunstâncias, uma aglomeração de pessoas adquire características novas, bem diferentes daquelas dos indivíduos que compõem essa aglomeração. A personalidade consciente desaparece, os sentimentos e as ideias dos indivíduos são orientados numa mesma direção. Forma-se uma espécie de “alma coletiva”, uma “massa organizada” ou uma “massa psicológica”, uma espécie de único ser. A atividade consciente dos indivíduos que a compõem é substituída pela ação inconsciente da turba.
ESPÍRITO MÍTICO
O comportamento da aglomeração, transformada em massa, jamais é compreendido quando se lhe atribui uma origem racional. Sua força reside precisamente na diminuta influência da razão. Para influir sobre ela é inútil argumentar logicamente. Hipnotizados pela sua fé, nada pode convencer os fanáticos. Imerso na turba, o indivíduo pensa, sente e age de um modo absolutamente inesperado, movido por instintos que, antes, como indivíduo isolado, teria freado. Transformadas em massa, as multidões não conhecem a verdade. Demandam ilusões as quais não podem renunciar. E pelo simples fato de formar uma massa, o indivíduo adquire um sentimento de potência invencível, mercê ao qual pode permitir-se ceder aos instintos, coisa que não faria se estivesse sob o domínio da razão.
ISOLADO, UM PACATO CIDADÃO; NA MASSA, UM BÁRBARO
Pessoas de bom caráter e cultas, imersas na massa, descem vários degraus na escala da civilização. Passam a agir com violência e ferocidade. No oito de janeiro de 2023, pessoas pacatas, certamente a maioria composta de bons cidadãos e cidadãs, passaram a ter um comportamento altamente prejudicial às suas vidas, contrário a seu caráter e a seus hábitos. Centenas poderão passar anos preciosos de suas vidas na cadeia. Sacrificaram seus interesses pessoais ao interesse da massa enfurecida.
LÍDERES E AGITADORES
Exemplos históricos atestam que a multidão, transformada em massa pelas crenças e ilusões comuns, necessita de um chefe, ao qual se atribuem poderes misteriosos e irresistíveis. A turba não age por inflamação espontânea. É agitada e estimulada pelo chefe e seu grupo de apoiadores. O discurso do líder reflete a cultura em que ele vive. Quanto mais limitada, mais ridículo seu discurso. Ele pode dizer a massa de seguidores, por exemplo, que ele é “imorrível, imbrochável e incomível”, sem que essas asneiras diminuam o fascínio que ele exerce sobre a tribo.
LUZES NA CAVERNA
Gustave Le Bon: Psicologia das Massas (1895), Ensinamentos Psicológicos da Guerra Europeia (1915), A Revolução Francesa e a Psicologia das Revoluções (1922).
Sigmund Freud: Psicologia de las Masas y Análisis del Yo (1921).
Mario Vargas Llosa. La llamada de la tribu (2018)