A meta do Acordo de Paris, COP21 - 2015, a partir de compromissos de redução voluntária das emissões nacionais dos gases de estufa, é conseguir impedir que a elevação da temperatura média global, em relação ao período da era pré-industrial, ultrapasse a cifra dos 2,0 °C. De preferência que fique abaixo dos 1,5 ºC. Lamentavelmente, se James E. Hansen e colaboradores da Columbia University, Nova York, estiverem certos, conforme artigo recém-publicado na revista Environment: Science and Policy for Sustainable Development (disponível em: https://doi.org/10.1080/00139157.2025.2434494), tudo indica, podemos dizer adeus ao valor 2,0 °C.
A sensibilidade de equilíbrio do clima global, quando se assume duplicação da concentração de gás carbônico na atmosfera (chegamos aos 426,65 ppm, em janeiro de 2025. Lembrem-se que, na era pré-industrial, final do século XIX, era 280 ppm), em vez de 3,0 °C, presumidos pelos modelos GCMs usados pelo IPCC, segundo os novos achados de James Hansen e colaboradores, estaria, realisticamente, mais próxima dos 4,5 ºC (50% maior do que o padrão IPCC). E assim, se insistirmos na negação da mudança do clima global e nada for feito, rumo a uma transição energética planetária sustentável, podemos, nos próximos 20-30 anos, chegar, para diversas variáveis ambientais, aos chamados “pontos de não retorno”.
A velocidade que a temperatura média global vem aumentando tem sido maior do que se imaginava. Nesses dois últimos anos, sob os auspícios de El Niño, recordes de aquecimento no mundo têm sido quebrados. Chegou-se ao valor de +1,6 °C, em agosto de 2024, e eventos climáticos extremos ou relacionados – ondas de calor, secas severas, inundações calamitosas, chuvas intensas, tempestades devastadoras, incêndios florestais, etc. – espalhados em escala global, colocam o mundo, indubitavelmente, em situação de “emergência climática”. El Niño encerrou o seu ciclo. Veio La Niña. E o mundo não esfriou.
James Hansen e sua equipe da Universidade Columbia entendem que boa parte (50% pelo menos) desse aquecimento contemporâneo pode ser atribuída à restrição que foi imposta às emissões de aerossóis pelos navios, com a mudança do padrão dos combustíveis usados, que teve início em 2020. Nessas regiões oceânicas, por onde transitam os grandes navios, com atmosfera não poluída, com menos aerossóis no ar, a formação de nuvens diminuiu e, consequentemente, a refletividade (albedo) da radiação solar que chega à superfície da Terra tem sido menor. Assim, houve aumento da carga energética, com um “escurecimento” planetário da ordem de 1,7 W/m2, que favoreceu o aquecimento global. O próprio Hansen qualifica esse resultado como uma espécie de “Barganha Faustiana”, estilo vender a alma ao Diabo, uma vez que a limpeza dos poluentes da atmosfera deu-se às custas de aquecimento global.
A crítica de Hansen ao IPCC é que os modelos GCMs usados nas simulações que dão base aos seus relatórios, liberados a cada 6/7 anos, subestimam o papel desempenhado pela cobertura de nuvens na refletividade da energia solar que atinge a Terra. Eis a razão pela qual o IPCC obtém uma temperatura de equilíbrio de sensibilidade à duplicação da concentração de gás carbônico na atmosfera inferior ao valor que seria esperável, apesar de igualmente preocupante.
A grande questão que merece atenção, não a negação, está posta em três artigos científicos, publicados na última década, pelo grupo liderado por James Hansen, e envolvem alertas relacionados com o derretimento de geleiras, elevação do nível dos mares e formação de supertempestades, de 2016; a engenharia de como se dá o processo do aquecimento global, de 2023; e o recentíssimo, de fevereiro de 2025, que alerta sobre o aceleramento do aquecimento global e a dúvida posta se o mundo, de fato, está consciente disso.
O ponto nevrálgico, no que toca ao aquecimento global, além dos já percebidos/sentidos até pelos que costumam negar a tese, especialmente o aumento na frequência e na intensidade dos eventos climáticos extremos, diz respeito, no alerta posto por Hansen e colaboradores, ao colapso das correntes oceânicas, passível de atingir o ponto de não retorno, nos próximos 20 ou 30 anos, com o derretimento de geleiras e a elevação do nível dos mares vindo a configurar uma nova geografia ao se delinear um mapa mundial diferente do que conhecemos hoje.
O Acordo de Paris, que, se espera, deverá ser amplamente discutido na COP30, no Brasil, Belém, PA, em novembro de 2025, parece, por si mesmo, insuficiente para resolver o problema do aquecimento global. Adotando-se as medidas acordadas, ainda teremos de conviver com um mundo, por um tempo, pelo menos, 1,5 °C mais quente. E se nada foi feito, podemos dizer bye bye aos temíveis 2,0 °C, pois tempos piores virão.
SUGESTÃO DO COLUNISTA: O livro “El Niño Oscilação Sul – Clima, Vegetação e Agricultura” está disponível para download gratuito: https://www.embrapa.br/en/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1164333/el-nino-oscilacao-sul-clima-vegetacao-e-agricultura